domingo, 29 de abril de 2012


NORMAS GERAIS DE DIREITO PENAL E OS CRIMES AMBIENTAIS DA LEI Nº 9.605, DE 12.02.1998.

 Mozar Costa de Oliveira — bacharel em filosofia (Universidad Comillas de Madrid), mestre e doutor em direito (USP), professor aposentado de direito (Universidade Católica de Santos, São Paulo).


SUMÁRIO: I — Introdução. II — A estrutura teórica: análise lei federal n° 9.605/98. III — Regras gerais da lei nº 9.605, de 12.02.1998 sem correspondência no código penal. IV — Regras gerais da lei nº 9.605, de 12.02.1998 com correspondência delas no código penal. V — Parte geral do código penal brasileiro e a sua incidência sobre o crime ambiental. VI — Conclusões — Bibliografia

I — INTRODUÇÃO

1. Objetivo deste trabalho. A pretensão deste estudo é cotejar as normas gerais do código penal brasileiro com as da lei nº 9.605, de 12.02.1998. Veremos que, gerais, tem-nas igualmente esta lei. Nem nos ocuparemos somente das regras jurídicas gerais de direito material.
À primeira vista, por serem gerais todas elas, surge alguma perplexidade ao intérprete, ao estudioso — saber quê conjunto incide, qual há ser aplicado. A segunda pergunta é mais específica, a saber, como se dá essa incidência relativamente aos crimes descritos na lei brasileira de crimes ambientais.
2. Regras jurídicas gerais numa e noutra lei. Assinalamos as situações em que ambas as leis edictam regras jurídicas gerais, e aquelas em que o regramento se acha no código penal tão somente [1]. Dá-se relevo neste trabalho a uma regra jurídica pré-excludente: a do estado de necessidade.
3. Método. Quando parecer oportuno, daremos exemplos — como elemento científico da experimentação teorética —, verificando se os fatos confirmam as ideias contidas na regra jurídica. Aplicamos frequentemente a teoria geral da dogmática jurídica. Faremos continuadas cópias, em itálico, de textos de ambas as leis (menos as de nota de rodapé).
4. Conclusões. Em breves proposições respondemos algo sobre que conclusões se extraem desta breve investigação, teóricas e práticas.

II — A ESTRUTURA TEÓRICA.  ANÁLISE DA LEI FEDERAL DE N° 9.605/98


1. Visão geral. Nas disposições gerais a lei brasileira trata do concurso material (art. 2o). No artigo terceiro traça regra sobre tríplice responsabilidade se o ilícito é cometido no interesse ou benefício da pessoa jurídica. Teremos oportunidade de apontar a relevância da parte final desse artigo (no interesse ou benefício da pessoa jurídica). A regra jurídica do § único cuida da responsabilidade solidária. No art. 4° tem-se a desconsideração da pessoa jurídica, se necessária para execução de sentença. O capítulo II (artigos 6°-24) é dedicado à aplicação da pena. O capítulo III (artigo 25) diz com normas sobre apreensão do produto e do instrumento do ilícito. No IV (artigo 26-28) aparece a ação penal e o respectivo processo. O capítulo V vem tipificar os crimes (=pressupostos fáticos da existência jurídica do ato ilícito penal) contra o meio ambiente: contra a fauna (artigos 28-37), contra a flora (artigos 38-53), os crimes de poluição em geral e outros (artigos 54-61), os de dano ao ordenamento urbano e ao patrimônio cultural (arts. 62-64), crimes contra a administração ambiental (art. 66-69) [2].
O capítulo VI é sobre infrações administrativas (de que não cuida este nosso estudo). O capítulo VII, por fim, estabelece dever jurídico do Brasil para com outras pessoas de direito supraestatal (tampouco é objeto destas nossas considerações) [3].
2. Críticas. No ver de Fink e outros [4] a nova lei deveria ter sido expressa quanto à revogação de outros tipos penais: art. 27 da lei 5.197/67, art. 26 da lei 4.771/65, art. 35 do Dl. 221/67 e art. 8o da lei 7.679/88.
Entendem os irmãos Passos de Freitas[5], em sentido contrário, estarem a faltar ainda quatro contravenções que se podem praticar contra o meio ambiente, não incluídas na lei nº 9.605, de 12.02.1998. São as do art. 26, alíneas e, j, l, m do código florestal.[6] E em outras leis existe ainda a tipificação de crimes ambientais — como a dos cetáceos (lei 7.643/87), contra o parcelamento do solo urbano (lei 6.766/79), os casos de desobediência a determinações legais do Ministério Público (lei 7.347/85), os contrários à correta atividade nuclear (6.453/77), contra o patrimônio genético (8.874/95), os da lei de responsabilidade de prefeitos (Dl. 201/67), os do uso de agrotóxicos (7.807/89) e por fim os próprios tipos do código penal em que o objeto é a proteção do meio ambiente [7].
3. Crimes dolosos, crimes culposos.[8] A grande maioria dos tipos da lei nº 9.605, de 12.02.1998, é de crime doloso, com exceção dos seguintes nove crimes ambientais, de modalidade culposa, a saber: art. 38 § único (Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade); art. 40 § 3º (Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade); art. 41 § único (Se o crime é culposo, a pena é de detenção de seis meses a um ano, e multa); art. 49 § único (No crime culposo, a pena é de um a seis meses, ou multa); art. 54 § 1º (Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa); art. 56 § 3º (Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa); art. 62 § único (Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa); art. 67, § único (Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa); art. 68,  § único (Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa.).
A modalidade culposa está sob a incidência de algumas regras jurídicas específicas do código penal, como teremos oportunidade de ver.

III — REGRAS GERAIS DA LEI Nº 9.605, DE 12.02.1998, SEM CORRESPONDÊNCIA NO CÓDIGO PENAL.

1. O novo: responsabilidade penal da pessoa jurídica. As proposições normativas dos arts. 3o e 4º da lei brasileira em vigor introduzem uma das maiores novidades ao direito penal brasileiro.[9] Diz que (art. 3º e § único):
 As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. — Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato.

2. Desconsideração da pessoa jurídica no direito penal. A norma do art. 4º (Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente) só incide em matéria criminal para se atingir o objetivo aí descrito, isto é,  ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente. A desconsideração da pessoa jurídica passa os ônus aos responsáveis pela pessoa jurídica (aos presentantes dela, pois). Toca-lhes então o cumprimento da condenação, que o julgamento impuser. Trata-se em verdade de matéria de direito processual novo. Está nos arts. 19-20 da lei especial:
Art. 19. A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa. Parágrafo único. A perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório. Art. 20. A sentença penal condenatória, sempre que possível, fixará o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido ou pelo meio ambiente. Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá efetuar-se pelo valor fixado nos termos do caput, sem prejuízo da liquidação para apuração do dano efetivamente sofrido.

3. Sentença criminal há de fixar o quantum necessário ao pagamento de prejuízos. Ao menos como regra jurídica geral, é nova a do art. 20 da lei nº 9.605, de 12.02.1998:
A sentença penal condenatória, sempre que possível, fixará o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido ou pelo meio ambiente.  Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá efetuar-se pelo valor fixado nos termos do caput, sem prejuízo da liquidação para apuração do dano efetivamente sofrido.

4. Penas cominadas próprias da pessoa jurídica. Como a pessoa jurídica pode ser autora de crime ambiental (o que é novo), não constam do código penal as respectivas penas. São as do art. 22 da lei brasileira de crimes ambientais:
As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:  I - suspensão parcial ou total de atividades; II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade; III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. § 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente. § 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar. § 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.

4. 1. Precisão de uma das penas. A norma do art. 23 estabelece mais precisamente em que consiste a pena de prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica condenada por crime ambiental:

[...] consistirá em: I - custeio de programas e de projetos ambientais; II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III - manutenção de espaços públicos; IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.        

 

4. 2. Liquidação forçada da ré, pessoa jurídica de direito privado. O art. 24 da nova lei comina pena cível para a pessoa jurídica. Consta da norma do art. 24:

A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional [10].

As normas do art. 25 são, em seu rigor técnico, regras jurídicas sobre execução. Não são objeto deste nosso estudo.

IV — REGRAS GERAIS DA LEI Nº 9.605, DE 12.02.1998 E A CORRESPONDÊNCIA DELAS NO CÓDIGO PENAL.

A lei nº 9.605, de 12.02.1998 contém matéria geral que também se encontra regrada no código penal.[11] Algumas regras jurídicas coincidem no seu sentido e orientação, outras diversamente. Vejam-se. 
Concurso de agentes. Contém a lei nº 9.605, de 12.02.1998, regras jurídicas gerais sobre os tipos (suportes fáticos penais) do seu texto. Diz o art. 2º que
Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Tem-lhe-se a correspondência no código penal, art. 29 e §§ (sem se levar em linha de conta a pessoa jurídica):
Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. § 1º. Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. § 2º. Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

Além de a regra especial se sobrepor à geral, hemos de considerar também ser aquela posterior a esta sobre que incide o art. 82. De todo modo, a norma desse § 2o não está na lei brasileira de crimes ambientais. Ela incidirá, portanto, por força do seu § art. 79:
Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.

