domingo, 7 de fevereiro de 2010

Patriarcalismo brasileiro e a sua atuação corruptora.

À guisa de introdução. Este trabalho será provavelmente um dos capítulos finais de livro sobre as raízes da corrupção. Está dividido em itens, assim: 1 — Patriarcalismo em duas épocas da história do Brasil; 2 — Alguns vícios no patriarcalismo; 3 — Fatos dos nossos dias; 4 — Raça, cultura, estrutura; 5 — Novo surto educacional; 6 — Novos valores a encontrar ou reencontrar; 7 — Algumas outras lições da história pátria.

Cada item leva, em itálico, a chamada sobre um subitem. O intuito é tornar menos pesada a leitura. Eia, pois.

* * * * * *

1 — Patriarcalismo

Algumas das características do patriarcalismo da antigüidade, com pontos e linhas a partir pelo menos do primeiro livro da Bíblia, vieram com o catolicismo para o Brasil Colônia. O caso do senhor de engenho, de gado e de café é típico (Casa-Grande & Senzala, páginas 34, 36, 51, 421, 435, 456, 540, 556 etc.).[1] E estas prevalecem, ao menos inconscientemente, hoje: admitir alguma inferioridade psíquica e social da mulher (já esconjurado como machismo), o culto ao homem de prestígio — dotado de poderes (religioso, político, econômico, jurídico), capaz de exercer influências.

Cumpre, no Brasil, distinguir entre praticado no período colonial (e em parte da monarquia) e o patriarcalismo atual ou de sempre. Nesta segunda concepção vem a ser o mesmo tronco de vício ou fraqueza humana — a vontade de dominação, o tratamento da pessoa como coisa, quer dizer, é a planta do orgulho, da soberba, do falso sentimento de superioridade. Entram aí todas as ramas do egocentrismo falseador de realidades, como vaidade, a prepotência, a petulância, o autoritarismo, o modo animal de ser no relacionamento humano.

No tocante ao conceito clássico da história brasileira, Sérgio Buarque de Holanda discorda do conceito de patriarcalismo, como o apresenta G. Freire [2]:

“[...] no patriarcalismo brasileiro nota o sr. Gilberto Freire "uma tendência para o traje se uniformizar no do adulto respeitável - onde os meninos de roupa de homem, cartola e bengala que Rendu achou parecidos com as marionetes das feiras francesas - e as meninas vestidas desde cedo como senhoras...." (pag. 246). Assim, o que para um francês do século XIX já pertencia a um passado morto, ainda sobrevivia entre nós e ganhava sabor exótico. Mas não era certamente fruto especifico de nossa civilização patriarcal. A forma da sociedade brasileira, se tivermos de aceitar noção tão violentamente realista, como essa que nos propõe agora o sr. Gilberto Freire - realista menos no sentido da sociedade atual do que da teologia medieval - não foi suscitada na área da cana de açúcar, ou em outra região brasileira particular; mais plausível é acreditar que veio acabada de Velho Mundo, adaptando-se aqui, mal ou bem, às circunstancias geográficas, étnicas, econômicas, próprias às diferentes áreas, e assumindo, em cada uma, feição diversa. O alfa da constelação de regiões tão claramente diferenciadas entre si, que se formaram nesta America portuguesa, estaria, pois, na Europa lusitana e ibérica, não no mundo da casa grande e senzala ou em alguma outra área regional da colônia. É claro que qualquer pronunciamento decisivo, neste ponto, há de colorir-se fortemente de noções subjetivas e amparar-se, em ultima analise, sobre simples preferências pessoais. Não creio, porém, que para a inteligência de nosso passado e de nosso presente, seja forçoso admitir um principio formal tão elástico, próprio para lisonjear esta ou aquela vaidade regional, servindo a sentimentos, ressentimentos, paixões, preconceitos, conveniências às vezes momentâneas e quase sempre polêmicas. À obra do sr. Gilberto Freire ela nada acrescenta de duradouro. Nem serve certamente, aos seus adversários, quando se apóiam no mesmo critério, embora movidos por sentimentos regionais diversos dos seus”.

O que se há de dizer. Uma característica marcante desse tempo, e desse regime ético e jurídico, é a falsa superioridade do paterfamilias. Era o chefe do grupo familiar e, mais, era o dominus quase absoluto — o dono dos outros homens e das outras mulheres. Esta superposição, este superpoder tem o impulso psicanalítico do egocentrismo, origem dos males humanos. Ao se dizer mal cumpre afastar o subjetivismo. Seria uma discussão sem fim e sem resultado, desfilando nela concepções filosóficas em luta incessante, velha e cansativa.

Bem e mal. Este é o tema universal. A separação bem-mal veio a acentuar-se explicitamente com os estudos do persa Mani, donde o termo e o conceito de maniqueísmo. [3] A referência é o ser humano, já que se trata de estudar o bem e o mal no homem. Animal o homem, sim, também é. A diferença entre o homem e o animal bruto está na capacidade humana de raciocinar e de dedicar-se aos seus semelhantes. Em termos populares expressivos: capacidade de pensar e amar. O bruto é incapaz desses dois feitos, de modo que a dignidade humana consiste nessa sua capacidade inata, presente em grandíssima parte da Humanidade toda. O reconhecimento dessas qualidades equivale à enunciação da dignidade e, pois, de ser bom e ser mau. Bom é o digno especificamente humano; mau o indigno humano. As ações mais conducentes à dignidade humana são boas, são moralmente melhores; ruins, moralmente piores, são as condutas deteriorantes desse nível de vida.

Isto significa que em muito se reduziu a dignidade nas relações humanas com os vícios dos ricos absolutistas de Brasil Colônia e de Brasil Império. O escravo era instrumento de trabalho, como os animais domésticos. A mulher era instrumento de procriação, ou de deleite sexual. Fora de valorização estava a sua dignidade específica. Assim, a quase nada se reduziu a vivência democrática naqueles círculos sociais. A liberdade, física e psíquica, era um quase nada. Nenhuma era o senso de igualdade — tudo era escravidão, ou servidão.

Ou seja, era a vida humana em trapos de atraso humanitário — deteriorou-se, danificou-se, adulterou-se, desperdiçou-se, estragou-se; numa palavra, corrompeu-se.

Alimentação brasileira. Ela teve influência na formação social do nosso país, afirma G. Freyre, sem que daí se excluam também o clima e a miscigenação. O fato é que o solo, com as suas propriedades físicas e químicas, determinam o tipo de vegetação espontânea. Com a monocultura, veio a deficiência das fontes naturais de nutrição. O regime escravocrata e latifundiário tornou ainda mais complexa, e difícil de combater, essa fonte de desnutrição. Seguiu-se daí o mau desenvolvimento físico e a pouca eficiência econômica de muitos brasileiros. Foi de apoucado efeito o fato de esse tipo de economia ter dado alguma estabilidade ao Brasil Colônia. As fontes de nutrição e vida ficaram pervertidas. Os negros das senzalas, contudo, eram instrumentos de produção. Somente por causa disso eram mais bem alimentados. Saíram fortes e sadios, atletas de capoeiras, de lutas e marujos. A população média era livre, mas fisicamente débil: anemia palúdica, beribéri, verminoses, sífilis etc.

Essas causas sociais influíram no Brasil de hoje, pensamos, porque essa economia danosa ocorreu também depois na economia do gado e do café. É ainda grande o número de brasileiros subnutridos (desigualdade social grave).

Outra herança ruim proveniente do Brasil Colônia e do Brasil Império, bem como grande parte da República, é a não-existência de “povo” (p. 96-97). Temos de dizer que este enfraquecimento das grandes massas (povo) é uma fonte de corrupção. Quem mantém a situação de poder pelo poder, despreza o povo. Sem o controle popular, as autoridades abusam do poder contra as pessoas mais simples da população. Do mesmo modo fazem outros poderosos. É uma situação propícia à corrupção. Longe estava o Brasil da regra jurídica constitucional pela qual todo poder emana do povo.

Outras notas típicas. De todo modo, algo procede numa e noutra concepção, de Gilberto Freyre e de Sérgio Buarque de Holanda (supra). Esse realce do masculino (o pai é o pai e é também o dono) dá, mais ao homem que à mulher, a falsa idéia de haver entre seres humanos o direito à altivez — convicção subjetiva de ser um ente superior ao comum das pessoas (soberba) —, direito aos atos de traição dos princípios de dignidade, à otimização para si de bens públicos (avareza), à ira contra os seus opositores etc.

Um ligeiro exemplo dessa herança cultural surgiu, em 2001 na Câmara, e em 2003 no Senado. É como se a estrutura jurídica de outrora ainda não houvesse mudado. Foi recentemente com a assim chamada verba indenizatória:

[...] um escândalo antigo a verba de R$ 15 mil por mês que cada congressista pode gastar. O assunto foi renovado pelo caso Castelogate - o do deputado Edmar Moreira, que usou o dinheiro para pagar serviços supostamente prestados por empresas de sua propriedade. As notas fiscais sempre foram guardadas em segredo. O que aconteceu? Quase nada. As notas fiscais antigas continuam secretas (apesar de essa opacidade ser inconstitucional) nas Casas presididas por José Sarney e Michel Temer. Na prática todos os congressistas que cometeram delitos nos últimos 8 anos foram perdoados. De abril de 2009 para a frente, em tese, tudo será divulgado. Até agora, muito pouco apareceu para ser verificado. [4]

2 — Alguns vícios no patriarcalismo. Está configurada aí a avidez por dinheiro com algum intuito político (favorecimento de alguém, busca de prestígio, vaidade em exercer influência sobre outras pessoas etc.). Junto, o interesse em aumentar o seu próprio poder (político geral ou sobre certo grupo). De qualquer modo trata-se de um desejo egotista, incontido e intenso. Os agentes não têm o comando sobre o surto do impulso. Esta a raiz capital da sua corrupção porque manda neles, com prejuízo do Povo, o egotismo não curado.

Pouco apreço histórico pela alma feminina. A negra servia como instrumento — de trabalho e de sexo. As brancas eram abertamente uns como que sacos de filhos. Até aos 14 anos, lindas as mais das vezes. Feito o casamento aos 13 anos, com 18 já tinham perdido os encantos e eram velhas aos 20 anos — desdentadas, esbranquiçadas, ou muito gordas ou magérrimas. Estas pela pouca saúde e as gordonas por falta de exercício físico (mesmo para a caminhada comum): ambas jovens e moleironas, até trôpegas mesmo — por menor que fosse o trajeto, eram transportadas pelas escravas em redes ou em liteiras. Mesmo dentro das igrejas, até o proibirem alguns bispos do NE.

A cultura dada à mulher era quase nenhuma. Muitas eram analfabetas e sem modos no trato — cuspir no chão, escarrar para os lados, muito mau gosto no modo de se vestirem e de ostentarem diamante, ouro e prata no corpo (páginas 489-491).

