quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

O DIREITO E A SUA INTEPRETAÇÃO

Mozar Costa de Oliveira — bacharel em filosofia (Universidad Comillas de Madrid), mestre e doutor em direito (USP), professor aposentado de direito (Universidade Católica de Santos, São Paulo).
Introdução.
Neste trabalho pretendemos apresentar ideias nítidas sobre a vivência jurídica e sobre o conhecimento dela no contexto das outras experiências do ser humano. Complexa que é a matéria, já se sabe, valer-nos-emos de variada série de autores. Nossa principal fonte são algumas obras de um sábio brasileiro: F. C. Pontes de Miranda[1]. Não se apresenta aqui um ensaio "filosófico", sim um esforço de trazer ciência. Há, isto sim, matéria de filosofia científica — a teoria do conhecimento. Quiçá nada aqui seja leitura fácil para iniciantes; tampouco será leitura agradável para alguns.
Ao aludirmos a "Direito" cuidamos de uma das partes da vida humana no seu binônio básico: suporte fático e regra jurídica. Para ser um e outra entendidos, cumpre lhes penetremos o interior; donde os temas sobre exegese e interpretação com o material correlato.
Não chegamos a falar quase nada sobre teoria geral do direito; tal seria a incursão sobre os fatos jurídicos em espécie nos planos de existência, validade e eficácia. Entregamo-nos mais aos fundamentos dele. Os aspectos práticos dizem respeito à formação dos profissionais do Direito: professores, advogados (incluídos os procuradores e defensores públicos), magistrados, membros do Ministério Público, policiais bacharés em direito. Servirá igualmente ao leigo interessado em conhecimento científico do Direito (sabe-se haver quem pense ser isto um shakespeareano sonho de noite de verão...). Mas, muita vez o espírito científico supera obstáculos inicialmente fortes.
I — NOÇÕES DE MAIS AMPLITUDE (DIREITO, MORAL, ARTE ETC.).
1) Conceitos iniciais. Falamos de direito no seu sentido objetivo, que é a regra jurídica. Qualquer delas dentro de algum sistema. Diferente é o direito em sentido subjetivo: o bem de vida, a vantagem existencial, a alguém atribuído pelo sistema jurídico. O direito subjetivo irradia-se de algum fato jurídico, que pode ser de cinco classes. É, pois, eficácia de alguém fenômeno ou fato. Interpretação é termo em geral aplicado para se entender todo o fato jurídico: um negócio jurídico, um ato jurídico stricto sensu, um ato-fato, um fato jurídico em sentido estrito, um ato ilícito. Exegese é mais é termo mais correntio para se aludir à regra jurídica mesma, à norma qualquer que seja a sua classificação. Frequentemente é usada para os livros sagrados. Chamam-na alguns de “hermenêutica”, que um autor alemão denomina Rechtsanwendung embora Anwendung seja aplicação[2].
O termo grego indica o ato de seguir algo de perto para fazer-lhe a explicação, exposição. Ou seja, conseguir interpretação, comentário, elucidação pormenorizada. Cabe bem para elucidação de termos de linguagem[3].
2) Sobre "hermeneutica". Escreveu-se alguém que hermenêutica é o processo de descobrir o significado de um termo, expressando-o ou traduzindo-o, sempre para entendê-lo:

“Die Hermeneutik (von griech. ἑρμηνεύειν (hermeneuein) mit den Bedeutungen: (Gedanken) „ausdrücken“, (etwas) „interpretieren“, übersetzen“) ist die Lehre vom Verstehen, Deuten oder Auslegen.”