2. Incidência subsidiária a respeito de culpabilidade. A lei nº 9.605, de 12.02.1998, trata de culpabilidade, e dos seus graus, no art. 2o e no 7o-II. Supre-os completivamente o código penal acerca de fixação da pena (art. 59) [12]:
O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário o suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos [13].

3. Aplicação de pena. Do mesmo modo o Capítulo II (da aplicação da pena), arts. 6º-15, e 20-24, edita regras jurídicas gerais, de direito material, para efeito de incidência das normas dessa lei especial. Vamos analisá-las à frente.
3. 1.  Direito material e direito processual.             Nesta série de regras jurídicas da lei brasileira de crimes ambientais, a que acabamos de aludir, cumpre notar: a) só se mencionaram as de direito material; b) à primeira vista podem parecer de direito processual pelo fato de a lei aludir à aplicação delas pelo juiz. Mas não: o Estado só as aplica no processo por elas incidirem antes, no plano do direito material. Elas não são processuais pela circunstância de aplicá-las o juiz no processo. Quando o agente atua dentro de certos limites e situações já a regra jurídica penal incide com as consequências postas na regra (no mundo do direito criminal elas são sanções penais). Tudo ainda mesmo sem atuação do Estado. A incidência é automática: cuida-se de uma correspondência lógica cujas consequências a maioria do círculo social aceita; já a aplicação é o ato de alguém tomar mentalmente a regra jurídica e com ela dar dinamismo a certo fato extraindo dele consequências concretas.
3. 2. Qualificações das regras jurídicas. Não se pense — quadra repetir — serem de direito processual essas normas por a lei enunciar assim: "O juiz, atendendo [...] etc.". O juiz aplica a norma e qualquer pessoa pode fazer quase o mesmo, dobrando-a sobre o ocorrido (plica é dobra), atuando ela sobre ele — tal pessoa lhe dá o sentido e a orientação que a regra jurídica tem.
 A diferença está nisto: só o Estado pode aplicar a pena a título de decisum (=ato jurídico jurisdicional). Todo aquele porém que adota a conduta que a norma determina, aplica-a. Aplicar é atuar com a norma. A aplicação estará conforme a direito se ela corresponder à incidência. Quer isto dizer que incidência e aplicação não são sinônimos em termos reais, sociológicos. Incidência é correspondência lógica entre os fatos descritos (=suporte fático, Tatbestand, “tipo”) e os dizeres da norma (Norm ou Regel — regra jurídica de proibição, por exemplo). Esta correspondência lógica consubstancia realidade que o grupo social aceitou (vontade!). Aceita-a inda que passivamente: ao deixar entrar em vigor a dita norma. A norma que existe, que vale, mas que não entrou ainda em vigor, não incide. Se for aplicada assim, terá cometido erro quem a aplicou. Por isto é importante a seguinte regra jurídica de "sobredireito" (=regra jurídica sobre regra jurídica): "esta lei entrará em vigor na data da sua publicação"; ou "entrará em vigor no dia [...]".
3.3. Confusão conceitual. Por falta de formação científica aprimorada muitos juristas se confundem e prejudicam os seus leitores. Ponto importante é este, pois. Não são sinônimos na norma o seu existir (ter sido assinada e publicada), o seu valer (não contrariar regra de taxionomia superior a ela), o seu viger (situação espaço-temporal de poder regular os fatos, isto é, poder incidir), o seu incidir (é a sua eficácia típica, ou seja, indicar a direção jurídica do suporte fático e qual o fato jurídico surgido no mundo), o ato de aplicar (fazer a regra jurídica dobrar-se sobre o fato jurídico, dando-lhe dinamismo) e o seu ser mais efetiva ou menos (qualidade da regra jurídica pela qual ela é ou não observada pelo grupo, muito ou pouco) [14]. E quando se fala em legitimidade da norma, ou se alude a conceito pertencente ao valer jurídico ou já se alude a conceito mais amplo (sociológico), a saber, se essa regra jurídica atende muito ou pouco às necessidades sociais (é a taxa de legitimidade da regra).
4. Gradação da pena em geral.  A lei nº 9.605, de 12.02.1998, também traz normas gerais sobre sanções. Há a do art. 6o, acerca de critérios especiais da pena:
Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará: I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente; II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental.

4. 1.  Gradação da pena de multa.  Para a multa lê-se regra jurídica especial, neste mesmo art. 6o:
a autoridade competente observará [...] III - a situação econômica do infrator, no caso de multa.

É a mesma norma do código penal a respeito da pena pecuniária. Veja-se o art. 60: Na fixação da pena de multa o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu.
A multa é ainda objeto de regramento, no art. 18 da lei especial:
A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz,[15] ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.

Repete com outras palavras aproximadamente a regra jurídica do código penal, art. 60, § 1º, a saber:
 A multa pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo.
5. Espécies de pena. A lei nº 9.605, de 12.02.1998, estabelece nos arts.  7º e 8o traça o modo de se tratarem as penas privativas de liberdade e as outras:
Art. 7º As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando: I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime. Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída.

Depois diz quais são as penas restritivas de direitos:
Art. 8º As penas restritivas de direito são: I - prestação de serviços à comunidade; II - interdição temporária de direitos; III - suspensão parcial ou total de atividades; IV - prestação pecuniária; V - recolhimento domiciliar.

Desce a pormenores sobre umas e outras; assim quanto à prestação de serviço:
Art. 9º A prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação, e, no caso de dano da coisa particular, pública ou tombada, na restauração desta, se possível.

como igualmente às de interdição:
Art. 10. As penas de interdição temporária de direito são a proibição de o condenado contratar com o Poder Público, de receber incentivos fiscais ou quaisquer outros benefícios, bem como de participar de licitações, pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos, e de três anos, no de crimes culposos.

E o art. 11 define circunstâncias da pena de suspensão de atividades: será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às prescrições legais.
5. 1. A prestação pecuniária é a própria pena de multa. A pena de art. 8º, aí denominada prestação pecuniária (As penas restritivas de direito são: IV - prestação pecuniária), é a pena de multa regulada nos arts. 6º:
Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará: [...] III - a situação econômica do infrator, no caso de multa [...].

Artigo 18:
A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, [16] ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.

e artigo 21:

As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:  I – multa.

5. 2. Valor da multa. É o desta lei de crime ambiental a norma do seu art. 19 caput:
A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa. E mais o § único: A perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório.

De modo que, por não contrariar a lei nº 9.605, de 12.02.1998, quanto à multa também incide o art. 50 do código penal:
A multa deve ser paga dentro de 10 dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais. § 1º. A cobrança da multa pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou salário do condenado quando: a) aplicada isoladamente; b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos; c) concedida a suspensão condicional da pena. § 2º. O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família.

5. 3. Multa, conteúdo de dívida ativa. Incide ainda a regra jurídica do art. 51, ao enunciar:
Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dividida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

5. 4. Multa e recolhimento domiciliar. As penas de prestação pecuniária são de regramento mais pormenorizado que os do código penal.
Art. 12. A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator), bem como a de recolhimento domiciliar (Art. 13. O recolhimento domiciliar baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado, que deverá, sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer atividade autorizada, permanecendo recolhido nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual, conforme estabelecido na sentença condenatória

5.5. Recolhimento domiciliar. No tocante ao recolhimento domiciliar, há semelhança com o art. 36 do código penal, que reza:
O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. § 1º. O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. § 2º. O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativa aplicada.

Ficam as demais normas do código penal sem incidência.
5. 6. Reclusão e detenção. Todas estas normas são regras jurídicas mais específicas que as do código penal (Art. 32. As penas são: I - privativas de liberdade; II - restritivas de direitos; III - de multa) [17].
Entretanto este incide supletivamente na particularidade sobre reclusão e detenção, como vem no art. 33:
A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

6. Sobredireito e Direito das Gentes. A lei nº 9.605, de 12.02.1998 traz regras jurídicas remissivas ao Direito das Gentes, que incidirão em relação do Brasil com os Estados vizinhos como se vê dos artigos 77-78 [18]. A subsidiaridade do código penal tem também lugar nesta matéria. Tenha-se em conta portanto o conjunto de regras jurídicas de sobredireiro (Überrecht — regras jurídicas a respeito de outras regras jurídicas, no espaço e no tempo) [19] e de Direito das Gentes ou  supraestatal (melhor que “internacional público” porque são regras jurídicas relativas a todos os Estados, estão acima de todos eles e não somente entre eles). As normas de sobredireito são regras jurídicas (=normas de direito) que dizem respeito a territorialidade e extraterritorialidade, ao lugar do crime, à pena cumprida no estrangeiro e à eficácia de sentença estrangeira[20]. Sobre esses assuntos trazemos aqui breves considerações.

