quinta-feira, 4 de novembro de 2010

NÃO VÁ O REMENDÃO ALÉM DA ALPARCA — “NE SUTOR ULTRA CREPIDAM”


NÃO VÁ O REMENDÃO ALÉM DA ALPARCA — “NE SUTOR ULTRA CREPIDAM”

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(1) Duas particularidades do material ora inserido no blog-Google.

Figura em primeiro lugar o currículo do autor do texto, professor Sergio de Carvalho Pachá. A meu pedido remeteu-me ele esse histórico acadêmico. Mostra o bom preparo do articulista para escrever o que remeteu ao jornal “Folha de São Paulo”.
Segue-se-lhe o texto sobre José Sarney, “Ne sutor ultra crepidam”. É uma crítica acerba a quem se arrisca a cometimentos superiores ao seu preparo. Daí o dito Não vá o remendão além da alparca”. Por outra, “que o sapateiro não ultrapasse a feitura da sandália”, “não vá alguém além da sua sabença corriqueira”.
A leitura interessa a quem se ocupa das questões morais. Nem é matéria de somenos. A vaidade é forma de orgulho, e este vem a ser um dos mais lamentáveis vícios capitais. Por aí muita vez tem começo a derrocada ética das pessoas. Ora bem, o senhor criticado tem larga história política e é até membro da ABL.
Mozar Costa de Oliveira — bacharel em filosofia (Universidad Comillas de Madrid), mestre e doutor em direito (USP), professor aposentado de direito (Universidade Católica de Santos, São Paulo).
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(2) CURRICULUM VITAE

1.   DADOS PESSOAIS

Nome: SERGIO DE CARVALHO PACHÁ
Nacionalidade: Brasileira
Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.
Nascimento: 21 de fevereiro de 1940.
Filiação: Jorge Pachá e Regina de Carvalho Pachá
Estado civil: Divorciado.
Identidade: I.F.P. 1 526 003
CPF: 304 017 987 – 04
Certificado de registro de professor licenciado: F – 1 540 – GB


2.   FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Bacharel em Literatura Portuguesa, pela PUC-RJ (1966).

Licenciado em Letras (Língua Portuguesa e Literatura Portuguesa e Brasileira, Língua e Literatura Latina), pela PUC-RJ (1966).

Mestre em Língua Portuguesa, pela Universidade Federal Fluminense (1983).

Curso completo de doutorado em Línguas e Literaturas Hispânicas, pela Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, CA (1988).

2.1 CURSOS DE COMPLEMENTAÇÃO

Curso sobre Gil Vicente, promovido pela PUC-RJ (1965).

Aliança Francesa do Rio de Janeiro, 5ème e 6ème littéraire (1965-1966).

Ouvinte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Cursou Lingüística Portuguesa I e II e Literatura Portuguesa I, II e III (1966-1967). Participou, em março de 1967, de uma pesquisa dialectológica de campo, em Guadramil e Miranda do Douro, Trás-os-Montes, promovida e orientada pelo lente da cadeira de Lingüística Portuguesa I, Professor Luís Filipe Lindley Cintra.

Curso “A Tradução Vivida”, ministrado pelo Professor Paulo Rónai, sob os auspícios da Aliança Francesa do Rio de Janeiro (1975).


3.   EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL

Professor de Língua Latina no curso pré-vestibular da Faculdade de Direito da PUC-RJ (1961-1962).

Professor de Língua Portuguesa no curso extraordinário do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores (1964).

Professor de Língua Portuguesa e Língua Latina no Curso Boechat (1964-1965).

Professor de Literatura Brasileira no curso pré-vestibular da Faculdade de Direito da UEG (1965-1966).

Professor de Língua Portuguesa no Colégio Santo Agostinho (1971).

Professor de Língua Latina e Cultura Clássica no Colégio São Paulo (1971).

Coordenador de Lexicografia de Bloch Editores. Chefiou uma equipe de quatro lexicógrafos e respondeu pela atualização do texto, atualização ortográfica, acréscimos e supressões de verbetes e reelaboração dos étimos do Dicionário da Língua Portuguesa, de Antenor Nascentes, destinado a ser reeditado em fascículos, sob os auspícios da Academia Brasileira de Letras (1971-1973).

Editor de texto da revista Comentário (1971-1972).

Pesquisador-Adjunto do Centro de Pesquisas, Setor de Filologia, da Fundação Casa de Rui Barbosa (1976-1982).