Nota-se no verbo grego (ἑρμηνεύειν) esta ideia de explicar o pensamento e expressá-lo em palavras, de modo tal que possa ser comunicado[4]. Logo, pela etimologia, que é a história verdadeira de algum termo (ἔτυμος = verdadeiro), a hermenêutica diz respeito à busca de sentido legítimo de palavras — tal o caso da palavra encontrada em uma norma qualquer[5].
3) Rota mais segura. Relevante é o método da interpretação dos textos jurídicos, isto é, o caminho a seguir para se descobrirem o sentido e a orientação de princípios e normas (uns e outras são regras jurídicas). E prescindimos aqui das regras jurídicas sobre tempo e espaço da incidência de outras regras jurídicas; é matéria de matéria de sobredireito, em contraposição contra o direito substancial (material e processual).
O sobredireito ("Uberrecht) não é estudado neste ensaio.
Nem é esta uma matéria fácil, o que nos faz tornar ainda mais atentos quando se estudam, por exemplo, a responsabilidade e a improbidade do agente público no Brasil.
II — O MÉTODO PARA A INTERPRETAÇÃO.
4) O método. A questão do método é primeira a ser estudada, como se disse. Sobre o método aí vão umas poucas opiniões.
Opinião de Larenz. A finalidade da interpretação é descobrir o conteúdo dos dizeres da norma. Muitas são as teorias que lhe disputam a melhor solução. Para se interpretar há de mister comparar e discutir. Faz-se isso desde a linguagem comum e técnica até se ter encontrado o real, variável este no espaço-tempo. Serão incluídos julgamentos de ""direito natural"" [6], tanto com recursos científicos como com os de “Arte”, coisa de que o espírito é capaz, como ensino Savigny. Assim, o fim da interpretação, diz, é a descoberta do fim da lei. Aqui o autor como que identifica o fins legis com a “vontade do legislador”, que ele admite como método aceitável e sempre levando-se em linha de conta a coisa regulada na norma pelo critério “objetivo-teleológico”, além das relações sociais.
A posição de E. Cassirer. Estudando o pensamento da "Aufklärung" (= Iluminismo) entra no estudo da ciência jurídica. Aduz que aquela época reabilita a metafísica platônica: é o valor do direito puro, o direito em si — dedutível da ideia de “justo”. Seria, porém, um direito posto fora da realidade do mundo, tal como ele é na natureza antes de o homem organizá-la em conceitos “puros”. Diferente disso, temos de dizer nós, é a descoberta a cargo da exegese livre, ou seja, a busca do sentido e orientação da norma cujo objeto de investigação são os dados do mundo e não a análise do pensamento organizador (é como se aprende com o brasileiro Pontes de Miranda). Na mesma corrente iluminista, prossegue, produziu-se a discussão que ainda perdura nos dias atuais (aplicáveis na matéria, por exemplo, de improbidade e responsabilidade). Exemplo disto é Rousseau quando discorre sobre o papel do sentimento no direito, cuja irracionalidade inserida no conflito entre o eu e o social suscita a descoberta salvífica da razão. O autor discute, como era de esperar-se, a distinção iluminista entre o "direito natural" e o direito positivo. Interessante notar como o autor alude aos modernos processos sociais de adaptação, que denomina, segundo Ueberweg, de “esferas de ser” entre si dependentes. O “justo” é, em todas as coisas, a medida daquilo que ultrapassa a situação concreta, a qual nos vem fechada em formas da racionalidade comum. Tal transcendência ocorre na percepção do que seja o elevado do mundo estético. Foi o concebido por Burkes (1756) [7].
Celsus. Pronunciar, como Celso, que jus est ars boni et aequi (Digesto ou Pandectas, 1,1) é admitir ser a escrita formal das regras jurídicas uma captação imperfeita da natureza das coisas. O homem é, move-se, na sociedade e dela recebe em si as ressonâncias da ambiência total. Quanto mais o interior do intérprete se enriquecer de dados do mundo, então mais entenderá ele o conteúdo das normas de direito. Estará esse intérprete, consciente ou inconscientemente, levando no seu íntimo alguns elementos na Natureza. É como o gênio consegue proceder quase espontaneamente. É esta a razão de verdade e beleza se relacionarem intimamente. Na busca da sua ars haverá o intérprete de estar atuando livre, como que integrado nas suas leis interiores[8].
Permita-se-nos anotar aqui como pensamos[9]. Na pesquisa do sentido e orientação da norma há um movimento intenso, interminável mesmo, do ser humano e das suas circunstância, próprias dele do ambiente geral, material e vivo. É um movimento incessante que a vida não detem, de modo que a dicotomia "direito natural"-direito positivo aí se situa a lançar as suas raízes. Ora bem, o método mais seguro é, até ao momento, o da livre abertura do psquismo ao dado.
Os processos sociais de adaptação. Os dados imprescindíveis para o conhecimento do direito são aqueles com que lida, ou seja, os pertencentes aos sete principais processos sociais de adaptação. São as mais relevantes vivências do homem. Para o tema deste nosso trabalho são elementos quase omnipresentes os da Moral e os da Política, o poder político em desvio de poder. Tocantemente ao poder político cumpre levarem-se em linha de conta os partidos, os grupos de pressão (com ideias, interesses, massas — nas suas articulações e disfunções jurídicas) com as suas ações dentro e fora da sua estrutura.
Os seres coexistem em relações, em interações, das quais as mais determinantes para a vida são os ditos sete principais processos sociais de adaptação.
III — DIREITO METAFÍSICO E "DIREITO NATURAL"
É exagero racionalista dizer que o "direito natural", carregado de ética, em si e por si, nulificaria o direito posto no mundo com regras jurídicas contrárias ao primeiro. Cada tempo tem sua concepção de conveniência segundo a dignidade da pessoa e dos grupos. Passa-se o mesmo com o espaço (brancos mais cultos, índios, esquimós, negros do fundo da África etc.). Se um certo círculo social relativamente autônomo aceita regra jurídica contrária ao seu próprio direito, esse Povo ou parcela de Povo, terá legislado indiretamente positivando essa aceitação — construindo-a. Esta circunstância revoga a norma jurídica que vigia até então por isso que todo poder emana no povo. O Povo (a maioria mais influente das pessoas), se estão mudando os fatos, vai alterando os seus sistemas de ""direito natural"", incluído o mundo jurídico, claro está. Quando as pessoas mais influentes de um círculo social amplo se situam contra a improbidade, portanto em desfavor do ato ilícito, se as normas vigentes sobre privilégios infundados forem esgotadas longamente por essa maioria do círculo social, o Povo as está a rejeitar até com pujança e clareza bastante para se lhe ver a rejeição. E estarão os privilégios abrogados, postos fora do sistema jurídico. Já não incidirão tais normas. Ninguém as pode aplicar desde então. Os suportes fáticos correspondentes a elas terão tido outra solução normativa, que não as regras jurídicas até então vigentes.
5) A função ampla da “aequitas”. A serventia da aequitas é imprescindível tanto para se completar algo deixado fora da escrita da regra como também para lhe corrigir o sentido e a orientação. O conteúdo de relações implicadas, a quem a norma favorece e à custa de quem, são elementos diante dos quais se pode verificar o conteúdo revelado. Corrige a regras jurídicas escritas no que contenha de redação defeituosa por erro consciente ou inconsciente de quem a tenha redigido. Toda expressão escrita de qualquer parcela da realidade extramental é insuficiente; a “essência” mesma já o era desde quando foi extraída do objeto. As coisas são mais complexas do que as pode exprimir o pensamento. Corrige e completa ainda o "direito natural" na sua expressão verbalizada ao não dizer precisamente o determinado pela natureza das coisas já que a sua expressão, como toda outra, é incapaz de esgotar o mundo dos objetos, que se pretende trazer a flux. A compreensão da equidade pede que seja esta localizada num arco mais geral de conhecimento: é o campo da teoria do conhecimento, onde se estuda a limitação da linguagem escrita e falada. É um capítulo da filosofia científica.
Atrás da expressão articulada está o conceito e, no interior deste, o acontecimento — o fainómenon (φαινόμενον) — procurado pela interpretação. Estamos falando neste passo da expressão articulada de uma norma do chamado ""direito natural"". Pontes de Miranda estudou a fundo também este tema [10].
A equidade é “condição humana” (conceito de Hanna Arendt) para que se consiga a revelação da norma, a descoberta do sentido e orientação. Na regra jurídica lateja sempre algo de criativo, próprio da ars. É inafastável a presença do “construit” nas mais aperfeiçoadas teorias científicas positivas. A aequitas está no mundo do homem, no posto no mundo, fora na nossa mente.
Positivismo literalista é atitude muito distanciada da interpretação. O “justo” é o que, atuante, lateja na natureza das coisas, de acordo com a sua concepção atualizada pelos dados do espaço-tempo: é quanto se colhe quando se examina a própria relação social a que os dizeres da norma alude menos embaraçadamente[11].
Método, aequitas e ars. Determinada pela própria “condição humana”, atua em todo exercício de conhecimento, o inafastável mister do sentimento. O homem, mesmo quando conhece no exercício científico, aí também sente. Quando conhece, também está o intérprete respirando, fazendo digestão, funcionando todo o seu ser biológico. Não estranha, em matéria de interpretação, a busca entranhada de conhecimento para colher o sentido e orientação da norma; para alcançar este objetivo é insopitável o conjunto dos recursos artísticos. Na ars trabalha-se sem o enfoque do “racional”. Age-se internamente com o ser humano biologicamente empenhado, apalpando o real, os objetos, com todos os dados inicialmente cabíveis. Nem pode ser olvidada a circunstância de, ainda no sentimento, se proceder com medidas — o animal sente e age com conteúdos matemáticos. Quando se fala em ""direito natural"" no estudo do direito (um capítulo de sociologia especializada) cumpre ter em mente as sete necessidades mais definidoras do ser humano. O ser humano é, no fundo, plasmado pelo círculo social; a sociedade faz o homem. As sete necessidades fundamentais correspondem aos sete principais processos sociais de adaptação, que são Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência. A estes principais processos sociais de adaptação acrescem outros, menos definidores das relações humanas, como a moda, o bom tom, a elegância no trato, a compaixão. Percebe-se que na atuação ginástica da ars já não releva a distinção entre teoria e prática, entre formal e substancial. É algo assim como um “vale tudo” na linguagem da gíria. Quer isto dizer que essa actio envolve o organismo todo, que empolga o trabalho com mais o seguinte: linguagem, lógica clássica, lógica matemática, ratio legis, construção a simili, comunnis opinio, ou seja, os "tópoi" (de τόπος, lugar comum, temática) [12].
Alimpamento. A ars é caminho, método para o exercício da equidade. A aequitas, vimo-lo, é inafastável em todo tipo de conhecimento porque ela só pode ser exercida no processo social de adaptação da ars. A ars do conhecimento jurídico é a própria aequitas; sem foco na racionalidade, o resultado dela bem pode eclodir desordenadamente. Pode ser até inútil o exercício dela quando o pesquisador não é gênio[13], o que faz qualquer pesquisador (a maioria deles é "não gênio") salvar o material coletado e trabalhado durante os momentos de meditação difusa. Entra em exercício neste passo a velha ratio com sua destinação normal. Organizado o pensamento, já em forma de “construit”, o esforço intelectual estará a preocupar-se de realidades extramentais, cuidando das relações entradas no mundo jurídico pela incidência na norma de direito. De todo modo, a volta incessante ao livre mundo das relações (acontecimentos, fatos, fenômeno extramental) é um passo indeclinável do pensamento no seu caminhar sobre a matéria pensada.
IV — PRINCÍPIOS E NORMAS
Em matéria de direito constitucional, onde se busca pesquisar a existência e a eficácia do ato ilícito e da consequente responsabilidade, é relevante o conjunto dos princípios iniciais da Constituição Federal de 1988. Estão no Preâmbulo e nos artigos 1º-4º. O princípio, em geral, é proposição básica. A proposição básica normativa é regra jurídica que incide sobre suportes fáticos mais numerosos que os postos sob a incidência de uma regra jurídica não "principial filosófica". Os princípios do Preâmbulo e os logo abaixo qualificados como “fundamentais” não podem ser objeto de emenda. Só são alteráveis por uma eventual nova constituinte escolhida pelo povo.
Esta interpretação impõe-se. O estabelecido no artigo 5º é insusceptível de emenda (artigo 60, § 4º, [...] IV - os direitos e garantias individuais). Esta é uma interpretação classificável na velha Escolástica, como a minori ad maius [14]. Em termos de relações sociais, este é o sentido e orientação do artigo 60, § 4º: os princípios são também regras jurídicas, só que mais abrangentes que as outras. São normas norteadoras, fundamentais. Seria perigoso que princípios fundamentais pudessem ser alterados por emenda. O povo aceitou-os como regras jurídicas inspiradoras de todo o restante de modo que, assim consagrados como base da organização jurídica do país, não se poderia compreender que alguém, que não fosse uma outra constituinte, viesse a alterá-los. Bem ao contrário, o seu conteúdo haverá de ser ampla e meticulosamente investigado. Regras jurídicas constitucionais que sejam contrárias aos princípios constitucionais são contraditórias e inválidas — vão elas contra o imodificável, esbarrondam no cerne rígido da "lei" interna máxima (contra "cláusas pétreas"— termo ruim porque norma não é cláusula, nada tem a ver com negócio jurídico). Tal o caso das do regras jurídicas artigo 5º.
Estas normas merecem toda a atenção do intérprete para que não possam ter, na dúvida, alguma interpretação extensiva. Estando norma alguma constitucional em contradição com os princípios, tem de ser interpretada como odiosa segundo Schröder[15]. Pensamos serem elas, neste caso, regras jurídicas inválidas, porque o seu conteúdo altera o cerne rígido da Constituição, É que o princípio é proposição a servir de base para a estruturação do Estado, portanto de conceitos amplos, gerais, que presidem a elaboração das normas internas[16].
6) Outras notas a respeito da interpretação da Constituição Federal. As regras jurídicas constitucionais estabelecem os parâmetros normativos supralegais, de modo que outra regra infraconstitucional, se entra em contradição com aquelas, não vale. Claro que toda invalidade deve o juiz de qualquer instância decretá-la ex officio, e é na Constituição que se aloja a norma contrariada. Como em toda interpretação de normas, a descoberta do seu conteúdo, no método menos imperfeito que a cultura encontrou, é o de se lhe buscarem sentido e orientação (sem menção alguma a "intenção do legislador", ou "espírito da lei"). Sentido é o conjunto de objetivo e fins que a regra deverá produzir, quando aplicada; é, pois, o seu conteúdo; orientação vem a ser a pessoa ou grupo de pessoas a que a norma traz proveito ou desvantagem (pense-se numa lei penal em relação ao autor de ato ilícito, e ao prejudicados ou prejudicados).