V — PARTE GERAL DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO E A SUA INCIDÊNCIA SOBRE O CRIME AMBIENTAL

1. Teoria e prática. Neste item mostraremos a relevância de regras jurídicas gerais do código penal brasileiro para o crime ambiental. São normas gerais que não figuram na lei nº 9.605, de 12.02.1998, nem encontram nela correspondência explícita.
Deve-se essa importância teórica e prática ao fato de a lei nº 9.605 de 12.02.1998 continuar a tradição ideada sobre o ilícito penal no Brasil. Por isso, art. 79:
Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.

As regras gerais da lei de 1998 vêm tingir de específico o pouco que tem de parte geral. Este, embora pouco este, prevalece todavia sobre o código penal, no que difira dele (art. 82: Revogam-se as disposições em contrário). 
As regras jurídicas gerais do código penal brasileiro vão desde o art. 1o até ao art. 120. Estatuem situações de segurança extrínseca quanto a pontos fundamentais. Salvo as introduzidas por leges extravagantes, essas normas incidem em toda classe de crime. Por isso são corretamente havidas como regras jurídicas gerais de direito penal material.
2. A subsidiariedade em geral. Incidem tais regras subsidiariamente sobre os ilícitos ambientais como determinado no art. 79 da lei nº 9.605, de 12.02.1998 [21]. Donde a necessidade de se ter em conta a parte geral do código penal quando surjam os suportes fáticos descritos na lei especial. Por outra: quando em qualquer situação os fatos da lei nº 9.605, de 12.02.1998 não colidirem com as normas do Código Penal, então esses mesmos fatos recebem incidência deste código [22].
 3. Anterioridade da lei. Ao regular a aplicação da lei penal logo surge a questão da anterioridade da lei no art. 1o, de que já cuidamos. Segue-se o trato da lei penal no tempo, cuja solução está no art. 2º [23]. Ligam-se-lhe as normas do art. 5º-XXXVI e XL da Constituição Federal de 1988 [24]. Também interessa ao tema o escrito no artigo 107-III do código penal [25]. Se a lei é excepcional ou temporária, ela incide como ficou escrito no artigo 3º [26].
4. Tempo do crime. Quanto ao tempo do crime a resposta às questões é mais complexa, segundo o art. 4º [27]. Sobrevém a problemática da territorialidade, tal como posta no art. 5º [28]. Vem a ser relevante já que estas regras jurídicas gerais incidem também no caso de crimes ambientais. Temos países fronteiriços, e mar territorial, e o tratado do Cone Sul. De modo que algumas dessas normas merecem atenção especial [29].
5. Lugar do crime. No que toca ao lugar
onde foi praticado o crime ambiental, há que interpretar-se o art. 6º com o Direito das Gentes, notadamente por causa do Cone Sul. Os nossos parceiros nele são vizinhos nossos [30].
6. Extraterritorialidade. No relativo à extraterritorialidade da prática de crime ambiental há que estudar-se o art. 7o do código penal na matéria pertinente.
Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes: ... b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, [...] de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; [...] II - os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiros; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercante ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.

Incidem também as normas do § 1º e 2o:
Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. § 2º. Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.

7. Pena cumprida no estrangeiro. Pode alguém ter sido julgado na Argentina, por exemplo, por ilícito como o do art. 34 da nossa lei. Se o agente comete aqui o mesmo crime, incide o art. 8º:
A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.

Ocorre o mesmo com a eficácia de sentença estrangeira, segundo o art. 9º:
A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - sujeitá-lo à medida de segurança. Parágrafo único. A homologação depende: a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça.[31].

8. Contagem de prazo. Ainda por incidência do art. 79 da lei nº 9.605, de 12.02.1998, haverá de ser aplicada norma do art. 10 do código penal: O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. Coincide aquela com a do art. 12 do código penal.
9.  Frações não computáveis da pena. No que respeita às frações não computáveis da pena, o art. 11 incide, ou seja, desprezam-se, nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos, as frações de dia, e, na pena de multa, as frações da moeda [32].
10. Relação de causalidade. Amostras de realidades.  Entra o art. 13. Quer isto dizer que o resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa, diz o código penal, a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Exemplificando: se o presidente de uma empresa (presentante dessa pessoa jurídica), altera sítio arqueológico (lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 64) para satisfazer a interesse próprio e não em benefício daquela, ele é que responde e ela não.
Se houver superveniência de causa independente, incide o § 1º:
 A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

Vamos a uma amostragem com o art. 66 da dita lei. Se o agente público produz documento final de licenciamento, onde sonega informações técnicas, e se arrepende: não assina, guarda bem o escrito no intuito de servir de modelo em espécie onde a sonegação não se dê. Mas o interessado no documento consegue o escrito subtraindo-o, e falsifica a assinatura do agente público. Este teve conduta com arrependimento eficaz do crime ambiental. Aquele comete crime de falso (o que o faça ao depois, isso tem de ser estudado segundo eventuais atos ilícitos posteriormente perpetrados por ele). 
11. Omissão. Pela lei nº 9.605, de 12.02.1998 o crime ambiental pode ocorrer se no suporte fático há o elemento da omissão, de modo que cumpre levar-se em linha de conta a relevância dessa omissão. A regra é a do art. 13, § 2º:
A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Se, pois, em exemplificação o prefeito de município litorâneo sabe que o curtume da cidade entrou a lançar detritos no riacho e com isso causa mortandade dos peixes, a água escorre para praiazinha isolada e lhe impede o uso por causa do mau cheiro. Ele, prefeito, em tempo pode tomar providência impeditiva. Omite-se, todavia. Incide na norma do art. 54 § 2o-IV da lei brasileira de crimes ambientais [33].
12. Consumação e tentativa. O art. 14 do código penal tem por suporte fático a situação do crime consumado e a do apenas tentado
[...] quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.

Eis aí, pois, amostra do crime tentado, art. 52 da lei nº 9.605, de 12.02.1998[34]: não autorizado, o agente encaminha-se a mata situada em trecho da Serra do Mar, levando consigo espingarda de caça. À beira da mata o crime ambiental não se consuma, e quando penetra nela, sim. Se vai entrar assim na mata, mas é impedido, só há a tentativa de crime ambiental.
 13. Desistência voluntária e arrependimento eficaz (exemplo). Diz o código penal no art. 15 que
o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.
Se o agente arma arapuca para apanhar inhambu, o pássaro se aproxima dela e aquele, rápido, puxa antes a corda para evitar a entrada do animal, não incide a norma penal do art. 29 da lei nº 9.605, de 12.02.1998[35].
14. Exemplo do arrependimento posterior. Eis objeto fático da regra jurídica do art. 16 do código penal:
Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

Se no mesmo exemplo dado acima, em tempo hábil (antes da denúncia) o agente solta o animal, incide esta norma penal ambiental.
15. Crime impossível e exemplo. Disto é matéria a regra jurídica geral do art. 17 do código penal:
Não se pune a tentativa quando, por ineficácia do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. 

Se o agente não autorizado entra na mata portando uma cordinha para apreender capivara, cordinha a que o animal facilmente resiste sem se ferir, o art. 52 da lei brasileira de crimes ambientais não incide.
16. Dolo e culpa. O art. 18 e seu § único do código penal incidem:
Diz-se o crime: I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

São crimes ambientais culposos, na lei nº 9.605, de 12.02.1998, os nove artigos seguintes:
38 (parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade),
40 § 3º (Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade),
41 (parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de detenção de seis meses a um ano, e multa),
49 (parágrafo único. No crime culposo, a pena é de um a seis meses, ou multa),
54 (§ 1º Se o crime é culposo),
56 (§ 3º Se o crime é culposo),
62 (§ único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa),
67 (parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa),
68 (parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa).
Em todos os outros pontos de incriminação supõe-se que o agente haja querido o resultado, ainda que só eventualmente ("se ocorrer não me importa, que venha"). A nosso ver, isto mostra bem que culpabilidade (=a vontade quanto à ocorrência) é sempre um elemento do suporte fático. Por outras palavras, a culpabilidade só se pode separar da tipicidade como recurso didático (aliás, artificial e desnecessário). Não há crime sem alguma manifestação de vontade. Na omissão essa manifestação dá-se: desdenhar o resultado proibido pela lei penal não atuando contra ele, ainda que por negligência, imprudência, imperícia. Se ela entra com os demais elementos do suporte fático (exemplo, danificar vegetação fixadora de duna — art. 50 da lei brasileira), automaticamente a norma incide. Aparece logo também a antijuridicidade. Também esta vem sendo havida à toa como terceiro elemento do ilícito penal. Em verdade é elemento do suporte fático, separada dele por mero artifício, de todo em todo escusado (e prejudicial à ciência).
16. 1. Teoria geral da dogmática jurídica — a culpabilidade está no suporte fático de crime. Mais simples, sobre ser mais técnico, é aplicar-se o resultado obtido pela pesquisa em teoria geral da dogmática jurídica em séculos de labor ingente de centenas de pesquisadores: todo e qualquer fato jurídico ocorre (acontecimento, happening, Tatbestand) quando, a determinado recorte fático do mundo social, corresponde regra jurídica que esteja em vigor no círculo social em que acontece. A única diferença entre o ilícito civil, ou administrativo, ou penal etc., está na regra — se ela é civil, administrativa, penal etc. De modo que crime é aquele acontecimento social em que surge suporte fático a que corresponde regra jurídica penal proibitiva — que lhe veda a ocorrência (=ato ilícito).
17. Agravação pelo resultado (exemplo). Essa agravação pelo resultado é o suporte fático (Tatbestand) do art. 19 do código penal: Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente. Incide sobre o crime ambiental da lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 40, § 2o, por exemplo. Se três agentes causam dano a árvores de unidade de conservação e um deles, além disso, mata sem querer um microleão dourado (disparou em direção a ele, brincando, a arma que pensava erradamente estar descarregada), este último agente responde também, em face da culpa, pela morte do animal, agravante especial da pena do art. 40 caput [36]. Como também incide a lei brasileira de crimes ambientais com a norma do art. 40 § 3o (houve somente culpa), a conta final da pena cabível é a metade de todo o cálculo feito antes [37].
18. Erro sobre elementos do tipo (exemplo). Diz a parte geral do código penal no art. 20 que "o erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei". Digamos que um servidor público pertence à equipe de conservação de sítios arqueológicos dentro de certo Município. Sabe que três locais estão assim definidos por ato administrativo; guarda-os corretamente. Um quarto local é também protegido como valor arqueológico, agora por força de decisão judicial recente. A comunicação aos servidores a respeito dessa decisão judicial, como de costume, foi feita no boletim semanal. Todavia o dito servidor deixou de lê-lo por desídia. Vê alguém não autorizado a mudar o aspecto desse último local de valor arqueológico e não o impede de proceder assim. Responde o servidor culpado pela modalidade culposa (art. 62 § único: Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa.) do ilícito penal descrito no caput:
Destruir, inutilizar ou deteriorar: I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial.