Foi este o ambiente da mulher no Brasil durante cerca de três séculos. Não se percebem, de parte do homem com ela, sinais de cuidado, carinho, ternura, afeto. Fica a hipótese de atualmente a mulher querer o máximo de liberdade sexual, quiçá em decorrência da lei psicanalítica da “compensação”. Sabe-se que tal só ocorre quando alguém ou em processo consciente se esforça para contrapesar defeitos reais ou fantásticos, seja no referente ao físico, ao desempenho, às habilidades ou aos atributos da psiké (sentido psicológico); ou vai à busca involuntária de mecanismos de defesa que, atuando inconscientemente, lhe permitem contrabalançar, ou afastar de si, o sentimento de deficiências, reais ou imaginárias (compensação em sentido psicanalítico). Parece certo que a compensação psicanalítica traz perigos de enfraquecimento da pessoa. Fraca esta, sem o poder interior de autodomínio ou comando pessoal, será provavelmente corrompida com facilidade e até quiçá um agente de corrupção.[5]

Um exemplo. Vamos a um exemplo, que vem confirmar o sobredito. Falamos do desdém pela permissividade, que pode ser uma causa de corrupção. Pense-se no caso da aluna da Universidade Bandeirantes (São Paulo); em 2009 se vestia com saia curtíssima e requebrava pelos corredores da instituição, mesmo depois de advertida verbalmente. Atraiu a ira dos colegas homens. Maltrataram-na indevidamente. Tinham de ser punidos, é certo. A maioria das pessoas que opinaram sobre o caso condenou apenas a universidade e os colegas da moça de 20 anos. A esta defenderam com unhas e dentes. Brincar com a sensualidade fora de limites de cada ambiente é, porém, um desvio de personalidade da própria mulher — a mulher de baixa auto-estima — porque a maioria dos grupos sociais querem cada coisa a seu tempo, espaço e modo em matéria de sexualidade. A luxúria assim manifestada é um dos vícios capitais. E, pois, corrompe embora pareça simpático insistir acriticamente na indefinida e quase ilimitada liberdade individual da mulher. Exsurge o conflito do “Eu versus outros”.

Luxúria: degradação sexual e dominação. O aumento da sensualidade entre os negros do Brasil resultou em grande parte da própria dominação que os senhores brancos exerciam sobre eles (p. 515).

É bem possível, dizemos nós, que esse fenômeno se deva à necessidade de descarga dos sentidos, uma maneira de se fugir, no seu tanto, das dores físicas e morais da dominação pela força. De modo que as duas raças mais atrasadas foram degradadas pelo domínio do branco, mais adiantado na cultura ocidental. A procriação de mulheres degradadas pelos brancos, também eles cheios de vícios ou fraquezas, foram fatores perigosos para a moralidade sexual: era, em grande parte, um pura descarga de sentidos, sem avançada sensibilidade do homem para com a mulher e vice-versa. A moleza dos ricos era também aumentada pelo trabalho escravo. Alguns dos senhores nem sequer andavam: eram carregados em redes ou em palanquins. Ajudavam-se de escravos e escravas até mesmo para se vestirem, calçarem, abotoarem as roupas, limparem-se, lavarem-se e em outros atos comezinhos de higiene íntima. Essa riqueza excessiva calcada sobre o trabalho escravo fez cada vez mais lânguida e morosa a vida dos aristocratas do açúcar. Depois, também os senhores do café e do gado. No século XVIII os pilares da economia brasileira eram açúcar e escravos, sobretudo no nordeste atual, com mais ouro e diamantes, sobretudo em Minas Gerais. Não há negar, portanto, a origem pouco gloriosa dessas riquezas, altamente aproveitadas pelo império português. Quanto à importação de escravos africanos a média anual terá sido de 7.500 na década de 1660 e duplicou ou até triplicou no final do século XVIII; em 1755 só de Angola vieram para cá 13.534 negros. Assim, numa estimativa de probabilidades, no período compreendido entre 1700 até 1820 foram importados pelo império português para o Brasil cerca de dois milhões de escravos.[6]

Luxúria e avareza. Continuemos a estudar o trabalho de G. Freyre. Diz ele a o clima quente pode ter contribuído para aumentar a lubricidade e languidez desses brasileiros. Mas não as criou nem produziu. Essa prosperidade enriqueceu muito os já ricos, porque o açúcar do nordeste era de alta qualidade. Daí a usura e os ganhos a aumentarem sempre, lícita ou ilicitamente, com [...] ladroíces, roubos [...], as brigas ferimentos, mortes [...] os estupros e adultérios [...], certo ainda que “o dinheiro fazia suspender os castigos...” (p. 515-517 e nota 44 da pág. 558). Esses males prazerosos eram capitalizados pelos patriarcas e seus asseclas, portugueses e brasileiros. Corrupção.

Luxúria vem a ter quase o mesmo significado de incontinência, lascívia, sensualidade desbragada, tudo isto em matéria de sexo. É elemento da luxúria a necessidade desregrada de fortes doses de prazeres individuais retirados ao corpo de outrem, tratando-se este como objeto de serviço íntimo da sexualidade solta. Há modalidades diversas como a pedofilia, o masoquismo, o sadismo, a zoofilia. A luxúria pode aproximar muito o animal homem do animal bruto e, pois, diminuir nele a capacidade entendimento e de auto-doação (se nos permitem o termo). As energias interiores dissolvem-se. A linguagem comum oferece também o termo “dissolução” como sinônimo de luxúria. E há mais. Com esta modalidade de fraqueza tanto homens como mulheres precisam de uma mal entendida “liberdade” donde, por causa de tamanho individualismo egocentrista, exsurge estoutro sinônimo — “libertinagem”. Alguns senhores de engenho dominados pela sede de prazeres e de soberba ou orgulho mantinham o intercurso sexual dentro das redes levadas por escravos, outros viciavam no sexo passivo meninos de tenra idade. Estes, por sua vez, freqüemente eram iniciados cedo na prática da sexualidade. Alcançados os vinte anos, ou bem menos, já estava grande parte deles coberta de doença venérea.

Uma das fontes dessa degeneração era (e é) o espírito dominado pela ânsia de poder sobre outrem, ou seja, os vícios ou fraquezas de soberba, vaidade, autoritarismo, arrogância — a inspiração do patrimonialismo — triunfam sobre a racionalidade humanista. A subjetividade corrompida cerca as outras pessoas, atropela-as e salta sobre limites conaturais à natureza humana.

Soberba. É o aproximadamente o mesmo que orgulho excessivo (desmedido porque infundado segundo a própria natureza das coisas), altivez (pensar-se como um ser mais alto em qualidades e dotes do que outrem), arrogância (atrevimento, petulância, audácia, insolência), presunção (o soberbo pré-toma a si como melhor que “o resto da plebe ignara”), sobrançaria: é o sentir-se e o consentir na concepção de ser o importante senhor, o patriarca, a pessoa proeminente situada (“acima da carne-seca” como diz o vulgo).

Egotismo e soberba. Diz a tradição cristã que a soberba é a geratriz de todos os vícios. A pessoa pensa-se a si como superior, acima dos outros membros da sociedade. A ciência aprofundou o estudo dessa classe de vivência. Temos de dizer hoje que a geratriz mesma de todos os hábitos destrutivos é uma atitude ainda mais geral de avaliação pessoal. Falamos do egocentrismo. O ser egocêntrico, patriarcalista, pensa-se e sente-se como um centro fundamental de importância. Os outros membros da sociedade precisam estar ao seu redor, como que a prestar-lhe atenção e homenagem, decorrentes dos valores pessoais do egocêntrico, valores que seriam a medida das qualidades e prerrogativas humanas.

Espanta observar esta classe de pessoas. Esperam elas de parte de toda a gente a mesma reação admirativa que nutre por si própria. Para curar-se precisam da clássica meditação, que as religiões ensinam há séculos. Nem é o bastante para muitos. É-lhes imprescindível a psicoterapia por isso que o comportamento egocêntrico é fonte de distúrbios de comportamento (e de conflitos). O egocentrismo forja um hábito mais arraigado na vida psíquica que o simples egoísmo; este é mais isolado, superficial e passageiro. O egoísta pode, por vezes, praticar atos de desprendimento. Prende-se, de outro lado, a atos buscados só em seu benefício, que podem estar justificados e ser aceitos pelos membros do círculo social a que pertence. Tal o caso de preferir satisfazer-se a si próprio que aos outros em matéria de saúde, na vitória de um certame, no tempo que vai dedicar-se ao mimo dos seus sentimentos de tristeza etc. [7]

O egocentrismo é bem mais penetrante e alargado. Neste estilo de vida alguém erra permanentemente na avaliação de si mesmo em relação às outras pessoas. O atual patriarcalista gira em torno dos valores que pensa ter. Vive um estilo de comportamento continuado com um hábito inserido mais ao fundo do psiquismo.[8]

Impulsos de maldade. Os meninotes e as mulatas foram vítimas de agressões de pessoas verdadeiramente sadistas durante o patriarcalismo brasileiro clássico. Era essa, assim, a tendência do brasileiro criado na casa-grande dos engenhos. Esses meninos procuravam instintivamente defender-se. Adquiriram o “hábito da faca de ponta”, desde o início da colonização. Essas crianças ou adolescentes eram precoces em participar das preocupações dos adultos, preocupações que se prendiam a eventuais ataques surpresas dos índios e de animais selvagens. Um contraponto perigoso para esse crescimento, na maldade e na preocupação dos adultos, foi o acúmulo de prazeres em geral, mas sobretudo, “os do sexo”. Essa força do instinto não era bem dirigida. Firmava-se na hereditariedade e no ambiente. Terão influído na formação do “caráter nacional” estes arroubos repentinos que psicólogos da metade do século XX já denominavam “reflexo prepotente”, “necessidade viscerogênica”, “hábito dinâmico”, “motivo”, “desejo”, “interesse” (p. 462 e 465).

Acresce a esta modalidade de violência o fator do medo; a criança indígena recebia formação específica à base dele (p. 199). Nas escolas havia o uso do castigo físico. Tal era o caso de ajoelhar-se o aluno desatento sobre grãos de milho, receber palmatória até ficarem vermelhas as mãos, ficar de braços abertos por largo tempo (página 507-508). [9]

3 — Fatos dos nossos dias (1). Até mesmo por algum desconhecido atavismo se pode pensar em explicações a respeito da violência de crianças e adolescentes, entre si e com outrem. Realizou-se pesquisa em São Paulo sobre o assunto no período de 1988 a 1991. Entre outros dados, consta a quantificação de ocorrências policiais praticadas por jovens na cidade de São Paulo. [10] São os jovens infratores situados na faixa etária de 12 a 18 anos incompletos. A amostra compreendeu 3.794 adolescentes infratores. Em média, cada jovem revela a taxa de 1,4 passagens. De notar-se, contudo, que

[...] a criminalidade juvenil violenta é menor do que criminalidade juvenil não-violenta. Só 34,14% se qualificam como infrações violentas. As infrações violentas compreendem: roubo (15,58%), porte de arma (6,90%), agressão (6,82%), tentativa de roubo (2,29%), homicídio/tentativa (1,28%), tráfico de drogas (0,71%), estupro/tentativa (0,59%), latrocínio (0,30%), seqüestro (0,08%). O roubo é a infração de maior peso na composição da criminalidade violenta juvenil. As ações não-violentas compreendem: furto (23,04%), dirigir sem carteira de habilitação (9,38%), tentativa de furto (6,86%), uso de drogas (4,33%), atos sexuais (1,4%), estelionato/tentativa (1,38%), participação em quadrilha (0,19%) e diversos (17,83%). [...]

a criminalidade violenta juvenil é pouco mais baixa do que a criminalidade na população em geral. Entre os jovens representa 34,14% (média no período como um todo). Na população em geral, representa (37,57%). Tudo indica que os padrões de comportamento delinqüente juvenil acompanham padrões na população [...]