Aplicar a regra é, na efetividade, retirar as consequências que a sua incidência sobre os fatos deverá produzir. Sentido é, pois um quadro de ""direito natural"" inserto nos suporte fático de que a norma trata. Eles são fontes de necessidades, tais como a relação social as aponta. Um exemplo é “todos são iguais perante a lei”. Cumpre pesquisar-se o que seja igualdade, o que sejam todos e o que seja a lei [17].
É correto dizer-se que a palavra "exegese" diz respeito ao conteúdo dos dizeres da norma (ἐξήγησις, esclarecimento sobre o texto). "Hermenêutica" (ἑρμηνεύειν) é sinônimo de "exegese" porque busca na linguagem os seus símbolos e demais sinais linguísticos.
Já a interpretação traz o conteúdo do fato jurídico mesmo, não só da norma, porque implica o entendimento de realidades mais complexas — os fatos da vida humana[18]. Ora bem, os principais fatos da vida humana são as relações ou interações dos socii entre si e com o universo circundante. É o mesmo que lembrar os sete principais "processos sociais de adaptação", a saber, Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência. Estamos, com isso, diante de uma lição da sociologia científica [19].
Tudo isto precisa ser visto, analisado, estudado nas relações sociais históricas do pedaço de espaço-tempo em que se faz a interpretação. Já orientação vem ser a direção que a regra aponta, indicando beneficiários e prestadores com ele relacionados. A orientação tem, pois, por escopo revelar qual é o pendor da regra (se mais individual que social ou vice-versa, entre os indivíduos qual é aquele que na espécie é bafejado pelo bem de vida localizado no “valor”, como por exemplo na Constituição Federal de 1988, artigo 5º - XII (sigilo de correspondência), 5º-XVI (são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos).
Constituição Federal de 1988, 5º-XVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. Trazemos breves palavras neste respeito, que o assunto merece madura reflexão e aprofundamento. A exegese, quadra repisar, tem de completar-se com a interpretação dos fatos.
O Brasil figura hoje entre os 67 países mais corruptos do mundo; a moral pública é um bem de extrema necessidade porque o distanciar-se da ética é um elemento desagregador muito prejudicial ao Povo: erradica ou diminuia a fé da capacidade moral das pessoas, o culto à dignidade, vulgariza a fealdade do "ladrão público", acostuma a gente brasileira à impunidade dos ricos e poderosos etc. Bem, pois entre esse "valor" (moral pública) e o "valor" (direito subjetivo) — de corruptos e corruptores — ao sigilo das comunicações telefônicas (artigo 5º-XII), entre eles há, quando menos, igualdade matemática de importância para a vida. Os fatos mostram o sentido e orientação da regra jurídica, ou seja, fica respeitado neste caso de escuta tão somente assunto relativo à dignidade dos dessa classe de bandido.
Acresce outro ponto. Ainda nesta mesma hipótese os fatos ostentam mais um pormenor jurídico. Se um desses bandidos públicos só fala sobre os seus planos de corrupção com a sua mulher no próprio leito nupcial, é preciso consultar o fator urgência e o fator de inexistência de outro meio eficaz na coibição. Se não houver outro modo eficiente (Constituição, artigo 37 caput, "eficiência") de se chegar ao intento legal comtater a corrupção, em tempo útil, decerto incide a pré-excludente "estado de necessidade". E a escuta terá sido um ato penalmente típico, mas, não punível; terá deixado de ser ato ilícito.
Quer nos parecer que ter errado no julgamento o Superior Tribunal de Justiça ao decretar a nulidade do processo no episódio conhecido como "Castelo de Areia"[20].
Tornemos ao "direito natural". Tenha-se em conta integrarem-se no “direito natural” os objetos, as coisas, os princípios, os bens de vida a que as pessoas aspiram. Frequentemente os elementos do "direito natural", em si e por si, não se encontram formalmente nos textos; a formalidade “bloqueia” a amplitude de percepção que os ideais culturais tendem a alargar. Para esta percepção é necessária a liberdade própria do espírito científico. A essa liberdade de espírito, quando se interpreta, há quem a denomine de “discricionariedade”[21]. Trata-se, porém, de firmar a difícil não sujeição aos bamboleios travessos do ego, essa oscilação causadora de tantos gestos destrutivos na sociedade. Esta não sujeição é a posição em que o espírito tem mais comando de si (=inteligência), com menos submissão aos movimentos passionais (=instinto). [22]
V — FATOS (SUPORTES FÁTICOS) E A SUA RELEVÂNCIA NA INTERPRETAÇÃO DOS SISTEMAS JURÍDICOS.
Tem-se na mantença do comando sobre si um dos esteios da ética, de que o ato de conhecimento não pode prescindir; a não ser assim os erros cognitivos se multiplicam. Perde a ciência, com a sua característica mais típica — a indicatividade. Mantida esta, alma humana andará mais liberta do crer por crer (Religião), da conservação da dignidade em si e por si (Moral), da beleza das formas (Arte), da garantia extrínseca (Direito), do poder no grupo (Política) e da busca de bens materiais (Economia) etc.
Toda a dificuldade geral de exegese de proposição normativa se resume neste amplo horizonte de indagação — sobre o seu sentido e orientação, indiferentemente da “escola”, ou “escolas” (elas são numerosas), de que se trate. As escolas “hermenêutica”, “dogmática” e “zetética”, todas são havidas como parte do capítulo sobre de hermenêutica jurídica[23].
Mais à frente este mesmo autor Luiz Fernando Coelho discorre sobre os “procedimentos de interpretação”, que seriam: a interpretação filológica, a lógica, a sistemática, a histórica, a interpretação pública e interpretação privada (páginas 203-224).
Dizem os autores que ao interpretar uma Constituição, o método há de ser tal que seja capaz de serem afastadas contradições. Dar-se-á primazia aos fatores de “integração política e social”. Há que se conferir ao texto o máximo de sua capacidade para a aplicação, buscando-se precisão nesses resultados hermenêuticos, salvando-se ao máximo os bens jurídicos protegidos com especial cuidado com aqueles que estão de algum modo em conflito. A propósito deve-se preferir o resultado que mais favoreça uma aplicação permanente, aduz outro [24].
A questão da ideologia. Na ideologia os seres humanos sintetizam idéias e pendores, muitos deles inconscientes. A ideologia está omnipresente na atividade de todo pesquisador, [25] de modo que há de se acautelar sempre, reexaminando-a, quem se dedica à interpretação em matéria jurídica. Na ideologia estua a paixão, estorvando o livre pensamento.
7) Interpretação, dado e construção. Para se obter um conhecimento mais adequado do direito posto (não de elementos cognitivos feitos de ideias soltas sobre o direito, esvaziadas pela abstração, metidas em retórica), para a obtenção desse conhecimento científico, repetimos, tem-se de pensar que, a par da excelente formação moral, o estudioso do direito há de ter a inteligência formada no método mais seguro de conhecimento e de investigação, que é o método indutivo experimental, o método da ciência positiva — conhecimento experimental do mundo dado (ou posto), em lugar do mundo construído pela elucubrações mentais. Estas são necessárias, mas precisam de ser controladas pela mentalidade científica. É o que se denomina, sem pruridos apressados de falsa erudição, (“cientismo” ou “cientificismo”), e que se tem chamar, aí sim — repetimos —, de ciência positiva. De notar-se: nada tem este conceito a ver com positivismo nem neopositivismo. Mais precisamente: exige-se no seu estudo e na sua construção o menos possível de construção mental (construit), com a crescente percepção das realidades transpessoais existentes na natureza, fora da mente humana (donné).
8) Formação dos profissionais do Direito. Cumpre atender-se a trabalho com ideias gerais sobre a formação do advogado, do professor, do juiz, do membro do Ministério Público, do delegado de polícia; por exemplo, em matéria processual, em direito ambiental, no trato com os "direitos humanos" etc. É como todo estudioso do direito posto, escrito ou não escrito[26], tem de se colocar mentalmente desde o estudo da ordem supraestatal até à mais minúscula regra jurídica, por exemplo, de uma portaria administrativa (seja qual for a denominação que se lhe tenha dado). E, para tanto, cumpre tenham em mente todo o magistrado estudioso, e membro do Ministério Público, e professor, e aluno dos cursos de direito, tenham em mente — dizíamos — o binômio fundamental: regra jurídica e suporte fático.
Com a primeira (a regra jurídica), as bases da teoria geral da dogmática jurídica; no segundo (suporte fático), os dados da sociologia geral e das ciências particulares, com os conteúdos de lógica, matemática, física e biologia. Alude Dalmo Dallari aos conhecimentos sociológicos — que recomenda vivamente. Di-lo, todavia, ainda com tinturas fortemente retóricas, distantes do direito posto. Direito posto é o (mais) transpessoalmente analisado e dominado: eis o caminhar mental próprio do método indutivo experimental. De todo modo — tornemos —, cuida-se da pesquisa dos suportes fáticos, com o máximo de abertura psíquica do homem todo (intelectual e passional) às realidades extramentais, notadamente os sete processos sociais de adaptação. É quando o intérprete (como o magistrado, o professor, o advogado) se liberta, ao máximo possível, de gostos, emoções, tendências, pressões, modismos sublimações, idealizações; numa palavra, de subjetivismos — escória de difícil remoção em todo estudioso, posto seja possível, felizmente. A natureza do homem é razão sempre mesclada de paixão.
9) As lições de Pontes de Miranda. Esta matéria foi estudada pelo brasileiro ilustre desde o seu “Sistema de ciência positiva do direito”, com a 1ª edição de 1922, então em dois tomos. Intenção, ou vontade do legislador, ou vontade da lei, são fetiches. Estas relações subjetivas não alcançam a realidade extramental a que os termos da norma estão aludindo. O que se apreende com segurança maior, menos intimista, são as relações em que os fatos se nos apresentam, aos quais as normas aludem. Estas relações são, em conjunto real amplo, os processos sociais de adaptação. Parcelas deles são recortadas no suporte fático da regra de direito, já o dissemos. A análise das relações sociais propicia uma visão menos enganadora do conteúdo da norma (fim mesmo da exegese da norma e da interpretação dos fato), ao passo que a vontade de alguém é simples mediação, repleta por complexas necessidades, carências, deficiências; por fatos da vida, pois. Estes em determinado momento da realidade são classificáveis como A; mudam, porém, continuadamente, certa classe mais que outra. O tempo B, futuro, é de contextura multifária e pode ser muito distante do momento B quando está a viger a mesma norma. A vontade passada (“vontade do legislador", ou da lei, "intenção do legislador”) não tem como prever o que seja imprevisível. E o intérprete (como o juiz e qualquer cidadão) tem de revelá-la no momento da incidência — sobre fatos cambiantes — para captar-lhe o conteúdo a indicar certo e determinado sentido e efetiva orientação, ou seja, a quem a norma beneficia e com que bem de vida [27].
A leitura da norma relativa a certo assunto deixa transparecer um conjunto de ideias. São elas instrumentos do pensamento humano. Este as tem de organizar segundo lhe dita a combinação dos próprios fatos, mas, sempre nos limites de cada pedaço de espaço-tempo, cada qual com as suas imposições e necessidades. Um desses fatos é a reação social vivida em circunstâncias repetidas. E isto se consegue pela auscultação da concepção geral do Povo [28].
Pensar diversamente é afastar-se o pensador do conhecimento do direito, mais acertado, melhor. Sim, porque tal se dá se o pensamento vem guiado seguramente pelo caminho indutivo experimental, que trabalha com dados extramentais (relações reais) com o máximo de precisão, rigor, exatidão. O "referencial" é o movimento de idas aos fatos e vindas dos fatos — examinando, conferindo, confirmando-se ou não a ideia obtida acerca deles. O referencial (cartesiano), permite "definir a posição de cada ponto por meio de um par ordenado de números reais"[29]. Só as relações reais (fatos conferíveis nos sete principais processos sociais de adaptação) são capazes de definir com mais precisão, rigor e exatidão o sentido e orientação da regra jurídica incidente sobre elas.
10) Filosofia e ciência. Fora daí resta a estética do pensamento filosófico de todos os tempos — uma experiência deleitosa, mas, as mais das vezes, uma experiência vazia de ideias ajustadas à natureza extramental. Ora bem, mal andará quem vai resolver problema jurídico com generalidades sobre o modo real de o homem ser. O caminho há, portanto, de ser o da ciência positiva, que não os ínvios caminhos das filosofias. prenhes de subjetivismo sobre "aquilo que a coisa é".
11) Inclinação popular — buscar a "intenção do legislador". Este pendor é frequentemente determinado pela hipertrofia dos órgãos políticos — dos "jurisferantes" e dos aplicadores da norma jurídica. Tal o caso, cumpre-nos dizer, dessa prejudical ocupação com o passado legislatório e do endeusamento da jurisprudência tomada como fonte de saber [30].
Já a aequitas, pesquisa do sentido da vida humana caso por caso, esta nos traz valia heurística enorme. Serve para corrigir a fórmula legal adaptando-a aos fatos quotidianos do modo de ser da natureza humana digna e sábia. Tal adaptação dá-se pelo renovado ato de sentir a justiça percebida pela maioria, digna e culta, do grupo social (círculo social) em que se situa a relação jurídica examinada. Acresce o cuidado com o procedimento rigoroso, exigente, do sentido final das interações sociais, ou seja, a equação mais natural à complexidade da inter-relação havida entre os sete processos sociais de adaptação [31].
Quer isto dizer que o intérprete não pode deixar de aperfeiçoar-se tentando ser a cada momento um sociólogo aprimorado[32], que serve à vida humana na suas relações de força “determinadas pela finalidade do "bem”[33].
Certo, apresenta perigos o próprio método indutivo experimental na livre interpretação do fato jurídico e nele da busca de sentido e orientação da regra jurídica (exegese). Toda alternativa leva perigos consigo. A escolha pelo método fundamenta-se na circunstância de o indutivo experimental (ciência positiva) contar com mais segurança cognitiva: a metafísica, as “filosofias” (tão frequentemente impregnadas de discurso vazio, até de vaidade) lidam com ideias soltas, não vinculadas coerentemente mente ao mundo extramental. Fazem elas, sim, parte do modo de ser próprio do homem, mas andam muito chegadas à vivência do mundo das Artes; logo, vivência íntima de outro processo social de adaptação, diverso do viver científico positivo[34]. É neste que se busca com probabilidade de acerto saber "o que a coisa é",