Não se inteirou o agente, por negligência; está presente um elemento do suporte fático (elemento constitutivo do tipo legal: culpa) [38].
19. Descriminantes putativas.  Diz o código penal no art. 20 § 1o:
 É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

De modo que, se pessoa jurídica está a causar poluição (de qualquer natureza), em nível de que possam resultar danos à saúde humana[39], e o encarregado do serviço exibe ao fiscal um laudo falso (de cuja falsidade, com mediano cuidado, poderia ter ciência) a atestar criminosamente que os níveis atingidos eram de pouca monta, sem danos à saúde humana etc., e por fim a poluição ocorre (lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 54) — aí está caso em que o fiscal responde culposamente pelo crime do art. 54; incide sobre ele a regra jurídica do art. 20, § 1o, segunda parte do código penal[40], por isso que há nesse art. 54 a forma culposa (§ 1º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa).
19. 1. O erro determinado por terceiro. É dito no art. 20 § 2º do código penal que "responde pelo crime o terceiro que determina o erro".  Ora, vejamos os fatos. Um desempregado é pago para deixar em terreno baldio sacos de substância tóxica, perigosa ao meio ambiente (lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 56, § 1o). Diz-lhe o terceiro que são sacos de cimento velho e nada mais; sobre este terceiro incide a regra jurídica do § 2o, de modo que recai sobre ele a pena de reclusão e multa. E pode haver aí também a só culpa: se esse terceiro negligentemente misturou sacos de cimento com os de substância tóxica e encomendou ao agente que os pusesse todos no terreno; a que incide então é a regra sobre pena mais branda (art. 56, § 3o: § 3º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa).
19. 2. Erro sobre a ilicitude do fato. A lei física da relatividade geral (A. Einstein) não poderia deixar de estar atuante em todo pedaço de particulares realidades. O direito é realidade do mundo real por ser ele um processo jurídico de adaptação inter personas. Um processo social de adaptação situado na realidade extramental, que não um pensamento poético, ou de abstração "filosófica".  Na maioria dos casos, ou seja, pelo normal segundo a norma mais vasta do quod plerumque accidit, a ignorância da lei é alheia à responsabilidade penal; assim está no velho adágio, determinado pela experiência humana no sentido de que não saber da lei não justifica ninguém: ignorantia legis neminem excusat.             Mas esta norma, se absolutizada, seria dura lex (só letra, sem vida) insustentável quando posta em todas as circunstâncias humanas. Não pode suportá-la assim a natureza. Tudo o que é, só o é no Espaço-Tempo-Energia. A classe da energia determina o tempo da incidência; não há tempo sem alguma energia. E qualquer espaço só se define em certo tempo e com certa energia. A suportabilidade humana é um tipo de energia no mundo da vida (biologia) a funcionar no ser humano, ser social vivo. Todo ele é, pois, biossociológico[41]. Em tudo, portanto também no direito penal, é necessário, com precisão, exatidão e rigor, levarmos em conta as preexcludentes de ilicitude ("antijuridicidade"). É o caso do estado de necessidade ("tabula unius capax").
19.3. Erro quanto ao suporte fático e erro quanto à regra jurídica. Tinha de surgir caso no qual haveríamos de localizar a exceção — em verdade apenas um caso menos comum. Não saber alguém que o ato seja ilícito quando o é, não é desconhecer o suporte fático. Desconhecer este não seria "erro de proibição" mas sim de "erro de tipo", isto é, erro a respeito do acontecimento. Desconhecer a ilicitude (código penal, art. 21) é erro de proibição (regra jurídica), erro quanto à lei. Se o pescador é um iletrado, destituído de qualquer informação durante a vida, então desconhece inevitavelmente ser proibido destruir vegetação protetora de mangues, objeto de especial preservação (lei brasileira de crimes ambientais, art. 50). Incide, sobre a conduta destrutiva dele, a norma do art. 21 do código penal — crime sem pena: O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena.
É fora de dúvida que o trato com os fatos jurídicos exige a leitura completa da norma (se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço). E ainda o § 2o:
Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

Logo, possibilidade, circunstância e consciência são três realidades fáticas da maior importância para a interpretação do suporte fático que surgiu no exemplo dado.
20. Coação irresistível e obediência hierárquica. Reza o art. 22: Se o fato é cometido sob coação irresistível [...] só é punível o autor da coação ou da ordem. Exemplo simples na lei brasileira de crimes ambientais é o seguinte. O empregado de engenho de açúcar, com oito filhos pequenos, recebe ordem do feitor para deitar no açude um produto tóxico derivado da cana. Provoca morte de peixes. Se o não fizer, mesmo ilegalmente será despedido. A ordem é ilegal porque consta da lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 33:  
Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras [...].

Mas também é irresistível a ordem pela coação social tão forte, em local de emprego difícil. A regra jurídica penal incidirá só sobre o feitor. Se este, também ele, estiver sob coação de superior hierárquico etc. — assim até ao Diretor que possa falar pela pessoa jurídica (presentante) — esse superior hierárquico também não responde. Se as coisas partem do presentante mesmo da pessoa jurídica, esta e esse respondem por isso que o ilícito foi cometido por ambos e beneficiou a dita pessoa jurídica. Assinalemos: ela responde, sim, porque incide a regra jurídica do art. 33 da lei especial e não a do art. 22 do código penal. Não responde se o suporte fático é de tal feitio, por causa do art. 22 do código penal[42], que não corresponda à proibição do art. 33 da lei de crimes ambientais brasileira. A coação irresistível retira do suporte fático a vontade própria do agente.
Calha recordar, relembrando, o artigo 33 da L. nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 [sanções por ilícitos contra o meio ambiente]:
        Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras: Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas: I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aquicultura de domínio público; II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou autorização da autoridade competente; III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica.

21. Exclusão geral de ilicitude. No art. 23 tem-se o conjunto clássico de regras jurídicas pré-excludentes do ilícito [43]. Estas já a priori não permitem que incida a proibição da conduta, razão por que são corretamente denominadas "preexcludentes" (Pontes de Miranda). A ação, ou a omissão, passam ao campo de atuação conforme a direito, conduta lícita. Soa assim:
Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Se o servidor público, biólogo no exercício da profissão, ferra panos e fundeia sobre banco nauticamente demarcado de corais, para estudá-los mais detidamente, está justificado desde logo porque não lhe permite o art. 23-III do código penal a incidência da norma do art. 33 § único-III da lei nº 9.605, de 12.02.1998 (quem fundeia embarcações [...] sobre bancos de [...] corais, devidamente demarcados em carta náutica.). Não há crime dele, o ato é lícito.
Se o mesmo agente, terminada a sua função pública, repete o mesmo ato apenas para tirar fotos e vendê-las, terá resvalado para o excesso punível. A incidência passa a ser a do § único do art. 23 do código penal: o agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
21.1 Estado de necessidade. Esta pré-excludente merece destaque. Define-a a parte geral do código penal no art. 24 [44]. Está nessa situação de licitude quem pratica o fato para salvar direito próprio ou alheio de perigo atual, direito cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigir-se, e que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar.
Complicam-se as relações jurídicas com as normas seguintes, dos dois parágrafos, a sobre:
§ 1º. Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. § 2º. Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito quando ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços [45].
Há ainda a norma do art. 37-I da lei brasileira de crimes ambientais, inserida nos crimes contra a fauna (Capítulo V, Seção I). Enuncia-se deste modo:
Não é crime o abate de animal, quando realizado: I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família.