[...] no mundo do crime organizado [...] 56,90% das infrações cometidas por jovens. Mas, é igualmente significativo o percentual de jovens (43,01%) que agem sozinhos, [...]

Constatou-se como perfil-padrão de delinqüente juvenil, o jovem branco, do sexo masculino, 15-18 anos incompletos, natural do Estado de São Paulo, com primeiro grau e não ocupado em alguma atividade. [...] é significativamente menor o número de jovens autores de infração penal violenta face ao número de jovens vítimas de assassinatos [...]

Fatos dos nossos dias (2). Reportagem trazida pelo jornal Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano, constam os resultados de duas pesquisas diferentes, havidas por sociólogo da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), como "extremamente preocupantes". Umas passagens são:

[...] A maioria (55%) diz ter visto corpos de pessoas assassinadas nos últimos 12 meses e 30% relatam que já foram vítimas de algum tipo de violência. [...]

[...] Para o menino Saulo (nome fictício), 13, que mora na favela Jardim Filhos da Terra, na zona norte da capital paulista, assistir a assassinatos virou "coisa comum". [...]

[...] 30% dos jovens se encontram na faixa dos que estão em constante contato com a violência - eles freqüentemente são agredidos (muitos pela família), vêem ações violentas (como assassinatos e agressões policiais) ou têm acesso facilitado a armas de fogo, entre outros aspectos. Na capital paulista, 13% dos entrevistados disseram já ter testemunhado um assassinato.

"Quando o jovem está exposto à violência, se ele tiver um problema na aula, depreda a escola. Se não gosta que mexam com a namorada dele, mata. Esse é o repertório dele" [...]

[...] Em SP, crianças brincavam de contar corpos [subtítulo].

Já vi meninas de dez anos oferecendo o corpo por R$ 5 no Acre, já vi meninos de quatro anos trabalhando num garimpo de Rondônia, mas a coisa mais violenta que já vi crianças fazendo ocorreu no Jardim Ângela, no extremo da zona sul. Chamavam de “brincadeira”. Acordavam bem cedo e saíam à procura de cadáveres à beira da represa de Guarapiranga - um menino de 12 anos se dizia o recordista: encontrara três numa manhã. O episódio ocorreu no final dos anos 90, quando São Paulo batia recordes de mortes violentas e o Jardim Ângela era o pior dos mundos. [...]

[...] No Jardim Ângela, também havia traficantes, mas o maior número de mortes era relacionado a vinganças banais ou encomendas de comerciantes contra ladrões. Com a melhora econômica e ação da polícia e de ONGs, a taxa caiu - em 2007, foram 26,6 mortos por 100 mil.[11]

Fatos dos nossos dias (3). Cumpre notar, pensamos, que nos resta ainda parte da herança do trabalho escravo. Precisamente no campo da cana de açúcar, ao modo do velho NE. Também em 2009 a imprensa publica situação de trabalhadores próximos ao trabalho escravo. Leiam-se partes da notícia. [12]

530 empregados em condições degradantes

Em Minas, força-tarefa interdita seis fazendas de multinacional francesa LDC. Trabalhadores não tinham água potável, banheiro e equipamentos de proteção de qualidade; [...]

[...] fazendas de cana-de-açúcar arrendadas pela multinacional francesa LDC (Louis Dreyfus Commodities) em quatro municípios de Minas Gerais.

Dez fazendas foram fiscalizadas por uma força-tarefa de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Ministério Público do Trabalho. Seis foram interditadas, além da usina de açúcar e álcool da companhia em Lagoa da Prata (MG). A LDC também tem usinas em SP, MS, RN e PE, administra no Brasil 340 mil hectares de terra e emprega cerca de 20 mil pessoas.

[...] O Ministério Público do Trabalho apresentou à LDC uma proposta de Termo de Ajustamento de Conduta, com pedido de indenização de R$ 2 milhões por danos coletivos. Foram fiscalizadas fazendas em Lagoa da Prata, Luz, Iguatama e Bambuí. Os trabalhadores em condição irregular não eram diretamente vinculados à LDC, mas a empresas terceirizadas.

O sistema econômico. O interesse de lucro era atendido com a acumulação de muita riqueza e com o capital concretizado na cana-de-açúcar. Neste sistema já se desgarra um forte egocentrismo. Advirta-se que, em matéria de costumes (comida e sexo), a casa-grande era verdadeiro antro de corrupção. O próprio casamento aristocrático levava em conta, na escolha feita pelo pai, do noivo que ia casar-se com a donzelinha, levava em conta, repito, a capacidade procriadora dele. A mescla era contraditória porque os senhores de engenho mantinham o exterior de uma grande religiosidade (p. 290, 389, 530, 559, 520-521)

Pertencer a uma família “importante”. Na história do Brasil houve famílias que perderam o brilho balizado no empréstimo de dinheiro. Muito gasto com lastro impensado esvaziou cofres poderosos. “Pai rico, filho nobre, neto pobre”, uma desgraceira. [13]

Em São Paulo do século XX muito se apreciou a família “quatrocentona”, cujo nome remonta ao Brasil Colônia. Isto é algo que se pode herdar... Herança cultural por vezes destrutiva. A perda de prestígio pode suscitar o fenômeno da compensação psicanalítica negativa, isto é, a que se dá com a busca de remendos artificiais, com falsos expedientes de vanglória (esta uma considerável parte da soberba) para contrabalançar perdas pessoais. Um desses artifícios pode ser a sede de mais dinheiro compensador. Se falharem princípios éticos aprofundados, que só a interioridade é capar de fortalecer, sobrevêm em conseqüência os atos de corrupção.

Um exemplo. Há o caso, talvez emblemático, da família Sarney: arranjos de José Sarney, presidente do Congresso Nacional — empregos públicos para parentes (nepotismo) e mesmo para a namorada de neto. Eis aí é um modo infundado de prevenir a queda social dos descendentes. Ato de corrupção, porém, porque rompe alicerces, colunas e vigas da personalidade, corrói os tecidos da saúde do organismo do indivíduo. Quando se espraia essa cultura, não importa a raça, é como câncer — devasta os elementos de estruturas (religiosos, morais, jurídicas, políticas) constitutivas da dignidade.

Novamente a soberba. O mau hábito da soberba é um desses impulsores, que tanto se via no patriarcalismo do senhor de engenho. Este mesmo complexo de superioridade vem a realizar-se por via de uma necessidade de o prepotente estar sobre outrem. Aparece igualmente na política estatal. Também na política internacional (desde pelo menos Bismark) com o conceito de “Realpolitik”. Leva no seu bojo o sentido degradante de tipos efetivos de relações humanas coercitivas, maquiavélicas, dominadoras — com artimanhas ou com veladas ameaças (quando necessário, com atos práticos prejudiciais).

As raízes da soberba ou orgulho vão fundo e dão frutos podres em grande número. Tais desvios morais escancaram as portas à corrupção, nos três poderes da república e em todos os entes estatais brasileiros — União, Estados-membros, Distrito Federal, Municípios. Os exemplos singularizados (particulares, determinados, “concretos”) são como que inumeráveis.

Um caso sempre a surgir é o das propinas[14] recebidas de empresários corruptores por agentes políticos corruptos.

[...] a Camargo Corrêa pagou cerca de R$ 4 milhões em propina para conseguir vencer duas licitações e para mudar a legislação sobre uma área no município de Caieiras, na Grande São Paulo, no qual a construtora fez um empreendimento imobiliário. [...] No caso dos cinco hospitais, construídos em Belém, Santarém, Breves, Redenção e Altamira, Kahn diz que papéis apontam que a suposta propina foi paga ao PT e ao PMDB. A Folha apurou que o PT aparece nos documentos como beneficiário de R$ 230 mil e o PMDB, de R$ 130 mil.

4 — Raça, cultura, estrutura.

Sobre estes três temas, que Pontes de Miranda não teve tempo de desenvolver no tríptico a realizar-se com “Garra, Mão e Dedo” (dos três foi o único tríptico publicado) e “Alcance, objetivo e fim” — sobre eles, repito —, faremos agora algumas poucas observações.[15]

Raça. O animal bruto tem raça, mas não tem cultura. Vejamos por que. Raça é o conjunto biológico de marcas instintivas derivadas do sangue. O modo e o ritmo de andar, dançar, caçar, correr, compor músicas, escolher cores. Também a propensão maior ou menor pela ação imediata (não programada), pela indolência, pelo trabalho, pelo tipo de união sexual, pelo tipo preferido de atividade mental ou de divertimento ou crenças e mitos. Etc. Houve quem achasse haver raça humana pura...

Cultura indica aquele modo mais constante pelo qual foram adquiridos e aprimorados certos dados de inteligência (com técnicas) e de sensibilidade (com as habilidades correspondentes), tudo ao modo de objeto de exercício de aprendizado, ambos sociais, e do seu acúmulo partilhado entre os membros de certo círculo social, no correr do tempo e nas mudanças espaciais.

A ciência positiva do direito revela um grau elevado de cultura — com ela a inteligência alcança segurança maior na exegese da regra e na interpretação dos fatos em função da realização justiça humana. O orgulhoso prefere a facilidade do método racionalista: patina vaidosamente sobre idéias gerais abstratas (=desvinculadas da responsabilidade perante o real da vida).

Estrutura é o conjunto de linhas organizacionais das relações sociais de um círculo humano, cuja ordem se formou, ou que se deseja venha a ser formada, de modo que a estrutura, como anota Aurélio,

[...] forma um todo coerente, que subjaz à variedade e variabilidade dos fenômenos empíricos, e é tomado como atributo interno da realidade, constituindo, por isso, objeto privilegiado da análise.

Assim, a estrutura é outra à parte realidade, composta de hábitos ou já adquiridos, ou apenas desejados. Os hábitos religiosos indicam uma maneira mais ou menos constante de os indivíduos se relacionarem com o elemento divino (o supra-sensível ou sublime); a linha de hábitos adotados para a convivência diante do critério da dignidade da pessoa traz, no seu conjunto, a estrutura moral do grupo. [16] Assim, analogamente é o hábito formado no gosto pela harmonia das formas (estrutura das artes), ou com as regras jurídicas (elas conferem a garantia extrínseca de ações e omissões dos “outros”) — estrutura jurídica—, ou com o modo em que as forças específicas do poder no grupo formam uma figura típica de pontos, linhas e orientação e dimensão (estrutura política); tal é o caso da relação entre o Povo e Estado nas suas três funções conhecidas a partir, sobretudo, de Montesquieu. Estrutura é, ainda, o todo das normas mais ou menos instintivas pelo qual a busca das utilidades materiais rege propensões e interesses (produção, comercialização e serviços). Tem-se aí a estrutura econômica.