Revisor de textos técnicos do Centro de Pesquisas Leopoldo Miguez de Melo (CENPES), da Petrobras (1983).

Perito do Juízo de Direito da 16ª vara cível do Rio de Janeiro, nomeado pelo titular daquela vara, aos 19 de setembro de 1983, a fim de assessorá-lo num processo de plágio.

Professor de Língua Portuguesa nas Faculdades Bennett (1984).

Teaching Associate de Língua Portuguesa e Língua Castelhana, na Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, CA (1984-1988).

Professor de Língua Portuguesa (1985-1989) e de Literatura Brasileira (1993),
nos cursos de verão da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, CA.

Visiting Lecturer de Língua e Literatura Portuguesa, na Universidade do Arizona (1989-1990).

Lexicógrafo-Chefe da Academia Brasileira de Letras, de maio de 2002 a junho de 2009. Coordenou a equipe lexicográfica que preparou a quarta edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da A.B.L. (2004) e redigiu a versão prévia do plano de edição do Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras. (Foi esta a terceira ou quarta tentativa do gênero, desde a fundação da A.B.L., e, como as precedentes, abortou).  Ao mesmo tempo, foi o principal responsável pelas respostas dadas pela Academia Brasileira de Letras às consultas de Língua Portuguesa a ela dirigidas, assim do Brasil como do exterior.


4.   ALGUNS TRABALHOS PUBLICADOS

4.1 VERBETES ENCICLOPÉDICOS

Na Enciclopédia Século XX (Rio de Janeiro: Expansão Editorial, 197...): Acróstico, Alegoria, Alfabetização, Alfabeto, Analogia, Aramaico, Camões.

Na Enciclopédia Mirador Internacional (Rio de Janeiro: Encyclopaedia Britannica.do Brasil, 197...): Camões.

4.2 ARTIGOS E ENSAIOS PUBLICADOS NA IMPRENSA

“Invenção de Inês” (ensaio classificado em segundo lugar, no primeiro Concurso ESSO de Literatura para Universitários). Jornal de Letras, RJ, julho de 1966.

“Afrânio, Camonista”. Tribuna da Imprensa, RJ, 19.12.1976.

“Um Cancioneiro”. Jornal de Letras, RJ, agosto de 1980.

“Os Sonetos de Camões, por Cleonice Seroa da Motta Berardinelli”. Jornal de Letras, RJ, fevereiro-março de 1981.

Sonetos de Camões”.  O Estado de S. Paulo, S.P., 24.01.81.

“Três Motivos que Explicam o Renovado Interesse por Vieira”.  Jornal do Brasil, RJ, 27.01.01.

Os Lusíadas para Crianças”. Jornal do Brasil, RJ, 11.10.08.

4.3 OUTROS TRABALHOS

Rui Barbosa. Los Conceptos Modernos del Derecho Internacional. Texto estabelecido por Sergio Pachá.  Obras Completas de Rui Barbosa, volume XLIII 1916, tomo I. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 198...

O Falso Original da Conferência de Buenos Aires e Seu Autor. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: 1983.

Tomás Antônio Gonzaga. Marília de Dirceu. Texto estabelecido e anotado por Sergio Pachá. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2001.

“Pior ou Peior?”. Miscelânea: 80 Anos de Adriano da Gama Kury. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2005.

4.4 ALGUMAS TRADUÇÕES

Rui Barbosa. Saudação a Anatole France. Tradução [do francês], introdução e apêndices de Sergio Pachá.  Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1980.

Rui Barbosa. Os Conceitos Modernos do Direito Internacional. Estabelecimento do texto do original castelhano, tradução, notas, apêndices e introdução por Sergio Pachá. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1983.

André Breton. Manifestos do Surrealismo. Tradução [do francês] e notas de Sergio Pachá. Rio de Janeiro: Nau Editora, 2001. (Trabalho laureado com o Prêmio Paulo Rónai de Tradução, da Fundação Biblioteca Nacional, em 2001).


4.5 ALGUNS TRABALHOS INÉDITOS

“Laura, ou Breves considerações sobre o petrarquismo camoniano” (1966).

“As fontes teóricas de Mário Barreto em Novos Estudos” (1978).

“As fontes teóricas dos dispersos de Sousa da Silveira” (1979).

“Um soneto de Camões” (1979).

“Paronímia, homonímia e polissemia em seis sermões de Vieira” (1979).