Pela letra desta última regra jurídica, se a parte geral do código penal não contivesse as regras completativas da nossa lei especial (art. 79) — ergänzende Normen do direito alemão —, só haveria nela a literal pré-excludente do art. 37-I. Não é assim, porém. Esta última norma apenas sublinha o aquilo que mais geralmente acontece (quod plerumque accidit) entre pessoas muito pobres, castigadas pela fome. Está no capítulo da fauna, e cuida apenas do abate, o matar para consumir. Mas vige, por remissão do art. 79 da lei nº 9.605, de 12.02.1998, a norma geral do código penal. Também nesta matéria cumpre atentar-se para a complexidade do material sociológico-jurídico que se adensa com os dois §§ do art. 24 do código penal. Meticuloso exame, com dados os mais científicos possíveis, só ele vai poder, pela análise dos fatos, revelar ao intérprete o que é perigo, ou razoável, ou ameaçado. Falamos de investigação de fatos, pesquisa de realidades; não de conceitos vagos, ditos "filosóficos" [46].
21. 2. 1. Aprofundamento do conceito. Dita o art. 24 do código penal:
Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.

Acresce o § 2º:
Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito quando ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.

21. 2. 2. Aparência. Aparentemente essa pré-excludente só incidiria se a prática do fato fosse para evitar salvar ou evitar direito. Este é, no sentido subjetivo, a só atribuição de um bem de vida (diverso, pois, da pretensão e da ação, que são a exigibilidade e a compelibilidade). Fora assim, e não surgiria essa pré-excludente quando o agente estivesse a tutelar interesse ainda não entrado na sua esfera jurídica como direito. Não pode ser assim, porém. Age em estado de necessidade quem defende interesse que não é direito subjetivo. Diz Pontes de Miranda (com grifo nosso):
Estado de necessidade é a situação fática em que, para se evitar perigo, se tem de invadir a esfera jurídica de outrem, uma vez que o perigo não seja atividade de alguém, contrária a direito. Tanto no estado de necessidade quanto na legítima defesa, há defesa de interesses próprios, coisa que autodefesa é. Nem importa se a coisa é só perigosa para se conceituar o estado de necessidade, posto que possa ter relevância para o direito do dono à indenização [47].

21. 2. 3. No direito ambiental. No direito ambiental muita situação há de gente extremamente necessitada que tem de defender interesses, não direitos (que os não tem!). Tais são os casos de precisar o homem muito pobre, em estado de necessidade, de a) de madeira de lei, e de cipó, para reconstruir casa (ainda não há direito à habitação em regra jurídica de aplicação imediata), b) de embira para trançar vestes para a filha adolescente (ele ainda não tem direito subjetivo às vestes), c) de caçar na reserva, para alimentar a família (ele ainda não tem direito subjetivo à comida), d) retirar da mata madeira proibida, com que construa canoa para levar filhos adolescentes à escola pública de grau médio (não tem ele ainda direito a condução, nem a escola gratuita em grau médio), e) contra o art. 34 da lei nº 9.605, de 12.02.1998, precisa pescar [...] em lugares interditados por órgão competente — isto por não terem os filhos nenhuma outra diversão nas proximidades; ora, não tem ele nem os filhos o direito ao ideal (ao imaginário, ao simbólico, a satisfazer algo dos pendores íntimos, ao lazer mínimo).
Esses interesses do miserável são legítimos por arrancarem de impulsos básicos, de necessidades da natureza. A favor desta interpretação mais ampla do estado de necessidade, no exame da natura rerum, temos de invocar tanto o Direito das Gentes como o direito constitucional brasileiro. E aí se vê mais que interesse; veem-se os direitos subjetivos, embora sejam direitos sem ação de direito material (direitos mutilados). Desta classe são os direitos subjetivos que figuram em regras jurídicas só "programáticas" por ora.
21. 2. 4. Regras jurídicas do Direito das Gentes. O Pacto internacional sobre os direitos econômicos, sociais e culturais, de que o Brasil é signatário, contém regras jurídicas implícitas. No Direito das Gentes ou direito supraestatal vigora a norma jurídica pacta sunt servanda. Consagram-se aí os cinco direitos fundamentais do homem na ordem do desbastamento das desigualdades sociais. São eles o direito à subsistência, ao trabalho, à educação, à assistência e ao ideal. Os enunciados dizem por si. Por brevidade indicamos aqui apenas as fontes das regras jurídicas. Dizem (Preâmbulo) respeito ao ideal do ser humano livre, liberto do medo e da miséria. E os seguintes artigos realçam normativamente o dever jurídico de os Estados cuidarem dos seus nacionais com a tutela das mesmas regras jurídicas. Ei-los: artigo 6º, artigo 7º, artigo 10, artigo 11º, artigo 13º do Pacto internacional sobre os direitos econômicos, sociais e culturais.
21. 2. 5. Regras jurídicas constitucionais. E na Constituição Federal/88 temos uma plêiade de regras jurídicas de alto valor taxionômico no mesmo sentido. No Preâmbulo, no art. 1o–III, art. 3o-I e III, art. 3o-IV, art. 4o-II, art. 5o caput e § Segundo, o Título II com o art. 6o. Dá-se a incidência delas todas sobre os suportes fáticos em que, pesquisados, se acham os cidadãos necessitados do Brasil. Com a incidência dessas regras jurídicas surge o fato jurídico do qual se irradiam os ditos direitos fundamentais do homem na ordem econômica e cultural, no plano das Igualdades. Ora, para a salvaguarda de qualquer destes direitos fundamentais (subsistência, trabalho, educação, assistência e ideal), contará o cidadão necessitado no seu prol com a pré-excludente do status necessitatis quando aparentemente estiver a cometer um crime ambiental.
21. 2. 6. Equilíbrio necessário[48]. Dois interesses importantes — 1) o meio ambiente e 2) os direitos fundamentais do homem. Não há desdenharem-se estes com excesso de planos e ações em favor do primeiro. Fauna e flora, se descuidarmos da formação integral do homem, perdem o sentido. No Brasil, país de grandes desigualdades, é mais extenso o sistema nacional de meio ambiente [49] que a rede de planos de políticas públicas sobre os novos direitos do homem: subsistência, trabalho, educação, assistência e ideal. Mais ainda na França[50]. No Brasil passa-se o mesmo, com leis mais copiosas para o meio ambiente do que em favor dos direitos fundamentais do homem: os cinco direitos (subsistência, trabalho, educação, assistência e ideal), que podem estar no suporte fático da regra jurídica sobre estado de necessidade.
21. 2. Legítima defesa. Também pode incidir na aparência de crimes ambientais a pré-excludente de legítima defesa, que o art. 25 do código penal define:
Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Na lei nº 9.605, de 12.02.1998, encontram-se dois casos explícitos de legítima defesa: art. 37-II e IV.
21. 3.  Estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito. Também pré-excluem o crime ambiental segundo o art. 23 do código penal. Nos tipos da lei nº 9.605, de 12.02.1998, é frequente a alusão aos elementos licença, permissão ou autorização da autoridade competente. Estando eles no suporte fático da anterior descrição do ilícito, está afastada a ilicitude.
22. Inimputáveis. Acode o código penal, no art. 27:
Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial [51].

23. Emoção e paixão. Do mesmo modo as regras jurídicas penais sobre emoção e paixão (Código Penal, art. 28-I) e as respeitantes à embriaguez (inc. II; §§ 1o e 2o.). De modo que fica [...]
isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Temos também no artigo 28 § 2º do Código Penal uma redução da pena que bem pode ocorrer no crime ambiental:
de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Ou seja, se estas circunstâncias fáticas ocorrem junto no cometimento do ilícito penal ambiental, as ditas regras jurídicas incidem; têm de ser aplicadas.
24. Concurso de pessoas. A lei nº 9.605, de 12.02.1998, vimo-lo, começa com o art. 2o:
quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade etc.

É, até aí, a mesma norma do código penal, art. 29:
quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

A subsidiariedade da parte geral desse código faz incidir a regra do § 1º, isto é, se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. Do mesmo modo a regra jurídica do § 2º, a saber:
se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

Digamos que um agente quer apenas adquirir madeira para fins comerciais ou industriais, embora sem exigir a exibição de licença do vendedor e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto. Outras pessoas o acompanham e vêm a cortar madeira de lei, assim classificada por ato do poder público — tudo para fins industriais e em desacordo com as determinações legais. Terá incidido sobre o primeiro a regra jurídica penal proibitiva do art. 46 (com pena mais branda), ao passo que os outros ficam sob a incidência da norma do art. 45 (reclusão e multa).
25. Circunstâncias incomunicáveis. Sobre este último ponto silencia a lei nº 9.605, de 12.02.1998; incide, portanto, a norma do art. 30 do código penal:
não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.

Imaginemos que dois agentes saem à caça; um deles faz-se ajudar de menor de idade, circunstância que o outro desconhece. Responde aquele pela situação, o outro não.
26. Casos de  não punibilidade. Também a esse respeito falta regra jurídica na lei brasileira de crimes ambientais, de modo que acode, incidindo, a norma geral do código penal, art. 31:
o ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado.