Corrupção há em todas as raças, culturas e estruturas. É fato público e notório que a corrupção grassa mais em certos povos que em outros, segundo a variação de diferentes pedaços de Espaço-Tempo-Energia. Tentam-se dados sobre o assunto.[17] E corrupção há no âmbito público e na vida privada, como no próprio futebol europeu, conforme noticiado em 2009 em jornal de São Paulo sob o título “Europeus escancaram megacaso de corrupção”: [18]

A Uefa já classificou como o maior escândalo da Europa. Um esquema de manipulação de resultados no velho continente põe em dúvida 200 jogos. A polícia já prendeu 17 pessoas por causa do escândalo, que atingiu a badalada Copa dos Campeões e a recém-criada Liga Europa, dois nobres torneios interclubes da Uefa. [...] Este é, sem dúvida, o maior escândalo de resultados arranjados que o futebol europeu já viu. Estamos surpresos com a magnitude disso. E devemos fazer de tudo para assegurar que árbitros, atletas e dirigentes sejam levados à Justiça", disse Peter Limacher, especialista da Uefa para apurar fraudes. Polícias de Alemanha, Reino Unido, Áustria e Suíça trabalharam simultaneamente no caso, que rendeu 15 prisões na Alemanha e duas na Suíça. Mais de 50 propriedades foram investigadas, e 1 milhão ligado ao esquema de corrupção já foi confiscado pelas autoridades. [...]

A operação policial começou meses atrás e contou com a participação de 300 pessoas na Alemanha. A cooperação internacional, que começou pela Inglaterra, ajudou a desvendar o esquema, que fraudou jogos de primeira e segunda divisões em países como Turquia, Bósnia-e-Herzegóvina, Hungria, Croácia, Suíça, Áustria e Eslovênia. Estão sob suspeita 12 jogos da Liga Europa, segundo Ralf Ziegler, da polícia de Bochum. A Copa dos Campeões tem três jogos potencialmente "sujos".

Ora, este é um caso típico da “raça branca e olhos azuis” da culta Europa. Corrupção não escolhe raças. Não há aqui diferença entre elas. O mau hábito tão antigo da sede por dinheiro — a velhíssima avareza — pode destroçar qualquer delas, mostram os fatos. Na Alemanha vige uma boa estrutura jurídica, mas neste caso foi em vão. O vício enraíza-se na ventoinha do egotismo.

Vira-e-mexe já ressurge a azafamada raiz, a vetusta gangorra, o oscilante pêndulo do “pecado original” — ego-alter. O indivíduo prefere-se à coletividade (aos outros, ao Alter) cedendo aos impulsos do Id porque o Superego ficou raquítico de tanto ceder à “lei do prazer” que o Id impõe com a sua instigação dominadora. O Ego já não tem o comando da pessoa. Está corrompido a fundo. Não é senhor e sim servo da avareza.[19] Prossigamos.

Avareza. Equivale aos conceitos de desnorteado apego ao dinheiro, esganação ou acumulação de ganhos materiais, sofreguidão por mais e mais poder de compra, dependência psicanalítica da necessidade de riquezas materiais. Daí a falta de generosidade, a mesquinhez, a maldade, a prática freqüente dos atos da corrupção em sentido estrito — tomar o dinheiro do Povo, retirá-lo dos cofres estatais para si, para parentes e parceiros.

Algumas conseqüências. A mulher brasileira e o homem brasileiro provêm em sua maioria de raças diferentes. Podem fundir-se numa só cultura, com variações toleráveis e mesmo desejadas por todos porque enriquecem as mentes da pessoa. As estruturas sociais hão de ser adequadas à consecução da ordem pacificadora e da paz criadora. Exemplo típico é o “direito justo” — porque o nosso sistema jurídico tem de atender a todas as violações dos "direitos humanos", prevenindo e corrigindo deficiências. A corrupção vai contra a democracia, as liberdades e a igualdade crescente. A corrupção corre em sentido contrário à paz do país; diminui a esperança de progresso do povo, da nossa gente. A tarefa urge. A nossa herança cultural de muita corrupção é longa. É bem característico do patriarcalismo herdado do Brasil Colônia o costume de ferretear de “comunista” ou “socialista marxista” a quem trabalha no prol do crescimento em igualdade social incessante, para serem fortes e prestantes todos os brasileiros. Justiça social. Passa-se o mesmo com a busca de mais e mais vantagens e mantença de privilégios, ativadas por agente público de todos os três Poderes.

Algo sobre juízes e membros do Ministério Público do Brasil. Quem já pertenceu a estas duas instituições conhece o quanto há de carências éticas nelas por causa do histórico mandonismo patriarcal. Em outros povos de regra não é tanto assim.

Férias e 13º salário. Em nenhum país há férias para gozo individual no total de 60 dias ao ano. Na Alemanha consta uma diferença: os magistrados têm os 30 dias para descanso pessoal e mais 30 dias para estudo, cursos obrigatórios etc. Em geral, pois, as férias pessoais são como as dos demais servidores públicos na grande maioria dos países. [20] Nos demais povos não se paga o 13º salário a juízes.

Autoritarismo. Vamos agora a casos de autoritarismo ocorridos com alguma freqüência, não com todos, verdade seja, mas com bastantes. Esse autoritarismo é uma modalidade de patriarcalismo porque, como antes, vinga a fraqueza da soberba.

(1) Há os que se sentem “diferenciados”; não seriam iguais aos outros seres humanos. Teriam preferência numa fila de espera — são mais que os comuns dos mortais (porque têm a “caneta”...). (2) Não aceitam a qualificação de “servidor público”, ou de “funcionário público”. No máximo “agente público”. Isto apesar de o seu poder provir do Povo, e de servirem ao Povo, pagos pelo Povo para exercerem as suas funções públicas. (3) Incomoda a muitos deles conversar no fórum com os funcionários mais simples: são “autoridade” e não uma gente menor, como esses meros auxiliares... (4) Enquanto possível for, guardam distância dos advogados — são mais que meros advogados, nas audiências e fora delas... (5) Repelem os dados colhidos pela FGV: os juízes (e promotores) figuram entre as profissões mais bem pagas do país. Contestam a pesquisa dizendo ser a sua vida muito sacrificada, esquecendo-se de que na vida empresarial estão os profissionais sujeitos a fortes pressões psicológicas (até lhes causam doenças crônicas), não contam com férias de 60 dias ao ano, carecem de qualquer das três garantias desfrutadas pelos magistrados e membros do Ministério Público, falta-lhes o direito à aposentadoria integral, não existe nas carreiras públicas mencionadas a concorrência por cargos (com descarte do perdedor, como por vezes na empresa privada acontece). (7) Esquecem-se estes agentes públicos de que, sim, cumpre trabalhar para a carreira ser atraente também do ponto de vista financeiro (e sempre com os devidos cuidados para não se fazer dela uma empresa), sem que se admita, contudo, possa ser este o pensamento dominante — todo servidor público (não importa o cargo) é um dos agentes do Povo (de quem deriva todo o poder). (8) Não é admissível esperar dessas carreiras um posto de ganhadores de muito dinheiro, pago por um Povo em grande parte pobre.[21] (9) Uma boa parte desses agentes públicos folga em achincalhar quem os critica (mesmo quando seja para o bem das suas próprias instituições jurídicas) — os críticos seriam maus brasileiros, inimigos da magistratura ou do Ministério Público. (10) Há os que ferreteiam esses críticos com o sinete de “comunista”, seja ele de dentro ou de fora dessas mesmas instituições...[22]

Vaidade, próxima ao cerne de vício destrutivo da personalidade (soberba). A vaidade, dissemos é uma das formas assumidas pela soberba. Esta é a própria matriz dos outros vícios todos. O assunto foi largamente desenvolvido por Santo Tomás de Aquino ao modo seguinte, segundo o autor ora citado (sem as suas notas de rodapé e advertindo-se que em lugar de “pecado”, idéia religiosa, haverá de ler-se “vício”, conceito mais apropriado à Moral).[23]

A doutrina dos vícios capitais é fruto de um empenho de organizar a experiência antropológica cujas origens remontam a João Cassiano e Gregório Magno, que têm em comum precisamente esse voltar-se para a realidade concreta. Ambos tratam de fazer uma tomografia da alma humana e, no que diz respeito aos vícios, surge a doutrina dos [...] capitais, que encontra sua máxima profundidade e sua forma acabada no tratamento que lhe dá Tomás. Essa doutrina - que, como tantas outras descobertas antropológicas dos antigos, está hoje esquecida - bem poderia ajudar ao homem contemporâneo em sua desorientação moral e antropológica. [...] a soberba é considerada por Tomás como um pecado [vício], por assim dizer, "mega-capital", fora da série e, portanto, prefere falar em vaidade (inanis gloria, vanglória). [...] Comecemos por indicar o que significa vício capital. Santo Tomás ensina que recebem este nome por derivar-se de caput: cabeça, líder, chefe (em italiano ainda hoje há a derivação: capo, capo-Máfia); sete poderosos chefões que comandam outros vícios subordinados. [...] Nesse sentido, os vícios capitais são sete vícios especiais, que gozam de uma especial "liderança". O vício (e o vício capital compromete muitos aspectos da conduta) é uma restrição à autêntica liberdade e um condicionamento para agir mal. [...] [...] Como dizíamos, Santo Tomás situa a soberba fora e acima da lista dos vícios capitais. [...], Tomás lembra que, se a busca da própria excelência é um bem, a desordem, a distorção dessa busca é a soberba que, assim, se encontra em qualquer outro [...]

O juiz (é apenas um exemplo), por exercer certas funções de mando sobre o público, e ser chamado de “Vossa Excelência”, tem de cuidar por não perder a simplicidade de um ser humano como outro qualquer, sem o devaneio fantasioso de sentir-se um ente à parte do seu Povo. Esta situação é própria de perda lamentável. O próprio Poder Judiciário sofre as conseqüências ruins de algumas bobagens cometidas a torto e a direito por um bom número magistrados nesta matéria ridícula. Provém de uma ministra mineira, do Supremo Tribunal Federal, nascida em Montes Claros, 1954, uma admoestação, encontrável na revista brasileira Época [24], com uma rápida notícia sobre a opinião dessa ministra, Carmen Lúcia. Para ela a permanência no cargo de ministro (ministra) deveria ser só por determinado número de anos, e não até à aposentadoria compulsória (com 70 anos). Em tom de blague, mas falando com seriedade, diz ela que é só chegar ao Poder Judiciário e

A pessoa passa a ser chamada de "Excelência" de todos os dias. Daqui a pouco começa a acreditar que é mesmo.

Vaidade em cargo público é um estado de corrupção. Instemos. A corrupção é corriqueiramente entendida como o ato de alguém se apoderar de bem público, “privatizando-o”, engolindo-o com o seu patrimônio de corrupção. Bem além, porém, deita ela as suas raízes: é um vício aferrado na personalidade, um hábito da pessoa enfraquecida na capacidade de se portar com base nos valores naturais de reverência à dignidade, de apreço irrestrito às potencialidades existenciais pelas quais somos efetivamente superiores ao animal bruto. Somos mais altos (superiores) que o bruto. Somos mais nobres que a só animalidade pelo potencial inato de (1) raciocinarmos e (2) de doarmo-nos generosamente. Eis aí os dois elementos definidores da dignidade; denotam o animal humano como diverso do simples animal bruto, que lhe queda em nível inferior. Está correto, pois, dizer que o homem se degrada quando baixa ao nível da animalidade (a dos brutos).

À nossa dignidade, á dignidade do ser humano, sobrevêm os consectários dela. Derivam eles dos dons naturais próprios do ser humano. Surge então o antípoda dos vícios — são as virtudes, isto é, os hábitos bons, os comportamentos aprovados pelas maiorias dos círculos sociais humanos mais influentes no nosso momento histórico.