“Quatro argumentos breves contra o abandono dos estudos clássicos no Brasil, e, em particular, nas faculdades ditas de Letras” (1979).

Vulnera ... Sidera ... Tentame de comentário estilístico do soneto de José Severiano de Resende” (1980)

“O quarteto de Alexandria, ou de como nasceu a Filologia Clássica” (1980).

“Notas a um exórdio de Vieira (o do Sermão das Lágrimas de São Pedro)” (1980).

“Uma Senhora engalicada. Ensaio sobre alguns galicismos de José de Alencar” (1980).

“Quem foi Meillet?” (1981).

“A língua em que cantaste. Ensaio sobre cantar e cognatos na obra de Camões”
(Trabalho classificado em terceiro lugar no concurso de monografias promovido pelo Real Gabinete Português de Leitura, do Rio de Janeiro, em 1981).

“Portugal e os portugueses em Cervantes” (1985).

“O conceito de corpus em Crítica Textual” (1989).

A A.B.L. Responde: Lições de Português pela Internet (livro já concluído e ainda não publicado. O título é passível de modificação).

5.   CONHECIMENTO DE IDIOMAS ESTRANGEIROS

Inglês: fala, lê e escreve.
Francês: fala, lê e escreve.
Espanhol: fala, lê e escreve.
Italiano: lê e escreve.
Latim: lê e escreve.
Grego clássico: lê.

Rio de Janeiro, 28 de outubro de 2010.
SERGIO DE CARVALHO PACHÁ

Residência: Rua Voluntários da Pátria, 367, apartamento 302.
Botafogo, Rio de Janeiro, RJ.   CEP 22 270 – 000.
Telefone residencial: (21) 2226-8085.  Celular: (21)8746-7350.
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(3) Por fim o texto do professor Pachá — NE SUTOR ULTRA CREPIDAM

Sobre ser mau literato e pior político, o Senhor José Sarney provou também que é péssimo latinista, na coluna por ele assinada na Folha de S. Paulo de 15 de outubro passado. 
“Petrônio”, proclama o vate dos Marimbondos de Fogo, “diz que Deus assim quis porque fez o medo antes de revelar-se. ‘Primus in orbe deos fecit timor’ (Primeiro no mundo Deus criou o medo).”
O segmento de verso latino aqui citado abre, realmente, o quinto fragmento poético atribuído a Petrônio; é mais conhecido, contudo, através de  Estácio, que o reproduziu literalmente no verso 661 do livro terceiro da Tebaida, um poema épico composto aproximadamente entre 80 e 92 da era cristã.
Como quer que seja,  a tradução perpetrada pelo Senhor Sarney está errada. Na verdade, o que o poeta diz é exatamente o oposto do que se lê na inepta interpretação deste maranhense que mataria de vergonha o grande Odorico Mendes, tradutor de Virgílio e Homero. Em latim lê-se o seguinte: “Primeiro no mundo [Primus in orbe], o medo fez os deuses [timor fecit deos]”. O sujeito de fecit [= fez] é o nominativo singular timor [= o medo]; o objeto direto de fecit é o acusativo plural deos  [= os deuses]; Primus in orbe é um aposto circunstancial do sujeito. Trata-se de uma construção corrente no latim, que apresenta como atributo do sujeito um termo da oração [Primus, “Primeiro”]  que, em nossa língua, mais depressa tomaria a forma de adjunto adverbial [“Pela primeira vez”]. Em bom vernáculo, portanto, teríamos a seguinte tradução: “O medo, pela primeira vez no mundo, fez os deuses.” Claro e hialino para qualquer primeiranista de latim (no tempo em que havia primeiranistas de latim). Mas não para o Senhor Sarney, que, do alto de sua acadêmica onisciência, sisudamente mete os pés pelas mãos e vende gato por lebre a seus leitores.
Já agora, uma vez que o latim do Senhor Sarney não dá para traduzir nem sequer o título da fábula Gragulus superbus et pavo, de Fedro, onde se nos conta a história do gralho que se adornou com penas de pavão e levou uma coça dos pavões de verdade, aos quais tivera o descoco de exibir-se, ouso sugerir ao insigne beletrista e pai da pátria que decore e repita muitas vezes em português certa máxima latina feita sob medida para sua pomposa insciência : “Não vá o remendão além da alparca”. (Para os que sabem latim, aqui está ela em sua forma original: Ne sutor ultra crepidam).
Sergio Pachá.








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