Dois combinam uma pescaria, saem a caminho. Antes de chegar perto das águas resolvem voltar por causa da fiscalização. Nem tentativa se esboçou. Este ato-fato não terá sido criminoso.
27. Das penas. Não incidem a esse respeito as regras gerais do código penal porque as penas previstas para os crimes praticados contra o meio ambiente, a partir de 1998, são todas especiais — as da lei nº 9.605, de 12.02.1998, afora o que diz respeito à multa.
É muito de notar-se, todavia, que o próprio código penal já continha a tipificação de alguns ilícitos praticados contra o meio ambiente, como deixamos dito: incêndio (art. 250) explosão (art. 251); uso de gás tóxico ou asfixiante (art. 252); fabrico, fornecimento, aquisição, posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante (art. 253); inundação (art. 254); desabamento ou desmoronamento (art. 256); difusão de doença ou praga (art. 259).  Entram também os crimes contra a saúde pública: epidemia (art. 267); infração de medida sanitária preventiva (art. 268); envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal (art. 270). Nas situações fáticas em que coincidir a descrição dos suportes fáticos está revogado, pela lei nº 9.605, de 12.02.1998, tudo quanto, no código penal, discrepar dela (Art. 82. Revogam-se as disposições em contrário.) Eis aí assunto a exigir todo o cuidado técnico do intérprete; o juiz, antes de aplicar, é-lhe exigido que interprete a norma que pensa incidir. Que evite ele o atraente mas falso brilho do raciocínio "filosófico", companheiro das vaidades...
Diante do conflito aparente de normas temos de estudar minuciosamente os suportes fáticos semelhantes para se descobrir qual a norma correspondente a cada um deles: se a do código penal ou se a da lei nº 9.605, de 12.02.1998. Correta é a aplicação que fielmente corresponde à incidência — matéria de teoria geral da dogmática jurídica, que não de apressada "filosofia".
28. Substituição de penas. Pela lei nº 9.605, de 12.02.1998, dá-se substituição de penas deste modo regrada no art. 7º:
As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando: I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime. Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída.

No código penal há a norma do art. 44. Não coincide com as regras jurídicas da lei especial. Prevalece esta. Não incide o dito art. 44 do código penal.
28. 1. Conversão das penas restritivas de direitos em pena privativa de liberdade. A lei nº 9.605, de 12.02.1998, não traz, explícita, norma alguma sobre o assunto. A regra da subsidiariedade faz então incidir a do art. 45 do código penal, cujo enunciado é este:
A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade, pelo tempo da pena aplicada, quando: I - sobrevier condenação, por outro crime, a pena privativa de liberdade cuja execução não tenha sido suspensa; II - ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta.

28.2. Sem incidência. O art. 54 do código penal não incide por haver as regras jurídicas especiais da lei nº 9.605, de 12.02.1998, arts. 7º e 8o [52]. Tampouco as regras jurídicas do código penal no seu art. 58 e §. Já vimos que não incide o seu art. 44.
29. Agravantes no caso de concurso de pessoas. Não contraria a norma especial da lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 2º  [53], o que se estatui no art. 62, a saber:
A pena será ainda agravada em relação ao agente que: I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; II - coage ou induz outrem à execução material do crime; III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal; IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa.

Incide ela, pois, no concurso de pessoas.
30. Reincidência. Por haver regra especial a do art. 15 da lei nº 9.605, de 12.02.1998[54], não entra, a incidir in totum a norma do art. 63, do código penal. Mas alguma condenação no Exterior por crime ambiental faz incidir o art. 63 do código penal:
Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior.

Para efeito de se apurar reincidência, todavia, incide o art. 64 do código penal. Vale dizer literalmente que não prevalece a condenação anterior por crime ambiental se, entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior, tiver decorrido período de tempo superior a cinco anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação desses benefícios.
31. As circunstâncias atenuantes. Na lei ambiental brasileira, art. 14, tem-se norma expressa:
São circunstâncias que atenuam a pena: I - baixo grau de instrução ou escolaridade do agente; II - arrependimento do infrator, manifestado pela espontânea reparação do dano, ou limitação significativa da degradação ambiental causada; III - comunicação prévia pelo agente do perigo iminente de degradação ambiental; IV - colaboração com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental.

30. 1. Ampliação. A regra não faz restrições a outras atenuantes; incidem, logo, segundo o art. 79, também as atenuantes do código penal, art. 65: ser o agente menor de 21, na data do fato, ou maior de 70 anos, na data da sentença; o desconhecimento da lei; ter o agente cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; ou procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; idem quando haja cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou ainda se tiver confessado espontaneamente perante a autoridade competente a autoria do crime. Nem é impossível haja cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto que não provocou [55].
30. 2. Circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime. Outra normal geral de grande amplitude no código penal é a do art. 66, com a redação de 1984:
A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.

Alguém comete o crime do art. 69 da lei brasileira de crimes ambientais (obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais). Depois, por generosidade, ou arrependimento, pratica gesto moral altaneiro, como o de doar o correspondente a 50.000 euros aos órgãos fiscalizadores do meio ambiente. Está composto o suporte fático do art. 66 do código penal. Favorece-se o agente com essa classe inominada de atenuante.
31. Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Incide o art. 67 do código penal, que diz:
No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência [56].

32. Cálculo da pena. Matéria de ordem processual que é, a ela se remete com o art. 79 da lei nº 9.605, de 12.02.1998; por isso é de aplicar-se necessariamente a norma do art. 68, quando o juiz calcula a pena [57].
33. Concurso material. Se, por exemplo, o agente apanha espécime da fauna silvestre sem permissão (art. 29), e ao mesmo tempo pratica maus-tratos contra ela (art. 32), está em concurso material. Logo, incide sobre ele o art. 69:
Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.

Biólogo realiza desnecessária experiência dolorosa em animal vivo durante a noite para fins científicos (art. 32 §1º c.c. 29 § 4º-III). Aí vai incidir a norma do art. 70:
Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.

A pena mínima será a do art. 29, com nove meses de detenção mais a multa.
34. Crime continuado. É possível que se configure, como está no suporte fático e na regra jurídica do art. 71. Incidirá pois este:
Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhanças, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. — Parágrafo único. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes,[58] cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa,[59] poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.[60]

35. Multas no concurso de crimes. Por vezes o código penal alude à aplicação de pena, coisa que só o juiz faz. Julgar é estar em linha de direito processual. Temos de interpretar a linguagem. Alude-se ao direito material, quando na ideia está a de que é certa norma, e não outra, a que incide. É caso do art. 72 ao enunciar que no concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente. Está a determinar que, se há concurso, o agente fica sujeito a multas diversas, todas integrais.
36. Erro na execução. Pode ocorrer. O agente queria atingir propriedade privada, mas alcança prédio público. Vai responder, pelo art. 73 do código penal, segundo a regra aí expressa:
Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.

37. Resultado diverso do pretendido. Digamos. O suporte fático é o do art. 74, que incidirá:
Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.  

38. Matéria de direito processual. Muitas regras jurídicas processuais estão heterotopicamente situadas no código penal; tal o caso de execução em geral (sursis, livramento condicional) etc.[61], razão de não serem feitas aqui indagações sobre os arts. 75-90 do código penal.
39. Dos efeitos anexos da condenação. A regra do art. 91 do código penal brasileiro regula, assim efeitos genéricos como também específicos, advindos da sentença condenatória. Advirta-se que são efeitos tais que vão alterar direitos. A regra geral do direito processual civil é que nem estão no petitum, nem no decisum. Diferentemente se passa no processo penal brasileiro quanto aos efeitos anexos especiais segundo a norma heterotópica do art. 92.
Por isso temos de estudá-los aqui. Esses efeitos são anexos, e não efeitos próprios da sentença condenatória [62].
39. 1. Efeitos anexos em sentido estrito. Logo, são efeitos anexos propriamente ditos os inseridos no art. 91 com este enunciado:
São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisa cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

Pode-se, pois, proceder à liquidação de sentença condenatória criminal em si mesma para se saber o quantum devido à vítima direta do crime, para fins cíveis. Ocorre tal não só ao particular, vítima, como também aos entes públicos, a que o ilícito penal trouxe prejuízo material. Matéria nova, esta.
39. 2. Efeitos anexos em sentido largo. Um tanto diversamente se passa com a incidência do artigo seguinte (art. 92). Para a irradiação eficacial segundo no art. 91 basta a sentença ser publicada: os efeitos são automáticos; logo se lhe anexam aos efeitos próprios seus. Já agora, para os efeitos da sentença condenatória do art. 92, é indispensável que dela conste a condenação expressa, como se determina no parágrafo único:
Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença [63].

Pelo art. 92, os efeitos especiais são estes:
São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandado eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos nos demais casos;  II - a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; III - a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso. — Parágrafo único. Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.

40. Instrumentos do crime. Linhas acima vimos estar na lei nº 9.605, de 12.02.1998, regra semelhante a essa do código penal no art. 91-II, a. Incide ela sobre a pessoa jurídica tão somente:
Art. 24. A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.