Os principais vícios a pesarem sobre nós, mostra uma longa tradição que são sete. São chamados de vícios capitais por serem a origem, a cabeça (caput, capital) de todos os outros maus hábitos humanos. Com qualquer deles começa a decadência moral da pessoa. Exemplo: a corrupção, o desdém pelo próximo, o apego desordenado ao dinheiro, a sede descontrolada de prazeres, o menosprezo pelo Povo. [25]

O vício da gula. Registram-se alguns sinônimos como glutonaria ou glutonia, em que o étimo glu indica “garganta”, “esôfago”, por aí passam comida e bebida.[26] Consiste na fraqueza da voracidade pelo que sabe a gostoso no corpo em certo momento (doces, iguarias, sabores exóticos, álcool), devorado em grandes quantidades, empanturrando-se a pessoa, ainda que saia desfavorecida a saúde corporal e psíquica.

Conta Gilberto Freyre, sobre o tempo de Brasil colônia e império que, perante o gosto pelos excessos dos condimentos da comida africana, havia os ricos que até morriam por falta de controle da gula, além de padecerem de infecções intestinais, perturbações do fígado, artritismo, derrames, síncopes.

Com esta fraqueza o ser humano tem obstáculos para doar-se, e dificuldade de eventualmente sacrificar interesses próprios: a sua interioridade está rompida, rota, dissolvida. A tendência a corromper-se socialmente é fácil de realizar-se, prejudicando a sociedade — “a ocasião faz o ladrão”. Há mais, porém. A gula pode levar o comilão a gastar o dinheiro público para lhe satisfazer o esôfago. Sabe-se que o uso do cartão corporativo em Brasília é restrito a pequenos gastos, como para pagamento de serviços de manutenção e material de escritório. Consta, porém, em dados da Assembléia Legislativa da BA que o jornal paulista Folha de São Paulo [27]

[...] analisou os extratos dos cartões de Matilde Ribeiro, Altemir e Orlando, os três funcionários do primeiro escalão do governo que mais gastaram com cartão no último ano - respectivamente R$ 171,5 mil, R$ 22,6 mil e R$ 20,1 mil. A análise se refere exclusivamente a gastos com restaurantes. Os três ministros, juntos, pagaram despesas no ano passado em 158 restaurantes, lanchonetes, bares ou choperias. Figuram como estabelecimentos preferidos churrascarias, restaurantes de comidas árabes e italianas, além de choperias. [...]

Das 26 despesas de Silva com restaurantes, há muitas com churrascarias. Como mostrou a Folha, ele gastou R$ 468,05 em um restaurante nos Jardins quando não tinha evento na agenda. [...]

Gregolin vai com freqüência a restaurantes italianos, principalmente em Santa Catarina, seu Estado natal. Em Chapecó, sua base política, estão registrados dez pagamentos. [...] Nos extratos de Gregolin constam três despesas no Carnaval de 2007, que somam R$ 222,85, em restaurantes do Rio, todas na Quarta-Feira de Cinzas. Uma delas no Porcão, tradicional reduto VIP do Rio. [...] Matilde também gastou no Carnaval: R$ 83,60 no Rio, e R$ 120,78 em Salvador. Os gastos são do mesmo dia: 21 de fevereiro, Quarta-Feira de Cinzas.

Divulgou-se também a notícia de ter sido semelhante a glutonaria de ministros do governo federal. A ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro (assistente social nascida em Flórida Paulista, 29.07.1960), além de haver gasto 118 mil reais com aluguel de veículos, usando o cartão corporativo, despendeu com comida quantias elevadas.

No dia 21 de junho, por exemplo, há uma despesa de R$322,74 na Miski Rotisserie, restaurante de comida árabe no Jardim Paulista, em São Paulo. O lugar foi freqüentado por ela sete vezes em 2007.

Acresce o caso noticiado de mais dois ministros a realizarem gastos com comida à custa do dinheiro público [28]: Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) e Orlando Silva (Esporte).

No dia 19 de abril, Cassel pagou R$81,30 numa lanchonete fast food no Aeroporto de Salvador, onde o lanche completo custa em média R$13. O ministro gastou R$3.132 em 2007. Os gastos de Orlando Silva (total de R$20.112) também chamam a atenção. No dia 25 de setembro, há o registro de pagamento de uma conta de R$468 no restaurante Betencas, na Bela Cintra, em São Paulo. No mesmo bairro, no dia 22 de outubro, foi pago (sic) R$198,22 na Churrascaria Boi Preto. O rodízio custa entre R$35 e R$60.

Junta-se aí sem pejo a gula anárquica à avareza criminosa (Código Penal, artigos 312, 315, 359-D, e quiçá outros mais). Já dizia o vulgo de outrora que os vícios soem andar juntos. É enfraquecimento da pessoa, corrupção nas suas bases. Mantendo elas o poder, repete-se o patrimonialismo histórico do Brasil.

Ira ou cólera. Revela-se esta fraqueza da pessoa em hábitos como a grande impaciência, a indignação raivosa, o rancor, a aversão profunda contra alguém, geralmente com repentes incontrolados de surto incontido. É o mesmo que irritação furiosa ou agitação violenta. A ira provoca palavras desabridas e intempestivas. Chega a gritarias com ofensas e mágoas ao próximo. O indivíduo habitualmente acometido dessa classe de indignação injusta está debilitado no seu interior; falta-lhe o poder de reflexão, próprio do ser humano. O descontrole causa no irado o sentimento de desprezo, mesmo que se lhe tenha medo. O mau humor, se não for bem tratado, pode provocar explosões freqüentes de ira. Tal ocorria no regime patriarcal que durante séculos vigeu na história brasileira. Vejam-se uns poucos exemplos. A mulher era muita vez tomada de rivalidade e ciúme da escrava bonita (p. 445). O “caminho mais curto” na educação, com castigos e inflicção de medo às crianças (p. 446). Havia as que se vingavam dos maridos por terem mantido relação sexual com a mulata bonita — mandavam matá-la, espedaçá-la e colocar os olhos dela a boiar sobre o sangue da própria, em compota especial colocada sobre a mesa de refeição, diante dele. Ou o rancor sexual com atos ira tão graves contra a escrava como o cortar-lhe os seios, arrancar-lhe as unhas, queima do rosto e das orelhas, arrancamento dos dentes a golpes de salto de botina (p. 420-421).

Estas são fraquezas de caráter comprometedoras da personalidade toda da mulher irada. Corrompem as vidas das pessoas fáceis, dóceis às suas paixões egocêntricas.

Inveja. Esta fraqueza habitual é outro “vício capital”. Há outros termos que se lhe assemelham — cobiça, ciúme, avidez de algum bem alheio. O viciado pela inveja deseja para si, tocado pelo egocentrismo, algo que outrem adquiriu, ou alcançou, sobre que teve vitória pessoal ou grupal. Não o tendo conseguido, então o invejoso diminui o mérito do vencedor, esconde, mente, magoa-se por estar em estado de inferioridade. Padece da fraqueza pela qual sente pesar, desgosto, mágoa por algum feito alcançado por outrem. Pode dar-se por status, dinheiro, atributos pessoais, reconhecimento público. Essa fraqueza habitual estremece o psiquismo, acende o complexo de inferioridade, causa tristeza latente, nutre inconformismo com a própria sorte. Quadro desta natureza, se viger em servidores públicos, empesteia o serviço que pelo direito tem ser prestado ao Povo em boa qualidade. [29]

Nos tempos do patriarcalismo colonial e imperial, muitos casos havia de ostentação e de disputa por admiração das outras pessoas, notadamente, claro está, das “pessoas gradas”, por outras palavras, das “elites”. Estas são a casta dos nascidos de “estirpe aristocrática”, de “sangue nobre”, de “gente bem” — gente formada de alguns ora um tanto ricos, ora muito endinheirados — “sempre diferenciados”, isto é, merecedores de regalias e privilégios etc. Uns poucos exemplos brasileiros patriarcais podem aduzir-se. Pululavam os casos dos que mal tinham o que comer, mas passavam por ricos com ostentação de vestes e de criadagem escrava (de até quatro pessoas a seu redor para servir); brilho no vestuário; casarões enormes com mobília barata; muita dívida acumulada e, moralmente mais gravoso, tudo à custa dos escravos da Guiné e de mouros cativos etc. (p. 318-319).

Estes estados de espírito invejoso e falsamente competitivo podem suscitar necessidade, dificilmente controlável no mundo emocional, de compensações endopsíquicas negativas (artificiais). Uma delas pode ser a consecução por vias transversas de vantagens, retiradas do alheio (também do Estado) — ato ilícito em vários tipos penais, todos de corrupção.

Preguiça. Também é chamada de letargia, inércia, desinteresse, apatia, torpor, desalento para esforços. A vontade de trabalhar descamba para o grau zero, sobretudo se for necessário denodo no prol de outrem. Com isso o egotismo faz surgirem adiamentos no cumprimento de deveres, esquecimento deles, tédio pela vida, imobilização geral diante de situações árduas. Aduz Rosemeire Zago, psicóloga [30] que a preguiça pode também ser indicativo de falta de confiança em si mesmo. Como os demais vícios, chamados de capitais pela tradição, leva consigo o traço comum — de uma

[...] busca da satisfação no mundo externo, onde se procura compensar a falta de amor-próprio e a necessidade profunda e inconsciente de fugir dos próprios sentimentos.

Acrescenta a autora que também a preguiça gera conflito nas relações humanas. Para vencê-la há “[...] a necessidade de um esforço consciente e racional de mudança”.

A mulher ou o homem com algum acesso a bens de outrem (como os do Estado) pode buscar compensação no ganho fácil (“satisfação no mundo externo”), mediante o pago por omissões no serviço (corrupção). Logo se vê o papel que a reeducação pública deve desempenhar para se alterarem os rumos da ética com o critério da dignidade da pessoa, a substituir a procura por as exterioridades, de que se nutrem os maus hábitos.

Na publicação do “Correio Braziliense” de 29.11.2009 consta a seguinte chamada: [31]

Envolvidos no escândalo dos sanguessugas até agora não foram punidos Com a demora nos processos, eles têm chance de se candidatar em 2010.

É “quase um quinto dos deputados e centenas de prefeitos em todo o Brasil”, a que se somam “livres e impunes funcionários públicos e empresários”. Trata-se de grupo havido como criminoso “segundo investigações da Polícia Federal e do Ministério Público”. Este ilícito teria sido cometido “em 20 estados”, num movimento de “cerca de R$ 100 milhões desde 1998”.

Essa delonga no andamento do processo, de que se queixa o Ministério Público, tem um forte contingente de moleza, aversão ao trabalho, negligência, indolência, mandriice (termos encontradiços no Aurélio). O serviço público pede celeridade, mormente em crimes dessa natureza, a que está especialmente atento o brasileiro aberto ao interesse social. O mandrião e ocioso foi bem definido com fatos patrimonialismo clássico. Havia o senhor de engenho a dispor duas mulatas de cada lado para lhe acertarem o charuto na boca. E o que até mantinha relações sexuais na rede levada pelos negros. Como assinalado acima, a moleza do patriarca de outrora era tanta que parte dos senhores nem quase nem sequer já conseguia andar; eram constante e docemente levados nas redes macias de aristocrata da casa-grande.

Essa preguiçosa moleza não se coaduna com a diligência e operosidade exigida pelo serviço público. Constitui-se em mais uma raiz de corrupção. A languidez corrói as forças interiores da pessoa. Uma das conseqüências será a procura do caminho mais fácil, do dinheiro obtido sem honestidade, de modo tal que se possa “vencer na vida sem fazer força”.