A fórmula, a expressão verbal da norma, tem que ser pesquisada perante as indicações dos fatos sociais por sua própria natureza. Cada processo social de adaptação tem a sua característica própria, que é o critério específico de vigência: pode ser o anseio pelos "valores" ultrassensíveis, ou pelos da dignidade da espécie humana, ou pela encantadora harmonia das formas, ou pela segurança impessoal das relações, ou pela importância do poder dentro do círculo social, ou pela relevância das utilidades materiais, ou pela necessidade de conhecimento mais seguro. Vamos reiterar: são respectivamente os processos sociais de adaptação de Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência, os sete principais. Note-se que eles se entrelaçam na formação da complexidade das coisas todas e, nela, claro está, da vida mesma. Quando segue essa rota, o pensamento se alimenta de fatos muito mais que de elucubrações, recebendo dados superiores à construção mental. É conhecimento transubjetivo: constrói ciência positiva (conhecimento do que está posto fora da mente humana [35].
12) O âmbito do direito penal.
Percorramos alguns dados sobre a exegese das regras jurídicas de direito criminal.
Opinião de Bettiol.[36] Cuida o direito penal dos ilícitos a cuja prática se comina punição, geralmente de segregação social, por haver convicção de o agente ser socialmente perigoso. Prevalece a ideia de ser a punição do agente de uma conduta patológica uma diminuição da liberdade, sendo esta um bem de vida muito cultuado depois dos regimes absolutistas. Por esta razão não se admitem outras regras jurídicas para definir esse ilícito que não sejam as escritas explícitas (direito costumeiro não). O ilícito tem que estar descrito na norma incriminadora (tipicidade), assim como de vir descrita nela a punição correspondente (nullum crimen, nulla poena sine lege). Analogia admite-se tão somente para as normas pré-excludentes de ilicitude (“eximentes”). Ainda neste campo é naturalmente impossível o duro formalismo literal que afastasse de todo a necessidade de alguma descoberta sobre o fim da lei; o autor alude frequentemente, porém, à “vontade da lei” (que, para nós se deve, contudo, afastar). Deve admitir-se o direito consuetudinário para se verificar que tipos de lesões essa forma de direito as admite — os esportes são um exemplo. Também quando forem secundum legem. Também a analogia, se favorecer o réu. Sempre se há de levar em conata o finis legis e, bem assim, os fatores não racionais como toda a gama de fatores artístico-emocionais que ajudem a adaptar os termos da norma à realidade do cometimento surgido para exame segundo as concepções vigentes no “milieu social”. Inserem-se aqui os dados sobre o "direito natural" e sobre a moral, diz, servindo também a esta a aplicação da aequitas. Como na analogia se introduz norma inexistente, coisa diversa da extensão de norma existente assemelhada, é possível esta e aquela não. Em nota de rodapé o autor, suscita questão de interesse ao citar a obra “Das strafrechtliche Analogieverbot” de Walter SAX, que sustenta posição contrária[37].
E é assim, terá escrito este autor alemão, por ser impossível traçarem-se linhas precisas “entre os limites da interpretação e a livre pesquisa do direito” (página 139, nota 70).
Opinião de Magalhães Noronha. Não se pode interpretar norma se houver, nessa interpretação alguma criação de norma nova sobre o crime ou a sua punição. O costume é fonte de interpretação do direito criminal — há aí confusão entre fonte de norma e fonte de exegese: esta versa os instrumentos aceitáveis de conhecimento da regra jurídica. Nesta mesmo confusão traz como fontes “mediatas” do direito penal a equidade, os princípios gerais de direito, a analogia in bonam partem, tratados e convenções (a jurisprudência não).
José Frederico Marques. Com a interpretação visa-se o achado da extensão e o alcance da norma, enxergando-se a o resultado da sua incidência sobre as relações jurídicas. A interpretação da regra jurídica penal não difere dos métodos de exegese de qualquer outra norma de direito. Tal o caso da “libre recherche scientifique”. Incide sobre esse esforço a norma do artigo. 5º da velha Lei de Introdução ao Código Civil (“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”), porque o trabalho assim feito é o da interpretação teleológica, a saber, o bem jurídico encerrado na norma. É de notar-se, diz com autor espanhol, estarem na norma penal dois "valores" contrapostos: liberdade individual e interesses gerais nas sanções punitivas. De todo modo, leve-se em conta o fato de a lei ser mudada através dos tempos, tempos em que as relações sociais se alteram e ela, pois, com eles: a lei penal como qualquer outra — ela não se erige como se fora porventura uma “lei de exceção”. Lacuna da lei não pode ser suprida pela analogia, salvo se for in bonam partem, nem pelo direito consuetudinário. Não cabe invocar-se o artigo 4º. da Lei de Introdução ao Código Civil (“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”). Esta regra cede a outra, constitucional, sobre a “reserva legal” — Constituição Federal de 1988, artigo 5º- XXXIX: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Aníbal Bruno. Acresce ele ideia própria sua no tocante a pontos relevantes como: a interpretação tem até certo ponto a função de “recriação do direito”, buscando mesmo o “sentimento jurídico coletivo”, segundo as circunstâncias atuais em que ela incide, de acordo com “consideração dos motivos sociológicos da lei” tendo-se o texto legal como “constante ponto de referência”; o texto é incessantemente integrado no sistema jurídico geral; é de admitir-se também a analogia legis, diferente da analogia juris, ou seja, sempre que a norma aluda a outras situações ou casos parecidos (“outros semelhantes”)[38].
VI — A IMPARCIALIDADE DO INTÉRPRETE.
É este um velho tema. Envolve a concomitância humana de razão e paixão, que é modo de ser na natureza humana. A imparcialidade é tarefa árdua em qualquer campo de investigação e não apenas no mundo jurídico. Atuam sempre no homem os seus próprios pendores ou gostos pessoais, que também eles têm componente externo, social; envolvem a atividade pensante por mais pura que pareça ser. A questão é grave. O pendor é, em si e por si, desvio da linha mais curta do conhecimento transubjetivo (puramente objetivo, diriam outros). No universo curvo e finito de Einstein a relatividade é ainda mais relativa do que a descoberta por ele em 1915. Tudo corre, seja fora do pensamento-sentimento como dentro do cérebro pensante-sentinte. O material percebido no momento A (Espaço-Tempo-Energia) rigorosamente já é sempre outro quando percebido no momento B (neste B, o que era “isto” em A, já não é idêntico a àquele “isto” percebido em A). O problema, geral que é, não parece ter solução perfeita. Nosso saber é necessariamente aproximativo. Com toda a precisão, a coisa A de aqui e agora não é rigorosamente idêntica ao "mesmo A" nos instantes seguintes. É apenas um como se — como se fosse idêntico. Sim o meu A de agora é tão somente como se fosse o A de um milésimo de segundo atrás. Nesse intervalo mínimo de tempo, que é em verdade um momentum do Espaço-Tempo-Energia, A mudou e mudei eu, observador, pensador, julgador. Note-se bem: não é Fiktion como no Als Ob ("como se") de Vahinger porque a criação feita no A de agora correspondeu transubjetivamente aos dados: aos dados colhidos na “coisa” e aos dados experienciados em mim próprio — sem invenção ficta. O mesmo se deu no átimo anterior.
13) Alguns cuidados com a palavra.
A palavra é a expressão de um elemento intelectual, de algum conhecimento. Anterior a esse, mais imediato, já terá brotado o sentimento. O intérprete, para estar livre (= mais livre) tende a adquirir o hábito de quedar-se frio quando o sentimento desponta [39].
Iniciar o discurso jurídico com ideias é o mesmo que incidir no vício racionalista — ideias desvinculados dos fatos correspondentes, sem compromisso lógico material com eles. Este pensamento, por ser apriorista, impõe à natureza do donné das coisas os seus modos adquiridos (construit). O intérprete, como o advogado o juiz e outros profissionais, diante do ato ilícito, tem de trabalhar notadamente com a indução, olhando, para isso, a estrutura mais extramental dos dados, e sempre para além daquilo que, em certo momentum do Espaço-Tempo-Energia passado, o legislador terá querido. A vontade do legislador resulta de ato político, não de ato jurídico. A função do intérprete é difícil por ser necessariamente criadora, Mas, note-se bem, é a criação da descoberta, revelação do que ainda não foi objeto de desvelamento (=retirada do véu)[40].
Ainda no tocante ao sistema jurídico, quadra notar que diante deste com os seus conceitos está o intérprete, como o juiz e os outros; apenas diante de um sinete simbólico. O sistema jurídico, através das suas palavras, reduz a alguma “essência” lógica os conteúdos morais, econômicos, políticos etc. Este é o ponto crucial. As relações morais, econômicas, políticas, e outras não são, em si e por si, elemento lógico. São relações humanas em que o homem se situa no mundo com uma ou várias das energias, a saber, de Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência e poucas outras. De modo que a só lógica não resolve a questão da equidistância do intérprete diante de "valores" entrelaçados, por vezes entre si opostos. As necessidades humanas entram por vezes em conflito, situação típica da complexidade. Os seres misturam-se de modo geralmente ainda impossível de ser descrito[41].
VII — O SER LÓGICO E O SER ILÓGICO
A consistência cognitivamente confiável da “essência” lógica depende dos seus fundamentos alógicos, os quais variam incessantemente dentro do movimento contínuo do Universo. É indispensável ao intérprete conferir o percebido por ele no conceito com aquilo que é material fático. O material fático é o conjunto dos suportes fáticos. Estes são compostos pelos principais processos sociais de adaptação, entre os quais se insere a linguagem que, como o conceito, é uma resultância cultural. A não se dar o intérprete a essa difícil lida, entrará em labirintos indeterminados e inextrincáveis. Ora bem, os artifícios mentais são em si abstratos e despreocupados com o sentido real extramental da contextura dos seres. Logo se vê a dificuldade em que se encontrará o intérprete[42].
Profissionais bisonhos. É de lastimar o número de profissionais do Direito (professores, juízes e outros) carregados de arrogância, presunçosos na sua pseudo-habilidade com o material jurídico, ao pensarem e atuarem como se tudo fosse coisa simples, assunto fácil, questões de somenos para serem cognitivamente dominadas. Põem-se em verdade como "donos da verdade". Nota-se-lhes aí um começo bastante comum da falta de dignidade e de autêntica fúria, esta de difícil suportabilidade social. Faltam-lhes, mais que aos outros, humildade e estudo científico do direito.
15) A regra jurídica.
Todo fato jurídico se compõe destes dois componentes, como vimos — suporte fático e regra jurídica. A lei contém regras jurídicas; na sua origem ela é um fato político. Há aí a vontade do legislador. Para o intérprete ficar equidistante dos envolvidos na relação jurídica, repetimos, tem de deixar de lado esse momento político. A equidistância será mais bem preservada se o estudioso (todos os profissionais de direito hão de sê-lo!) se der à análise das relações sociais postas sob exame. A mens legis é o mesmo que o “fito da lei”. O fito da lei é, radicalmente, produzir ou alterar alguma força social, positiva ou negativa. Trabalhar o intérprete com o fito da lei, todavia, apenas com a razão equivale a se encerrar ele só na harmonia lógica das formas. Ao contrário, o fito da lei, o objetivo dela, é dado pelas próprias “condições sociais”. Essas “condições sociais”, são os elementos dos complexos suportes fáticos entrelaçados, postos sob a incidência da norma. A grandíssima maioria dos suportes fáticos são, como visto acima, as relações sociais de Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência. São os sete principais processos sociais de adaptação, valha insistir. A liberdade interior do intérprete variará de grau. A sua objetividade dependerá da sua educação ética e científica precisamente na análise desses processos sociais de adaptação. Não se pense ser posição fácil, nem previsão de resultados absolutamente certos. O que haverá, sim, é a perfeição possível ao ser humano, ou seja, diminuição do autocratismo do intérprete como, por exemplo, o do juiz. Sim, porque tanto a linguagem como a razão são produtos sociais internalizados pelos indivíduos de cada círculo social. Com conceitos "soltos", despegados do mundo real, a razão trabalha facil e irresponsavelmente.
16) Mundo real e mundo ideal. Parece ser um desafogo para o animal homem o refúgio num mundo pensado, sem defeitos. E precisa da busca de perfeição, no que se diferencia do animal bruto. É algo assim como um "tender a", um estender-se sem fim. Ele busca algo disto na religião, na moral e na estética, os processos sociais de adaptação mais acentuadamente culturais, um tanto distantes da animalidade mais crassa[43].
Delicadeza no trato com os conceitos. Os conceitos são cópias multissecularmente estratificadas. É causa bastante para serem tratados como instrumentos delicados com que a limitada inteligência do intérprete vai lidar com um ser real. Antes que se alcance, por todo o mundo, o traquejo com o método indutivo-experimental continuarão os juristas a enamorar-se das “essências”, um dogmatismo escolástico, Mas, o dado empírico, como os suportes fáticos, possui infinidade de caracteres, não poucos. Donde os perigos da dedução, como método sedutor, a enlear em conceitualismo a imensa maioria dos juristas atuais. Ora, é o incessante contacto com os fatos o que ajuda a raspar os resquícios impertinentes de pendores ideológicos e de preferências.
Exame meticuloso dos fatos pode iniciar a formação confiável de alguma ideia (=indução); o exame da ideia formada diante de fatos (=experimentação) autoriza a confirmação da ideia como verdadeira. Estes são os passos do o método indutivo-experimental, em que se resume a ciência das coisas postas, subsistentes fora da mente (=positiva).
A ciência positiva. Também a ciência (=conhecimento adquirido por meio do método indutivo experimental) é um processo social de adaptação. Influenciam nela os outros seis processos sociais de adaptação!... Raramente poderiam ser “pura”, “absoluta”, mas é o que se tem de melhor para consecução de equidistância, de subjetividade mínima — também, pois, no conhecimento do Direito. Com a ciência o intérprete aproxima-se das realidades extramentais. Procede à indagação direta sobre o mundo fático — sobre os processos sociais de adaptação. Com isso o intérprete pode melhor compreender a norma que rege esses fatos. Desvencilhar-se-á de muitas palavras, reduzirá o cipoal dos conceitos. Estará aproximando-se do conteúdo originário, mais verdadeiro, da norma. Poderá colher-lhe o sentido e orientação. Curioso e importante — esse "sentido e orientação", psiquicamente tão distante da feitura da regra, geralmente escapa ao legislador. Reforça-se assim a convicção de ser indispensável ao intérprete afastar definitivamente a "intenção do legislador" e a "vontade da lei".
Está no notável Pontes de Miranda:

Nos métodos de[....]interpretação do direito foram demorados, lentos, os passos: e somente de alguns anos esta parte pôde a ciência jurídica lograr descobrimentos realmente positivos. Mas tais resultados constituem o cabedal de pequeno escol de cientistas e somente à medida que se tornam insustentáveis as situações é que os dirigentes atendem a certos reclamos. [....] depois do movimento de freies Recht e da freie Rechtsfindung, abriu-se caminho para maior atuação na mentalidade profana. [....] Em todos os tempos, atende a interpretação dos sistemas jurídicos ao elemento extralegal, à natureza das coisas, segundo a expressão dos racionalistas, e assim temos o direito como krinein e dikazein (Lei de Gortyna), como strictum ius e bona fides, civil e pretoriano, legal (ou legislado) e natural, severo e equitativo (strenges und billiges Recht), o direito e a equidade, direito efetivo (geltendes Recht) e direito justo (richtiges Recht), positivo e racional, common law e equity, regra imposta e regra induzida. De modo que o Homem se serve das correntes filosóficas, das tendências de ocasião, das convicções gerais, racionalistas ou não, intelectualistas ou pragmatistas, para passageira justificação da livre pesquisa do direito. Apenas tacteia nas trevas, falto de métodos científicos, como acontece no nascedouro e nos primeiros estádios de todas as ciências. Na investigação científica há preparativos e ensaios para criar, mediante dados seguros, a convicção, o reconhecimento efetivo da verdade que se formular e que, na hipótese, equivale e pode sempre expressar-se em regras. Ora, tal convicção é, de si mesma, reconhecimento, e uma norma reconhecida é norma válida, a que se não podem recusar o valor, a incidência e a força de aplicação. [....] há as regras escritas de interpretação e fontes, susceptíveis, como as outras, de violação in thesi [44].