E mais a norma do art. 25, § 4segundo a qual os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a sua descaracterização por meio da reciclagem.
41. A ação penal. Tratamos aqui apenas da ação de direito material. Ela é uma das eficácias do fato jurídico. Também a irradiada do ato ilícito criminal [64]. Na lei nº 9.605, de 12.02.1998, tem-se a norma do art. 26: Nas infrações penais previstas nesta Lei, a ação penal é pública incondicionada. Ela se irradia, portanto, somente ao Estado (Ministério Público). Não há aí ação penal privada. Diversa é a regra jurídica do código penal. A ação penal é pública e de iniciativa privada segundo o código penal no art. 100. Pode havê-la subsidiária [65].
A ação aqui mencionada é a ação de direito material, estranha à ação de direito processual (ou seja,  qual será o remédio jurídico processual, se o caso é de procedimento ordinário ou outro, quais os recursos etc.). Portanto, a ação condenatória criminal em matéria de meio ambiente é a eficácia irradiada do ato ilícito criminal ambiental. Nem tem lugar a chamada "decadência" (=caducidade) do direito de queixa, nem de representação. Por esta mesma razão não incidem as regras jurídicas dos arts. 101-106 do código penal brasileiro para subsidiarem a lei nº 9.605, de 12.02.1998.
42. Extinção da punibilidade. São situações jurídicas de extinção do processo penal, pelo mérito, as causas pelas quais já não se pode prosseguir no processo quando o direito não permite a aplicação da pena. Essa extinção pelo mérito dá-se no campo do direito material, a que o processo alude. É assim com a extinção da punibilidade.
A subsidiariedade do código penal à lei nº 9.605, de 12.02.1998, em extinção da punibilidade tem lugar — situa-se nos incisos de I a IV do art. 107:
Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III - pela retroatividade da lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição.

Acresce o perdão judicial de previsão legal específica. Dela há o perdão na lei nº 9.605 de 12.02.1998; alude a ele o art. 29 § 2º.
É sem sentido nos demais casos do código penal.
 43. Crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro. Pode ocorrer o suporte fático correspondente à norma do art. 108 do código penal, no dizer:
A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a este. Nos crimes conexos, a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão.

Um exemplo retirado à lei brasileira de crimes ambientais: o agente exporta espécimes da fauna silvestre, sem a devida permissão etc., espécimes que antes caçara. Assim o caçar como o exportar desse modo são crimes. Ao exportar essa caça agrava-se-lhe o crime de exportar. A extinção da punibilidade do primeiro (exportar) não se estende ao segundo (caçar).
 44. Normas gerais sobre a exceção de prescrição. Incide nesta matéria também o conjunto de normas penais gerais sobre prescrição. São as dos arts. 108-117 do código penal brasileiro. A lei especial menciona a prescrição apenas no art. 28-II, para regrar caso de suspensão do prazo da prescrição dizendo que na hipótese de o laudo de constatação comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de suspensão do processo será prorrogado, até o período máximo previsto no artigo referido no caput, acrescido de mais um ano, com suspensão do prazo da prescrição.
44. 1. Efeitos no plano do direito material e do direito processual. Tudo o mais, no tocante à prescrição, fica para as regras jurídicas do código penal que, pois, incidem e têm de ser aplicas. Escusado encarecer a relevância teórica e prática dessas normas de subsidiariedade à lei nº 9.605, de 12.02.1998, a respeito da exceção de prescrição em direito material e em direito processual. Quanto a este, não só durante o andamento do processo, senão também depois de passar em julgada a condenação. Leia-se a expressão legal no artigo 110:
Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória (g.n.) regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.[66] § 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada. § 2º. A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia )[67].

45. Extinção da punibilidade em concurso de crimes. Outra regra jurídica geral de direito penal, subsidiária da lei brasileira de crimes ambientais, é a do art. 119, a saber:
No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.

46. Perdão judicial. Por fim, no perdão judicial incide a norma do art. 120 do código penal: a sentença que concede perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência. Ela extingue a punibilidade. Há as duas hipóteses: o perdão do soberano (código penal, art. 107-II: anistia, graça ou indulto) e as de previsão legal específica [68] de que no direito ambiental há a espécie do art. 29 § 2º:
No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.
Quadra notar: a reincidência em crime ambiental só é a reincidência específica para efeito de agravante [69]. De todo modo, se houve o perdão de qualquer que seja o crime, para todo efeito de reincidência a sentença condenatória é tratada como se não tivesse existido.

VI — CONCLUSÕES
1. Teóricas.
(1) Nem todos os Povos criminalizam o ilícito ambiental como avançadamente se faz no Brasil. (2) Norma geral material penal é a que, em vigor, incide sobre toda classe de crime se não há outra, específica; mas esta lhe fará as vezes se estiver em vigor. A exegese muito se ajuda da análise de fatos (suportes fáticos, "casos concretos"): está com isso a empregar o método indutivo-experimental, prevenindo abstrações sem sentido, vaidosas. (3) Também em matéria jurídica penal, para se obterem clareza e precisão, cumpre se tenha em mente a teoria geral da dogmática jurídica, como: a) de onde se retiram na relatividade de Espaço-Tempo-Energia todos os suportes fáticos (expressão de valores) que aqui e acolá ora entram no espaço jurídico ora saem dele; b) regra jurídica: a sua função e como rigorosamente se classificam elas; c) o quê a incidência opera no mundo (as cinco classes de fato jurídico) etc.; d) os três planos de estudo do fato jurídico; e) as cinco classes de eficácia jurídica. (4) O estudo da matéria penal notadamente a ambiental não prescinde do Direito das Gentes e de direito constitucional. (5) Grande parte do código penal (art. 1o-120), mas não todo, incide sobre os crimes ambientais postos na lei nº 9.605, de 12.02.1998. Nessa parte o código penal é indispensável à exegese das normas penais ambientais e à interpretação dos ilícitos penais ambientais.
2. Práticas

a) O profissional do direito interessado em bem entender e aplicar a lei nº 9.605, de 12.02.1998, e mais os crimes ambientais descritos em outras leis, há de examinar as normas no Tempo, comparando entre si, e com as gerais, as diversas regras em conflito aparente. Descobre-se assim qual está em vigor em tudo, e em quê talvez não o esteja. b) Cumpre se preste toda atenção ao código penal para a multa da lei nº 9.605, de 12.02.1998. c) Posto seja pública toda ação penal ambiental, há a privada subsidiária. d) Em País com desigualdades sociais extremadas, como no Brasil, ao se examinar o crime ambiental praticado por pessoas carentes, é de mister cuidado com a pré-excludente de estado de necessidade em toda a sua amplitude e em todos os seus contornos e limitações. e) Muita cautela é necessária com a sentença condenatória por crime ambiental, notadamente por causa dos seus efeitos próprios e também os cíveis. Igualmente pelos efeitos anexos, estritos e largos, de importantes consequências sobre o condenado.

Bibliografia e referências

BETTIOL, Giuseppe. Direito penal. Trad. Paulo José da Costa Júnior e Alberto Silva Franco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1966.
CREIFELDS, Carl. Rechtswörterbuch. 13ª ed. München: C. H. Beck’s Verlagsbuchhandlung, 1996 — verbo “Umweltkriminalität”.
FINK, Daniel Roberto, ALONSO JR., Hamilton e DAWALIBI, Marcelo. Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2000.
FIRMO, Aníbal Bruno de Oliveira. Direito penal. 2ª ed. 4 tomos. Rio de Janeiro: Forense.
FREITAS, Vladimir Passos de, e FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza.   São Paulo: RT, 2000.
GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 2 v. São Paulo: Max Limonad, 1952.
LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. Berlin: Springer, 1991.
LECEY, Eladio. Crimes e contravenções Florestais: o impacto da lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 16: 35-48, Revista dos Tribunais, ano IV, outubro-dezembro. 1999.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Da poluição e de outros crimes ambientais na lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, Revista dos Tribunais, ano IV, abril-junho. 1999.
_________. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 8a ed.
MARCHESAN, Ana Maria Moreira. Alguns aspectos sobre a lei dos crimes ambientais. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, Revista dos Tribunais, ano V, julho-setembro. 2000.
MARITAIN, J. Humanismo integral. 4ª ed. Trad. A. Coutinho. São Paulo: Dominus, 1962.
MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. 4 v. Campinas: Bookseller, (1° e 2° volumes, 1997; 3° e 4 ° volumes, 1999).
MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Ed. Atlas, vol. 1, 13a ed., 1998.
NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. 4 v. São Paulo: Saraiva, 1959-1962.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti, Comentários à Constituição Federal de 1967, Emenda n. 1/69, 2.a edição. São Paulo: RT, 1969.
_______, Comentários ao código de processo civil. 3ª ed. rev. aum. (At. legislativa de Sergio Bermudes). Rio de Janeiro: Forense, 1977.
_______. Democracia, liberdade, igualdade: os três caminhos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1979.
________, Espaço-tempo-energia, RJ, s/ data (mimeo).  
________, Os novos direitos do homem. Rio de Janeiro: Alba, 1933.
________, Subjektivismus und Voluntarismus im RechtSonderdruck aus Archiv für Rechts- und Wirtschaftsphilosophie, Band XVI, Heft 4, Berlin-Grunewald, 1921.
________. Tratado das ações. 7 tomos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970-1978.
PRIEUR, Michel. Droit de l’environnement. 5ª ed. Paris: Dalloz, 2004.
RODRIGUES, José Eduardo Ramos. A evolução da proteção do patrimônio cultural: crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, Revista dos Tribunais, ano III, julho-setembro, 1998.
SÁ, Elida; MALLAM, Diogo Rudge; LUCYORENSTEIN, Hellen; CARDOSO, Sania Burlandi. Comentários à lei dos crimes ambientais. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, Revista dos Tribunais, ano III, julho-setembro. 1998.
SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001.
SHECAIRA, Sergio Salomão e CORREA JUNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: RT, 2002.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl e PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

* (Santos, novembro de 2010).