Herança de vícios. A longa lista de maus hábitos na vida brasileira transformou-se em herança de má categoria na nossa história. As elites, os aristocratas ou nobres, tinham-se por superiores aos seres humanos das classes mais baixas (soberba). Eis o confessado por um deles, membro nato da “nobreza da terra”, apegada a prerrogativas de toda ordem, em 1817, a um tribunal da Baía, aludindo ao sistema político de então:[32]

[...] sistema que, derrubando-me da ordem da nobreza a que pertencia, me punha a par da canalha e ralé de todas as cores e me [...]

5 — Novo surto educacional. Mostra a velha pedagogia que um mau hábito (vício) pode ser substituído por um hábito bom (virtude). Nem parece estar fora de moda esta proposição. De modo que o povo brasileiro pode reeducar-se. Tarefa fácil não é. Sendo, porém, coisa possível, compensa o esforço longo, transmitido de governo a governo, de geração a geração. Não há negar que esse intento pode ser poderosamente ajudado pela estrutura jurídica. Um dos pontos dela é que a aplicação do sistema jurídico já alcançado, bom em grande parte, seja cientificamente entendida e efetivamente aplicada.

Existem igualmente as bases do bom jeito de ser do brasileiro, que parece cultural também. Alega a historiadora Beatriz Muniz Freire que “podemos repensar a história de nossa formação”:

[...] O povo brasileiro, além de multiétnico, é pluricultural, desde os primeiros tempos. Não havia, como não há atualmente, uma única cultura branca, outra negra e outra indígena. Brancos, negros e índios diferiam uns dos outros, e cada um desses grupos tinha suas diferenças internas. [...] A história que nos contam sobre nossa formação, apelidada pelo antropólogo Roberto Da Matta de ‘fábula das três raças’, procura apagar essas e outras diferenças, reduzindo-as a um punhado de “contribuições de cada raça”, das quais se teriam originado as “qualidades do povo brasileiro”. Uma fábula cor-de-rosa que foi incluída nos currículos escolares nos anos 60 e 70, período em que sucessivos governos se esforçaram por difundir a imagem de um Brasil integrado, coeso, cujo povo se constituiria numa unidade harmoniosa. Na realidade, contudo, multiplicavam-se os conflitos resultantes da ocupação do interior do país, das diferenças políticas, ideológicas, culturais e sociais que sempre caracterizaram o povo brasileiro. [...]

Podemos repensar a história de nossa formação, reconhecer as diferenças culturais e sociais e relacioná-las às situações que vivemos e observamos hoje em nosso país.

Em quem confiar. Há um estudo de Ricardo Voltolini[33] sobre o Índice de Confiança Social que, diz ele, [...] reforça algumas impressões já consagradas pelo senso comum e inspira, por tabela, outras muitas reflexões interessantes [...]. [34]

A família é para o brasileiro a instituição mais confiável (90 pontos). [...] Em seguida vêm os bombeiros (88), as igrejas (76) e as Forças Armadas (71), por serem provedoras de segurança física e as religiosas pelo conforto espiritual trazido. Curioso, acrescenta, é o fato de a mídia figurar entre as cinco instituições dignas de maior confiança popular, com 71 pontos.

O estudo do Ibope Inteligência não deixa dúvida: os brasileiros confiam mais nos jornais, TVs, revistas e rádios do que nos seus amigos (67), vizinhos (59) e nos brasileiros em geral (59). Muito mais do que nos partidos políticos (31), no Congresso Nacional (35), nos sindicatos (46) e no sistema público de saúde (49).

Nota-se também que os jovens (18-24 anos) são os que menos confiam na Polícia (49), nos vizinhos (51) e nas escolas públicas (62). Ou seja,

[...] os que têm acima de 70 anos estão entre os que menos confiam na Justiça. Quando os jovens, donos do futuro, descrêem na instituição que pode ajudá-los em seu próprio desenvolvimento, e os idosos, detentores do passado, acreditam pouco na instituição que deveria assegurar o exercício dos direitos, talvez seja a hora de pensar no tipo de projeto de país que desejamos construir. E nos valores que vão lhe servir de base de sustentação. [...]

Diz o autor, com base na estatística, ser indispensável mudança radical de

[...] ações, comportamentos e, principalmente, valores na direção de cumprir bem o papel esperado pela sociedade. A nossa crise é essencialmente de valores. [...]

6 — Novos valores a encontrar, ou reencontrar. Como dito, é vem-nos da alargada tradição ascética do ocidente que o costume mau é substituível pelo bom hábito. Cabe, pois, indagar quais são os contrários dos vícios capitais. A mesma tradição responde com as forças interiores das pessoas, notadamente aquelas em volta das quais giram as outras qualidades construtivas dos seres humanos. Há quatro virtudes cardeais que inspiram o surgimento das ou­tras virtudes, isto é, quatro forças humanas fundantes da prática geral da dignidade do homem. “Cardeal” vem-nos de cardo-cardinis, gonzo ou dobradiça em Latim. Portanto uma virtude cardeal é algo assim como um pólo sobre que giram outras forças morais, atraídas por ela. [35]

Virtude, segundo Aristóteles, é uma disposição adquirida de fazer o bem, sendo certo que essas forças se aperfeiçoam com o hábito (hábito=repetição de atos condizentes com a matéria delas). [36]

Segundo vetusta doutrina católica, as virtudes

"são perfeições habituais e estáveis da inteligência e da vontade humanas, que regulam os nossos actos, ordenam as nossas paixões e guiam a nossa conduta segundo a razão e a fé”.

Diz a mesma secular tradição serem quatro as virtudes cardeais. Temperança, prudência, fortaleza e justiça. [37]

a) A prudência, do latim prudentia, a saber, previsão, sagacidade. Freqüentemente é associada aos conceitos de sabedoria, para a qual se requer alguma introspecção, e ainda com o próprio conhecimento. Está nela a capacidade de julgar entre ações piores e melhores, tanto em geral como relativamente a certo pedaço individualizado de espaço-tempo-energia. Muito se ocupa do conhecimento, de modo que é indispensável à atividade científica. Quer isto dizer que a ética toda há de vir regulada por ela. Indica regra e medida, cautela humilde e exatidão máxima na tomada de decisões, e no agir prático.

b) A fortaleza assegura a firmeza da pessoa nas dificuldades e em toda a situação árdua onde se necessita de vitória sobre si mesmo. É, pois, a constância na procura do bem, o hábito de atribuir efetivamente a cada qual (pessoa ou círculo social) o que hic et nunc a natureza exige. Isto em diferentes três níveis de convivência: (a) democracia (participação no poder), (b) liberdade (ausência de obstáculos de ordem física e psíquica), (c) crescimento em igualdade (todos terem meios de subsistência, trabalho, educação, assistência e ideal ou sonho). [38]

Tal força interior nada tem de fácil. Resulta geralmente do esforço contra o egocentrismo. Cuida-se de uma luta proveniente da secular Psychomachia,[39] como a descreveu o escritor latino, cristão, Prudêncio (348- c. 410), onde se apresentam as lutas alegóricas entre as virtudes e os vícios.

c) A temperança (ou moderação), σωφροσύνη, sophrosyne, temperantia — é uma dessas virtudes universais. Significa a força de a pessoa se equilibrar, alude à competência moral de a pessoa manter o comando sobre as reações instintivas. Coloca limites, modera a forte atração dos prazeres, assegura o domínio da vontade sobre as ações e reações mecânicas do corpo, e proporciona o equilíbrio no uso dos bens. Serve para controlar a gula e a luxúria. Dizem alguns ser ela a prudência em relação aos prazeres do corpo.

d) A justiça é a virtude pela qual, segundo Aristóteles e Tomás de Aquino, subsiste uma vontade constante e firme — a de dar aos outros o que lhes é devido. Vai além do direito subjetivo (atribuição de um bem de vida segundo as regras jurídicas vigentes). Abrange a ética, posta acima de eventual norma jurídica contrária à dignidade do ser humano. Indica (dicere, dizer, δικη) a medida do equilíbrio entre vantagens e desvantagens das coisas entre seres humanos.[40]

As sanções morais. Virtude-vício, moralidade-imoralidade, força bela e chilique bobo, tudo isto aparece como figuras contrapostas. Recebem elas, nos círculos sociais, diferentes sinais — de reprovação ou de aprovação. São as sanções: a) penais (reprovação, isolamento, desconfiança, desconsideração, desestima); b) premiais (aceitação, confiabilidade, estima, respeito, amizade). Quando já deixam de existir as sanções, a crise moral é grave. Quando nem sequer o direito é aplicado como freio, então já a sociedade, o Povo, terá descido ao fundo do poço.

7 — Algumas outras lições da história pátria. Essas quedas que causam vertigem, vimo-las resumidamente acima com algo da história do Brasil na dicotomia “Casa Grande & Senzala”. Acrescem as valiosas análises de dois sociólogos brasileiros de proa: Sérgio Buarque de Holanda[41] e Raymundo Faoro.[42] Colheremos uma pouca dessas pedras preciosas brasileiras.

Entraves à cultura. O primeiro, Sérgio Buarque de Holanda, diz que os portugueses criaram entraves à cultura intelectual; temiam a circulação de idéias novas porque poderiam pôr em risco a estabilidade do domínio lusitano (p.121).

Mineração e lavoura. A atividade na mineração e na lavoura era perdulária. O português se aproveitava do braço escravo e da terra farta. Era pouco afeito aos trabalhos custosos porque o seu espírito era mais aventureiro que de realização econômica pelo trabalho organizado (Sérgio Buarque de Holanda, p. 49).

Individualismo lasso. A formação do caráter brasileiro deu-se em clima de individualismo, avesso ao trabalho monótono e moroso. A disciplina exigente era pouco estimada. Firma-se um impressionismo com palavras elegantes e bonitos argumentos. A contradição não lhe parece estranha mesmo entre pessoas de talento. Existia a tendência a alcançar altos postos e rendosos cargos sem seguir caminho normal para isso; se possível ocupar meia dúzia de cargos ao mesmo tempo. Muito diploma acadêmico não servir à vida prática e as profissões liberais são as mais respeitadas, notadamente a dos bacharéis em direito. Muitos eram os estudantes formados em Coimbra, aonde foram com o fim de obter emprego, mas formados sem nunca terem estado em Coimbra. Imperava o individualismo, estimava-se o título de doutor. Preferiam-se as leis genéricas: servem para circunscrever uma realidade complexa dentro do âmbito das veleidades pessoais. A frase lapidar gozava de prestígio por se tornar inflexível. Tem-se a impressão de a conquista do conhecimento poder ser alcançada sem trabalho mental “aturado e fatigante”. O positivismo de Comte encontrou aí solo fértil com as suas certezas fáceis. O compadrio era o que de regra inspirava decisões. Os movimentos sociais eram muito mais impulsionados pelo sentimento que pela análise racional prévia (Sérgio Buarque de Holanda, p.155-161).