Ora bem, a proscrição desse critério de “vontade do legislador”, como o da “vontade da lei”, foi profusamente estudada, com aceitação na Alemanha de então, por Pontes de Miranda, em 1921, Só relevam o sentido e orientação da norma publicada (que sai do mundo da política) [45].
É tema, digamos, nuclear, que se pode estudar em PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Tomo I. Rio de Janeiro: Borsói, 1954, p. 3-78 [46].
O artigo Subjektivismus und Voluntarismus im Recht. Sonderdruck aus Archiv für Rechts- und Wirtschaftsphilosophie, Band XVI, Heft 4, Berlin-Grunewald, 1921, p. 522-543 (de Pontes de Miranda), aparece traduzido por na 2a. edição de o Sistema de ciência positiva do direito, tomo II, p. 199-219. Talvez tenha faltado nesta nota por lapsus maquinae o adjetivo “analógica”: “entre os limites da interpretação analógica e a livre pesquisa do direito.”
A livre pesquisa, com o método indutivo experimental, é de alto proveito científico, também para o direito penal, pensamos nós [47].
Interpretação autêntica. A chamada “interpretação autêntica” só é admissível como passo de interpretação quando estiver contida em lei. Neste caso, dizemos nós, a situação é bem outra: lei interpretativa e não método de exegese [48].
Final. Por fim relacionamos aqui mesmo no texto algumas dignas de nota.