O brasileiro, homem cordial. A expressão “o homem cordial”, atribuída ao brasileiro significa leveza no trato, hospitalidade e generosidade. Terá sido resultado de uma influência ancestral. Essa cordialidade não é o mesmo que “civilidade” ou “boas maneiras”. Jorra ela de um “fundo emotivo extremamente rico e transbordante”. Não gosta, por exemplo, do ritualismo próprio do povo japonês. Não é o que poderia se chamar de polidez; esta sempre leva algo de disfarce no seu bojo. Ao contrário da cordialidade brasileira, a mera polidez revela “um decisivo triunfo do espírito sobre a vida”. O homem cordial é expansivo e de pouco interesse pela vida em sociedade. O que mais importa é “um viver nos outros”. Admitem-se as fórmulas de reverência, contanto que não suprimam um convívio de tom familiar, de intimidade mais sincera. Já o português é mais ligado aos títulos e aos sinais de reverência (p.146-148).

Envelhecimento da lavoura, um dos pontos iniciais da burocracia. O aumento dos centros urbanos coincidiu em grande parte com o declínio da velha lavoura. Os senhores rurais começaram a perder posições de privilégio. Entre as outras ocupações sobrevém agora a organização das coisas da cidade, necessária. Esta é uma das causas de impulso inicial à burocracia.

Evolução econômica. A evolução econômica do Brasil, em grandes linhas se deu desde o velho engenho, dilapidado pela usina moderna, a queda do sistema agrário substituída pelos estabelecimentos industriais urbanos. A complexidade da situação brasileira está em que o pensamento monárquico não nos largou de todo; tenta armar artifícios para se manter. Com isso o conjunto de postos estatais apresenta certa tendência despótica, contrária à “doçura de nosso gênio”. O Estado está sempre necessitado, isto sim, de compostura e solicitude. Sem isso não cobra respeitabilidade que a gente ibérica sempre houve como a “virtude suprema entre todas” (Sérgio Buarque de Holanda, p.176).

Um poder indevido e inversão de poderes. Durante muito tempo a Igreja Católica foi nada mais nada menos que braço do poder secular, um instrumento do reino. O poder civil propunha candidatos ao bispado e nomeava os bispos, cuja ratificação, sim, era pontifícia. O Estado cobrava dízimos em benefício do culto católico, de modo que a Igreja muitas vezes era uma fiel cúmplice do poder estatal. [43]

O livro de Raymundo Faoro (1925-2003) foi editado pela primeira vez em 1958. A edição de 2001 consta de 898 páginas de texto e notas de rodapé. O autor foi advogado, cientista político e historiador, membro da A. B. L. a partir de setembro de 2002 e presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de 1977 a 1979.

Ficaremos aqui com apenas algumas gotas do seu extenso cabedal. Antes um apanhado da sua obra sobre a formação histórico-social brasileira.

[...] aponta o período colonial brasileiro como a origem da corrupção e burocracia no país, colonizado por Portugal, então um Estado absolutista. De acordo com o autor, toda a estrutura patrimonialista foi trazida para cá. No entanto, enquanto isso foi superado em outros países, acabou sendo mantido no Brasil, tornando-se a estrutura de nossa economia política.

Nesta sua concepção de Estado patrimonialista, Faoro coloca a propriedade individual como sendo concedida pelo Estado, caracterizando uma "sobrepropriedade" da coroa sobre seus súditos e também este Estado sendo regido por um soberano e seus funcionários. O autor assim nega a existência de um regime propriamente feudal nas origens do Estado brasileiro. O que caracteriza o regime feudal é a existência da vassalagem intermediando soberano e súditos e não de funcionários do estado, como pretende Faoro.

Desenvolvendo seu raciocínio, Faoro conclui que o que se teve no Brasil foi um capitalismo politicamente orientado, conceito este de inspiração weberiana. Negando-se em atribuir um papel hipostasiado à economia com relação à política, Faoro vê em seu país uma forma pré-capitalista. Esta característica pré-capitalista, no entanto, ainda será entendida no interior do pensamento weberiano em que capitalismo é definido como uma aquisição racional de lucros burocraticamente organizada, diferente do capitalismo politicamente orientado em que tal aquisição será direcionada por interesses dos Estado e da sua concorrência com outros estados. Destacando-se da análise da dialética marxista, esta forma de capitalismo não irá inevitavelmente desembocar numa forma de capitalismo mais avançado, mas poderá perpetrar-se na medida em que coexiste com formas racionais de organização da produção.

O capitalismo politicamente orientado atribui ao Estado patrimonial e seus funcionários características de um estamento burocrático, ainda que este impeça a consolidação de uma ordem burguesa propriamente dita no país. [44]

Estamento. É um círculo social informal, inconscientemente aberto a gente de qualquer classe social, cuja finalidade é acercar-se dos centros de poder — para exercê-lo, ou para influenciar nele o máximo possível. O termo alemão é “Ständenordnung”: ordenação (homogênea) dos status sociais (estratificados) e parece ter sido usado por Max Weber em sentido mais amplo que o ora delineado.

[...] não propriamente um corpo homogêneo estratificado, mas sim uma certa teia de relacionamentos que constitui um determinado poder e influi em determinado campo de atividade. [...]

Exemplos de grupos estamentais. São-no a burocracia palaciana dos governos, interessada em influir no poder político; os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público enquanto interessarem as campanhas conjuntas para conquista de mais vantagens e privilégios, se não forem concorrentes; os círculos sociais de parceiros interessados na não-mobilidade social do país (como para a integração maior de negros e de índios, ou de gente situada em extrema pobreza); o grupo fechado de empresários implicitamente mancomunados na ajuda de candidato eleito; grupo de pessoas contrárias a mudanças legislativas, ou administrativas, capazes de mexer com a comodidade dos corruptos; ocupantes de cargos públicos atentos à iniciativa de norma susceptível de alterar privilégios garantidos pelo sistema jurídico, para lhe abortarem a edicção; parcerias e coalizões concentradoras de interesses comuns, com estratégias de recíprocas vantagens; união de ideais (ou interesses) religiosos, políticos, econômicos, em somatória convergente de esforços.

Prejuízos morais e jurídicos de muitos estamentos do Brasil. Raymundo Faoro aponta vários deles. Alude ao fato de o estamento ser uma modalidade de associação de pessoas acostumadas com os jogos do poder político. Servem-se dessa experiência para impor a sua vontade sobre as pessoas estranhas a essa comunidade. Ela não se constitui de gente da mesma classe social. Alguns podem ser mais ricos e outros mais pobres. A qualidade exigida é a inclinação de todos para exercer o poder real sobre as autoridades do Estado. O estamento favorece ao máximo o prestígio dos seus componentes. Quem tem prestígio, exerce poder de comando. Esse círculo é socialmente elevado, com qualificação para influir no máximo possível de círculos sociais (Faoro, p. 60-63). Ao estamento interessa sobre modo a burocracia, instrumento de controle. Há o estamento dos militares, dos togados, dos capitães da indústria, dos dirigentes de sindicatos de trabalhadores. A sua união dependeu da busca de interesses comuns, numa trajetória definida, resistente às mudanças sociais. Isso começou há mais de seis séculos, portanto, em Portugal (p. 819-838).

Egotismo. Ressumbra uma vez mais o cerne mesmo da corrupção – o egotismo, de que emanam todos os vícios destrutivos da vida social. O termo egotismo, de origem na Inglaterra no século XIX, indica sobretudo a importância grande dada a si mesmo por alguém. Inicialmente era mais ao escrever ou ao falar. Depois, estendeu-se o uso do conceito. Abrangeu também a centralização de si no mundo, em torno do qual os valores hão de girar; eis, então, a perda de percepção da realidade. Indica, portanto, um egoísmo fortalecido, rijo, impenitente, inflexível e intolerante, duro com os adversários, aos quais o sujeito sempre se prefere em tudo. Para tanto o sentimento de superioridade há que aflorar.[45] É a soberba. O soberbo tudo pode. Seguem-se os seus acólitos clássicos: avareza, luxúria, gula, ira, inveja, preguiça. E muitas são as próprias formas que vai assumindo cada qual conforme o egotismo vai derrotando a pessoa vitimada de vícios.

Alguns resultados. Contentamo-nos aqui com anotar serem esses estamentos os círculos sociais observadores do poder político, sempre interessados em colher dele frutos econômicos. Sabido é serem a política e a economia, mundo afora, os processos mais violentos na troca vivencial de valores. São, a um tempo, os processos sociais de adaptação mais e instáveis. As pessoas situadas fora dos estamentos (como o Povo mais simples e menos protegidos pelo Direito) ficam injustamente à míngua. Donde o desgosto, a raiva, alguma vontade de vingança. Aparecem assim mais fraquezas humanas e ombrearem com os vícios dos poderosos, desorganizando crescentemente os círculos sociais.

Escreve Darcy Ribeiro:

Descendentes de escravos e de senhores de escravos seremos sempre servos da malignidade destilada e instilada em nós, tanto pelo sentimento da dor intencionalmente produzida para doer mais, quanto pelo exercício da brutalidade sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças convertidas em pasto de nossa fúria. A mais terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a cicatriz de torturados impressa na alma e pronta a explodir na brutalidade racista e classista. Ela é que incandesce, ainda, hoje, em tanta autoridade brasileira predisposta a torturar, seviciar e machucar os pobres que lhes caem às mãos. [46]

Esforços de refazimento. Terá de haver um longo, efetivo e vigoroso programa de educação e de re-educação, com reflexão nacional sobre os efeitos destrutivos da corrupção, com proliferação de idéias sobre ética geral e mais a ética na política, com a efetividade das medidas legais punitivas (notadamente contra os corruptos mais poderosos), e com o término dos foros privilegiados (ou a sua redução ao mínimo cientificamente necessário). [47]

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http://pt.wikipedia.org/wiki/Psychomachia (Batalha da Alma)


[1] FREIRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala (Formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal). 51ª edição. São Paulo: Editora Global, 2006 [3ª. reimpressão, 2009]

[2] Ver Sociedade Patriarcal - 2ª parte; publicado na Folha da Manhã, terça-feira, 13 de novembro de 1951. (Está em http://almanaque.folha.uol.com.br/sergiobuarque_patriarcal2.htm). Ver também HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Companhia das Letras: São Paulo, 26ª edição, 1995 [31ª impressão em 2009], páginas 81 seguinte e 87 seguintes.

[3] Veja-se a colaboração alemã >>> http://de.wikipedia.org/wiki/Mani_(Religionsstifter) onde está posta com algum pormenor em citações bibliográficas tais, como — Die Gnosis III. Der Manichäismus. Unter Mitw. von J.P. Asmussen eingel., übers. und erl. von Alexander Böhlig. Zürich 1995 (und andere Aufl.); Geo Widengren: Mani und der Manichäismus. Stuttgart 1961; Manfred Hutter: Mani und die Sasaniden. Der iranisch-gnostische Synkretismus einer Weltreligion. Institut für Sprachwiss. d. Univ. Innsbruck 1988; Ludwig Koenen u. Cornelia Römer (Hrsg.): Mani. Auf der Spur einer verschollenen Religion. Herder, Freiburg i. B. u. a. 1993.

[4] Ver em >>

http://www.google.com/search?q=%22%C3%89+um+esc%C3%A2ndalo+antigo+a+verba+de+R%24+15+mil+por+m%C3%AAs+que+cada+congressista+pode+gastar.+%22&hl=pt-R&sourceid=gd&rls=GGLD,GGLD:2008-28,GGLD:pt-BR&aq=t

No ano de 1995, entre Zero e 10 o Brasil tinha 2,7% de nota, igual ao nível da Venezuela e abaixo de México, Argentina, Colômbia e Chile. No ano 2000 foi atribuída ao Brasil a nota 3,9, abaixo da Costa Rica, El Salvador, Chile e Peru. Mais recentemente, em 17.11.2009, noticiou-se por aqui pela Revista “Veja”, que ocorrera ligeira melhora: “A organização Transparência Internacional (TI) divulgou nesta terça-feira, em Berlim, na Alemanha, o ranking anual de corrupção. O Brasil, que recebeu 3,7 pontos, em uma escala de 0 a 10, subiu cinco posições e passou de 80º para o 75º lugar. Apesar da melhora no ranking, o país continua com uma imagem negativa, compartilhando a posição com nações como Colômbia, Peru e Suriname”.