Em geral, de ciência profunda, esta matéria está em Pontes de Miranda no trabalho apresentado em Nápoles Vorstellung vom Raume. Atti del V Congresso Internazionale di filosofia. Napoli, 1925[49] e em Sistema de ciência positiva do direito. 2ª ed., 4 tomos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, tomo I, página 20 e seguintes e 286 e seguintes.

Também: THEODOR STERNBERG, Allgemeine Rechtslehre, Leipzig, 1904, 23; Einführung in die Rechtswissenschaft, Berlin und Leipzig, 1920, I. 21 [50] e ERICH JUNG, Rechts- und Rechtsgewissen, Archiv für civilistische Praxis, (1920), 16 e 19. [51]

Breves conclusões.
(1) Em se tratando de assunto jurídico, saber "o que a coisa é", isto é, o conhecimento da "verdade" do Direito em qualquer das suas acepções tem os seus pressupostos. A mais moderna delas no século XXI é a via do método indutivo experimental. (Tal se dá, aliás, em todo tipo de atividade cognitiva). Colhe-se uma proposição depois de prolongada, cuidadosa observação. Feito isto, autorizada fica a generalização da proposição, sem a priori — eis aí a indução. Mas, o erro ocorre com frequência; precisamos voltar mais vezes sobre os mesmos fatos observados, procurando a confirmação deles — eis aí a experimentação. Este ato de corroborar a conclusão anterior colhida, dá ao pensador mais segurança (mesmo sabedor ele de essa colheita não poder ser havida como certeza definitiva, absoluta).
(2) Toda a realidade por nós experienciada dá-se-nos em relações. A relação jurídica é apenas uma classe delas, dentre muitas outras, sociais; há sete relações sociais mais determinantes do modo ser e de atuar dos seres humanos — Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência.
(3) Todo fato jurídico se compôe de regra jurídica e de suporte fático. A regra jurídica só é mais completamente entendida (exegese) quando se comprende o fato regido por ela (interpretação).
(4) Ainda: na relação sociológia entram relações lógicas, quantitativas, físicas e biológias. O estudioso de Direito há de apreciar estas ciências particulares para entender a relação jurídica, e obter dela o máximo de visão geral, mais precisa e rigorosa e exata, do mundo humano. Tal visão a ser extraída, nas suas conclusões, de pesquisadores exponenciais.
(5) O conhecimento científico é o obtido pelo método indutivo experimental. Tem a vantagem de ser com ele que o estudioso logra o máximo aceitável de neutralidade. Esta circunstância é de especial relevo para o professor de direito, para o advogado parecerista e para o magistrado de qualquer Instância. Todos estes, além de outros profissionais do Direito, trabalham continuadamente com regra jurídica e suporte fático. Para acertar, necessita de aprender e de corrigir-se sem cessar na exegese da primeira e na interpretação do segundo.
(6) Já o corrigir-se exige mais que conhecimento; falamos da capacitade moral de criticar-nos, de rirmos cada qual de si próprio, e de sorrir com esperança de horas mais profícuas. Esta atitude moral diminui a arrogância e a agressividade. Gera a humildade no sentido de "verdade sobre si próprio" no mundo. Este exercício fortalece o espírito humano no árduo esforço de se adaptar cognitivamente aos seres; retira os inchaços inconscientes do ego, que se liberta da servidão de vicios acumulados. O clima para o conhecimento científico pode assim renascer a cada dia.
(7) "Direito natural" tem que ser entendido como resultado da aplicação da equidade, resultado esse que já o torna um direito posto, um direito positivo, mesmo não sendo o direito escrito. Ora bem, aplicar a equidade com o mínimo possível de erros pressupõe longo tirocínio na prática da ciência positiva. A nada servem as generalidades elegantes e formalmente lógicas das filosofias, a não ser para efeito literário, como enfeites retóricos. Com isso já se afasta ela, pois, da ciência. É vantajoso que os profissionais do Direito se livrem dessas vaidades inúteis, danosas a si e ao público (=Povo).
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*
Santos, maio de 2011.

[1] Em 50 anos de contato com a teoria e a prática do direito, frequentando livros de muitos escritores em vários idiomas, a leitura desse autor brasileiro, nas suas mais variadas obras, sempre nos assoma nova; é um refrigério de saber esse gênio pátrio de insondável seriedade e profundidade. Ajusta-se-lhe a denominação de Mestre.

[3] NÁUFEL, José. Novo dicionário jurídico brasileiro. 4ª ed. rev. at. amp. 3 v. Rio de Janeiro: Editor José Konfino, 1965, tomo II, página 318 e tomo IV, p. 357.

[4] Ver YARZA, Florencio I. Sebastian. Diccionario griego-español. Barcelona: Ed. Ramón Sopena, 1972, páginas 568-569.

[5] Ver também CREIFELDS, Carl. Rechtswörterbuch. 13te. Auflage. München: C. H. Beck’s Verlagsbuchhandlung, 1996, página 608 cc. 692-693 e LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. Berlin: Springer, 1991, longamente nas páginas 11-188, e ainda páginas 313-316. Também MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 8ª ed. São Paulo - Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965 e SILVEIRA, Alípio. Hermenêutica no direito brasileiro. 2 v. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968.

[6] Preferimos aspear valores para evitarmos o discurso axiológico (ver http://de.wikipedia.org/wiki/Axiologie_(Philosophie). Cientificamente os valores são atos interiores que medem necessidades ou anseios determinados pela natureza humana sobretudo nos processos sociais de adaptação de conteúdo mais cultural (religião, moral, artes).

[7] Ver CASSIRER, Ernest. Die philosophie der Aufklärung. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 1998, p. 439-443.

[8] CASSIRER, Ernest. Die philosophie der Aufklärung. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 1998, p. 437-440.

[10] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2ª ed., 4 tomos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972.

[11] Ver, a esse respeito, SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, página 222; mais preciso, PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2ª ed., 4 tomos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972 vol. I, passim

[12] SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, p.29-48.

[13] Cassirer, p.368-462.

[15] Ver (longamente) SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, páginas 48-78.

[16] Ver FERREIRA, Pinto. Princípios gerais do direito constitucional moderno. 5ª ed. amp. at. 2 v. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971, vol I, páginas 46 (in medio) e 50-54.