[5] Sobre isto ver, entre trabalhos de ordem técnica, agora em cosmovisão mística (não científica), o CAPÍTULO IX (páginas 97-104), de BATA, Angela Maria La Sala, À procura da verdade. Editora Pensamento: São Paulo (sem data). É tradução de Alla ricerca della veritá, Roma, 1972). Está em >>>:

http://books.google.com/books?id=kbPdVxcdqYEC&pg=PA100&lpg=PA100&dq=%22lei+da+compensa%C3%A7%C3%A3o+psicol%C3%B3gica%22&source=bl&ots=PvON2NtOma&sig=twTEHnyucK_fW0Nw1gjkd0vcs50&hl=pt-BR&ei=MXH9Sr6KIoPclAfBxsiKCw&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=9&ved=0CB4Q6AEwCA#v=onepage&q=&f=false

[6] MARQUES, A. H. de Oliveira. Breve História de Portugal. Editorial Presença: Lisboa, 7ª ed., 2009, p.409.

[8] Ver Friedrich Dorsch (Hrsg.): Psychologisches Wörterbuch, Verlag Hans Huber, 11. Aufl., 1987, in http://de.wikipedia.org/wiki/Egozentrik

[9] Tal como andam os ilícitos cometidos contra jovens, e praticados por eles, os nossos dias parecem ter recebido herança cultural daqueles tempos do patriarcalismo brasileiro clássico.

[11] No mesmo jornal paulistano, e mesmo Caderno Cotidiano consta: “Só vieram as mães com o atestado de óbito", disse recentemente o juiz Marcos Bandeira, de Itabuna (BA), sobre o último mutirão para julgar adolescentes suspeitos de cometer infrações”.

De acordo com noticiário noturno da TV do dia 14.11.09, atualmente os municípios com mais mortes em todo o Brasil são Maceió e Itabuna.

[12] Jornal Folha de São Paulo, Caderno Brasil, quarta-feira, 25 de novembro de 2009.

[13] Gilberto Freire menciona a situação dos Leme, de origem nórdica, com altos cargos dados pelo rei de Portugal no século XVII. No Brasil alguns descendentes são Leme encontrados nos trabalhos mais baixos da escala social (Casa Grande & Senzala, p. 338-339).

[14] Ver Folha de São Paulo. Caderno Brasil. São Paulo, quarta-feira, 02 de dezembro de 2009.

[16] Na moral o critério máximo do comportamento é o da dignidade, esta capacidade humana de trabalhar com fatos e idéias, com mais a capacidade de nos doarmos ao próximo tanto individual como grupalmente. Muito há o que consultar nesta matéria. A título de exemplos, leiam-se ARISTÓTELES. In Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1996. Ética a Nicômaco, p. 111-320 (o bem humano e o prazer); PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. A Moral do futuro. Rio de Janeiro: Editores F. Briguiet e Cia, 1913, páginas 21-78 (sobre a evolução da moral); BARBOSA, Rui. A crise moral. Rio de Janeiro: Ed. Organizações Simões, 1962, páginas 120-123 (sobre os “homens de bem”, aduladores do Mal. Hermes da Fonseca); BENETI, Sidnei Agostinho. Da conduta do juiz. 2ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2000, páginas 149-183; MORAL, Irenaeus Gonzalez. Philosophia moralis. 4ª ed. Santander (Espanha): Ed. Sal Terrae, 1955, páginas 201- 215 (sobre forças ou virtudes e fraquezas ou vícios); BLACKBURN, Simon. Oxford dictionary of philosophy. Nova York: Oxford University Press, 1996, p. 250-252 (o que é o bem); BRUGGER, Walter. Philosophisches Wörterbuch. Wien: Im Verlag Herder, 1948, p. 90-92 (o conceito de ética como filosofia moral); GUARDINI, Romano. Der Herr (Betrachtungen über die Person und das Leben Jesus Christi). Zweite durchgesehene Auflage. Würzburg: Werkbund-Verlag, 1938, páginas 99, 106 e seguintes, 490 e seguintes (a ética segundo Jesus Cristo); HABERMAS, Jürgen. Wahrheit und Rechtfertigung. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1999, p. 271-278 (saber teórico e saber prático, conhecimento e moral; a dignidade); SCHMID, Wilhelm. Schönes Leben? – Einführung in die Lebenbenkunst, Ed. Suhrkamp, 1ª. ed., 2005, p. 104-111 (sobre a arte da ironia).

[17] A respeito de graus de corrupção entre países, tem-se a vigilância da “Transparency International”. Um exemplo está em Global Corruption Report 2009. Corruption And The Private Sector of Transparency International. Cambridge University Press. Edição/reimpressão; 2009, 496 pág.

[18] Folha de São Paulo, sábado, 21 de novembro de 2009.

[19] Sobre estes conceitos freudianos (Id, Ego, Superego) ver Dra. Ruth M. Cerqueira Leite (do Departamento de Psiquiatria da Unicamp), Glossário com termos psicanalíticos. Jornal "Folha de São Paulo", Folhetim, 23 de setembro de 1979.

[22] Generalidades sobre boa conduta destes agentes públicos: VITRAL, Waldir. Deontologia do magistrado, do promotor de justiça e do advogado. 2ª ed. rev. aum. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

[23] Ver Jean LAUAND (Professor Titular FEUSP, IJI – Univ. do Porto). S. TOMÁS DE AQUINO E OS PECADOS CAPITAIS — Pecados capitais: uma elaboração teológica da experiência antropológica. Cfr. em http://www.hottopos.com/notand10/jean.htm

[24] Época. Editora Globo, 16.11.2009, página 51, 1ª coluna, parte inferior.

[25] Povo, atente-se bem, não é senão a reunião de todos os elementos do agrupamento social de um país, sem conotação marxista, pois; as associações servem, sim, para garantir melhorias de vantagens para os magistrados, mas, em primeira plana é para incutir neles a consciência de bons servidores do seu Povo — tanta é a honra que isto significa; não pode o juiz renunciar à sua função social de cidadão cercado de direitos e de deveres; importa mais ao País a organicidade do todo que o interesse individualista da parte: valor de mais peso é a alteridade generosa que o egocentrismo auto- e alterofágico; o equilíbrio do todo só se percebe com esforço de pesquisa por isso que as necessidades humanas tumultuam-se na complexidade geral, de tal modo que as carências são variadas (de Religião, Moral, Artes, Direito, Política, Economia e Ciência); todo e qualquer apriorismo (posição tomada por falta de estudo, ou de denodo ético) é um desvio cognitivo; é cientificamente impossível o equilíbrio do todo sem se equilibrarem as partes, notadamente nos processos sociais de adaptação mais dotados de instabilidade e de violência — política e economia; em sendo as coisas assim, como parecem ser, é um mau cidadão (dificilmente um bom juiz) o que se fecha na mira dos interesses pessoais e de classe (individualismo e corporativismo) sem dar ênfase à necessidade de eqüidade crescente em matéria de economia e de política; juiz passado a um reles renunciante do pensamento político (nada tem isto a ver com política partidária) vive para si, ora como um inútil ora como um perigo para o Povo: será também, por coerência, um adversário das liberdades fundamentais e da democracia (são duas realidades diferentes, mas que hão de andar juntas para lograr-se equilíbrio geral — paz social em plena vivência humana).

Ora bem, quem desamar os princípios em breve resumo acabados de enunciar, e as atitudes consentâneas com eles, têm de reputar-se ideologicamente (sociologicamente) como pessoa da má direita — a egocêntrica, individualista, reacionária. Esta classe de indivíduo não se restringe ideologicamente a uma fé convicta na efetividade prática da atividade econômica privada e na diminuição da presença social do Estado, para bem de todas as pessoas. Estas duas últimas são características da “direita” em sentido eticamente aprovado — não são, só por isso, gente egocêntrica, individualista, conservadoramente reacionária.

[26] Do mesmo étimo glu vieram à literatura os termos Gargantua e pantagruélico — o gigantesco Pantagruel, “divertido e desbocado comilão criado por François Rabelais, escritor francês do séc. XVI. Filho de Gargantua, outro comilão lendário, Pantagruel já nasceu com um apetite descomunal, mamando diariamente o leite de 4.600 vacas. Volta e meia, ao longo dos "Horríveis e Espantosos Feitos e Proezas do Renomado Pantagruel", aparecem comilanças e bebedeiras em torno de mesas repletas de boas carnes, iguarias e vinho abundante. Por isso, [...] "refeição pantagruélica" ou um "apetite pantagruélico" [...] designar qualquer exagero gastronômico”.

[29] Exemplo da Constituição Federal de 1988, artigo 37: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte”: [...]

[30] Ver >>>

http://74.125.93.132/search?q=cache:7U6-NJb0gV0J:www2.uol.com.br/vyaestelar/preguica.htm+pregui%C3%A7a&cd=12&hl=pt-BR&ct=clnk

[32] Ver HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 26ª edição, 2009, p. 86-87.

[33] Este jornalista é publisher da revista Idéia Socioambiental e diretor da consultoria “Idéia Sustentável: Estratégia e Inteligência em Sustentabilidade”; é também professor de Marketing Social da FIA-USP.

[35] Ver ERNOUT, Alfred e MEILLET, Antoine. Dictionnaire étymologique de la langue latine: histoire des mots. Paris: Klincksieck, 2001, p. 99-100.

[36] Ver Ética a Nicômaco. Editora Nova Cultural, São Paulo, 1996; Livro I, Capítulo 7: o bem deve ser algo final e auto-suficiente; definição da felicidade considerando a função própria do homem. Capítulo 8: esta definição é confirmada pelos conceitos vigentes acerca da felicidade. Capítulo 9: pode-se aprender a ser feliz? Ou se chega à felicidade pelo hábito? [...]

[37] Ver MORAL, Irenaeus Gonzalez. Philosophia moralis. 4ª ed. Santander (Espanha): Ed. Sal Terrae, 1955, páginas 206-213.

[38] Sobre o crescimento em igualdade, leia-se PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Democracia, liberdade, igualdade: os três caminhos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1979, 3ª. parte.

[39] Batalha da Alma, ao pé da letra em grego. Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Psychomachia

[40] Ver BENVENISTE, Émile. Le vocabulaire des institutions indo-européennes. 2 tomos Paris: Les Éditions de Minuit, 1969, t. 2, p. 107-110.

[41] HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 26ª edição, 2009.

[42] FAORO, Raymundo. Os donos do poder. Formação do patronato político brasileiro. 3ª edição revista, 8ª reimpressão. Editora Globo: São Paulo, 2008.

[43] Individualmente, contudo, os religiosos eram geralmente contra esse poder civil sobre a hierarquia eclesiástica.

[46] RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2ª edição, 1995, p. 120.

[47] São estes os tópicos possíveis do capítulo final de um livro — “As raízes da corrupção”.

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