[18] Note-se não haver unanimidade nessas "leituras" do mundo, como se vê em http://de.wikipedia.org/wiki/Interpretation

[19] Leiam-se, entre outros autores, PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Introdução à sociologia geral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980; CAPRA, Fritjof. The hidden connections: integrating the biological, cognitive, and social dimensions of life into a science of sustainability. New York: Doubleday, 2002; DURKHEIM, Émile. Sociologia e filosofia. 2ª ed. Trad. J. M. de Toledo Camargo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1970; GIDDENS, Anthony. Novas regras do método sociológico. Trad. Maria José da Silveira Lindoso. Rio de Janeiro: Zahar, 1978; KURZ, Robert. Der Kollaps der Modernisierung. Frankfurt-am-Main: Eichborn Verlag, 1991; MENEZES, Djacir. Princípios de sociologia. Porto Alegre: Globo, 1934; PIAGET, Jean. Estudos sociológicos. Trad. Reginaldo Di Piero. Rio de Janeiro: Forense, 1973.

[20] Ainda não temos a íntegra desse acórdão. Este assunto merece estudo à parte.

[21] FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Interpretação e estudos da Constituição de 1988. São Paulo: Atlas, 1990, p.11-14.

[22] Leia-se a PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. A sabedoria da inteligência. 2ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1960, p. 147-221 e A sabedoria dos instintos. 3ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1960, p. 9-140.

[23] Ver COELHO, Luiz Fernando. Lógica jurídica e interpretação das leis. 2ª ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 177-200. Ver também

[24] Ver MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 2ªed. São Paulo: Atlas, 1997, p.39 (invocando J. J. CANOTILHO & V. MOREIRA, Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, p. 136).

[25] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais (Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP). Brasília: Ed. Brasília Jurídica, 2000. p.17-19.

[26] Não cogitamos, pois, de eventual lex ferenda. Nem de disquisições filosóficas, ou estéticas, sobre o processo social de adaptação jurídica. Exposições sobre "filosofia do direito", por elegantes que pareçam ser, não se integram no conhecimento científico do Direito. Têm pouco ou nada de elementos cognitivos (que aquelas, aliás, podem até empecer).

[27] Ver Pontes de Miranda, Sistema, III, 277-283.

[28] Ler Pontes de Miranda, Sistema, IV, 77-78 e 82.

[30] Pontes, Sistema, III, 286-288.

[31] Ver Pontes, Sistema, IV, 79-85.

[32] Desejava Pontes de Miranda com uma frase emblemática que no pórtico de todas as faculdades de direito estivesse escrito: “Aqui não entra quem não for sociólogo (e quem diz sociólogo, diz matemático, físico e biólogo)”.

[33] Idem, ibidem, p. 86-92.

[34] Pontes, Sistema, III, 289-293.

[35] Novamente: Sistema, III, 293-297.

[36] Valemo-nos aqui da obra BETTIOL, Giuseppe. Direito penal. Trad. Paulo José da Costa Júnior e Alberto Silva Franco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1966 (passim).

[38] Ver FIRMO, Aníbal Bruno de Oliveira. Direito penal. 2ª ed. 4 tomos. Rio de Janeiro: Forense, 1959-1966. Isto, dizemos nós, é o que outros autores denominam “interpretação extensiva”.

[39] Ver Pontes de Miranda, Sistema, II, p. 102-109.

[40] Pontes de Miranda, Sistema, II, p. 112-114.

[41] Ver a esse respeito, em diferentes áreas do conhecimento, na enciclopédia livre, Wikipedia, em idiomas diversos, notadamente http://de.wikipedia.org/wiki/Komplexit%C3%A4t

[42] Pontes de Miranda, Sistema, II, p.117-118.

[43] Ver a respeito, SCHWARTZENBERG, Roger-Gérard. Sociologie politique: éléments de science politique. 30ª ed. Paris: Montchrestien, 1977, p. 475-659. Schröder lembra a esse respeito frases dos clássicos F. Fuárez e De Soto em que ambos sustentam essa potencialidade do direito ideal segundo a Moral daquele tempo, havida como eterna, absoluta — SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, página 18, nota 1 e PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2ª ed., 4 tomos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, tomo I, p. 96. Contra: SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, páginas 104-108. Neste ponto Jean SCHRÖDER acompanha o brasileiro Pontes, que deu solução ao problema em 1922.

Ver SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, páginas 15-16. Para tanto leia-se GÉNY, François. Science et Technique en Droit privé positif, Paris, 1921, III, página 18 (onde discute a dicotomia “donné” e “construit”) apud Pontes de Miranda, Sistema de Ciência Positiva do Direito, 2ª. ed., tomo III, página 252.

Este cuidado consta de capítulo do livro: FÁVARO, Diocélia da Graça Mesquita. A formação do jurista, in FREITAS, Vladimir Passos (coord.). Direito em Evolução. Curitiba: Juruá. 2000. (A co-autora é juíza do PR).

[44] Sistema, tomo I, página 20.

[45] Ver Pontes de Miranda, Subjektivismus und Voluntarismus im Recht. Sonderdruck aus Archiv für Rechts- und Wirtschaftsphilosophie, Band XVI, Heft 4, Berlin-Grunewald, 1921, p. 522-543. LARENZ, op. cit., p. 333-338.

Ernst Cassirer é havido como o principal representante da Escola de Marburgo, fundada por Hermann Cohen, como se vê em UEBERWEG, Friedrich. Grundriss der Geschichte der Philosophie, tomo IV, Graz: Akademische Druck- u. Verlaganstalt (13. Auflage), 1951, página 443. Ver, pois, CASSIRER, Ernest. Die philosophie der Aufklärung. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 1998, p. 313-318, 324-339 e 361-367.

Com profundidade maior, leia-se PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2ª ed., 4 tomos. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, t. IV, páginas 77-92.

Sobre CASSIRER,, consulte-se. UEBERWEG, Friedrich. Grundriss der Geschichte der Philosophie, tomo IV, páginas 443-444.

[46] Ver também, menos profundo, DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. São Paulo: Saraiva, 1996, páginas 21-34 e 8º-84.

Ainda: o nosso OLIVEIRA, Mozar Costa de. Paixão, razão e natureza (Investigação sobre o discurso normativo) — tese de doutorado na USP sob a orientação do professor Miguel Reale, defendida no segundo semestre de 1990. [Resumo em Revista de Estudos e Comunicações – Leopoldianum {Universidade Católica de Santos}. Santos: v. XX, nº 56, abr./1994].

[47] Algo deste tema aparece em NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. 4 v. São Paulo: Saraiva, 1959-1962, v. I, página 64-75. Próxima à posição de J. F. Marques [47] é de a quem o precedeu, N. Hungria. Este só admite a “Exposição de Motivos” como elemento histórico. Consta essa, redigida por Francisco Campos, da obra clássica “HUNGRIA, Nelson; CARVALHO FILHO, Aloysio de. Comentários ao código penal. 2ª ed. rev. at. 9 v. Rio de Janeiro: Forense, 1953-1959, páginas 201-274.

[48] Com ideias aproximadas, ver MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Ed. Atlas, vol. 1, 13ª ed.,1998, páginas 49-52. A esse mesmo respeito ver também o nosso Paixão, razão e natureza (Investigação sobre o discurso normativo) notadamente capítulos de VII a IX. Foi nossa tese de doutorado na USP sob a orientação do professor Miguel Reale, defendida no segundo semestre de 1990. Há um resumo publicada na Revista dos Tribunais. s.d.: nº 678, p. 37-51.

[49] Sobre a filosofia do Als Ob e as suas aplicações, da matemática às ciências sociais, ver UEBERWEG, Friedrich. Grundriss der Geschichte der Philosophie (tomo I) Basel: Benno Schwabe & Co. Verlag (13. Auflage), 1953. (tomo II) Graz: Akademische Druck- u. Verlaganstalt (12. Auflage), 1951. (tomo III) Graz: Akademische Druck- u. Verlaganstalt (14. Auflage), 1953. (tomo IV) Graz: Akademische Druck- u. Verlaganstalt (13. Auflage), 1951. (tomo V) Graz: Akademische Druck- u. Verlaganstalt (13. Auflage), 1953. Ueberweg, IV, 410-416.

[50] "[...] der Grund, weshalb die sozialen Normen gelten, liegt stets in der sittlichen Ueberzeugung von ihrer Richtigkeit, in ihrer Anerkennung". [O fundamento sobre que se assenta a validade das normas sociais é sempre a tradução ética da sua ligitimidade ao serem acolhidas].

[51] De sobredireito (regras jurídicas a incidirem sobre regras jurídicas) não cuidamos aqui, como ficou dito acima.

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