[1]  No código penal essas regras gerais são as de aplicação da lei penal (art. 1-12), crime (13-25), imputabilidade penal (26-28), concurso de pessoas (29- 31), penas (32-95), medidas de segurança (96-99), ação penal (100-106) e extinção da punibilidade (107-120).

[2]  Ver Elida SÁ; Diogo Rudge MALLAM; Hellen LUCYORENSTEIN; Sania Burlandi CARDOSO. Comentários à lei dos crimes ambientais. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 11: 57-67, Revista dos Tribunais, ano III, julho-setembro. 1998.

[3]  A lei alemã de crime ambiental surgiu em 1980, seguida de outra em 1994. Criminaliza condutas sobre águas, solo, ar, ruído, desmoronamento, trato com materiais perigosos, outras condutas perigosas para saúde e segurança etc. Mas só há crime ambiental se a conduta contraria determinações jurídico-administrativas. Realiza, pois, a ideia da acessoriedade jurídico-administrativa do direito penal ambiental (“Verwalgtunksakzesksorietät des Umweltsstrafrechsts”). Ver CREIFELDS, Carl. Rechtswörterbuch. 13ª ed. München: C. H. Beck’s Verlagsbuchhandlung, 1996 — verbo “Umweltkriminalität”, p. 1262-1263.

[4]  In Daniel Roberto FINK, Hamilton ALONSO JR. e Marcelo DAWALIBI. Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2000, o Capítulo I.

[5]   Vladimir Passos de FREITAS, e Gilberto Passos de FREITAS. Crimes contra a natureza. São Paulo: RT, 2000, p. 220/250.

[6]  Vejam-se a esse respeito Eladio LECEY. Crimes e contravenções Florestais: o impacto da lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 16: 35-48, Revista dos Tribunais, ano IV, outubro-dezembro. 1999. E ainda MARCHESAN, Ana Maria Moreira. Alguns aspectos sobre a lei dos crimes ambientais. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 19: 67-81, Revista dos Tribunais, ano V, julho-setembro. 2000.

[7]  Têm-se aí os crimes contra a incolumidade pública: incêndio (art. 250) explosão (art. 251); uso de gás tóxico ou asfixiante (art. 252); fabrico, fornecimento, aquisição, posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante (art. 253); inundação (art. 254); desabamento ou desmoronamento (art. 256); difusão de doença ou praga (art. 259).  Entram também os crimes contra a saúde pública: epidemia (art. 267); infração de medida sanitária preventiva (art. 268); envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal (art. 270).  Em ambas estas classes há ofensa à incolumidade e à saúde dos seres humanos, mas vai-se também contra o equilíbrio ecológico. Tem o intérprete de tomar todo o cuidado para verificar qual o suporte fático de cada caso; se coincidir em tudo com o de crime ambiental da lei nº 9.605, de 12.02.1998, prevalece a regra jurídica deste, não a do código penal.

[8]  Para a discussão clássica, entre as concepções material e formal de “crime”, ver Aníbal Bruno de Oliveira FIRMO. Direito penal. 2ª ed. 4 tomos. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 267-273.

[9]  E diz mais o art. 21: As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são: I - multa;  II - restritivas de direitos;  III - prestação de serviços à comunidade.

[10]  Está contudo também no código penal algo semelhante à parte final desta regra do art. 24; consta do seu art. 91: São efeitos da condenação: I ...; II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisa cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

[11]  Sobre os princípios a que deve ajustar-se toda interpretação da lei penal, v. Eugenio Raúl ZAFFARONI; José Henrique. PIERANGELI. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 174-179.

[12]  Estudo da culpabilidade, ver Aníbal Bruno de Oliveira FIRMO. Direito penal. 2ª ed. 4 tomos. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 23-38.

[13]  Não estamos levando em conta outros incisos; eles tratam de matéria processual.
[14]  Nestes pontos erram bastante os autores da ciência alemã. O que mais se confunde, distante de rigor técnico, por passar de um conceito a outro a todo o momento, é H. Kelsen. É assunto para outro estudo. Críticas ao vazio do formalismo inútil desse autor, ver LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. Berlin: Springer, 1991, p. 69-75.

[15]  O erro gramatical salta à vista: “se se revelar”, é o correto.
[16] Está no original o erro de vernáculo.
[17]  Trabalho já clássico entre nós sobre a classificação das penas, está em Aníbal Bruno de Oliveira FIRMO. Direito penal. 2ª ed. 4 tomos. Rio de Janeiro: Forense, 1959, t. III, p. 79-86.

[18]  “Art. 77. Resguardados a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes, o Governo brasileiro prestará, no que concerne ao meio ambiente, a necessária cooperação a outro país, sem qualquer ônus, quando solicitado para: I - produção de prova; II - exame de objetos e lugares; III - informações sobre pessoas e coisas; IV - presença temporária da pessoa presa, cujas declarações tenham relevância para a decisão de uma causa; V - outras formas de assistência permitidas pela legislação em vigor ou pelos tratados de que o Brasil seja parte. § 1° A solicitação de que trata este artigo será dirigida ao Ministério da Justiça, que a remeterá, quando necessário, ao órgão judiciário competente para decidir a seu respeito, ou a encaminhará à autoridade capaz de atendê-la. § 2º A solicitação deverá conter: I - o nome e a qualificação da autoridade solicitante; II - o objeto e o motivo de sua formulação; III - a descrição sumária do procedimento em curso no país solicitante; IV - a especificação da assistência solicitada; V - a documentação indispensável ao seu esclarecimento, quando for o caso. Art. 78. Para a consecução dos fins visados nesta Lei e especialmente para a reciprocidade da cooperação internacional, deve ser mantido sistema de comunicações apto a facilitar o intercâmbio rápido e seguro de informações com órgãos de outros países.”
[19]  A esse respeito, ver Pontes de Miranda, Comentários à Constituição Federal de 1967, Emenda n. 1/69, 2.a edição, revista. São Paulo: RT, 1969, tomo VI, § 32, item 2 (conceito de sobredireito), p. 92 e seguintes.

[20]  Do código penal, portanto: “art. 5º. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. § 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. Art. 6º. Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Art. 7º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; II - os crimes:a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;b) praticados por brasileiros; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercante ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. § 1º. Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. § 2º. Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. § 3º. A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido Art. 8º. A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas. Art. 9º. A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - sujeitá-lo à medida de segurança. Parágrafo único. A homologação depende: a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça”.

[21]  Na opinião de Shecaira e Corrêa, Teoria da pena: finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: RT, 2002, p. 457, em sua opinião, dizíamos, a parte geral do código penal não incidiria porque o seu legislador não podia prever a penalização dos ilícitos contra o meio ambiente, que ocorreriam tantos anos mais tarde. Temos de responder: não há interesse na pesquisa de intenção do legislador, e é impróprio aludir a “espírito da lei”: aquela se situa no só mundo político, esta deriva filosoficamente de subjetivismo inaceitável — foge à objetividade da entrada em vigor das regras jurídicas.
[22]  Advirta-se: em tudo há que se afastar o intérprete da “intenção do legislador” e do “espírito da lei”, como dizíamos na nota anterior. Veja-se a esse respeito PONTES DE MIRANDA, Subjektivismus und Voluntarismus im Recht.  Sonderdruck aus Archiv für Rechts- und Wirtschaftsphilosophie, Band XVI, Heft 4, Berlin-Grunewald, 1921, p. 522-543

[23] “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.”

[24]  A matéria constitucional é esta: art. 5º- XXXVI: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”; XL: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.”.

[25]  Art. 107. “Extingue-se a punibilidade: ...III- pela retroatividade da lei que não mais considera o fato como criminoso”.

[26]  “A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.”

[27]  “Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.”
[28] “Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. § 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.”.

[29]  O decreto-lei n.º 1098, de 25/03/70 define os limites do mar territorial; a lei n.º 7565, de 19/12/86 é o Código Brasileiro de Aeronáutica. Temos ainda a regra do art. 90 do Código de Processo Penal: “Os crimes praticados a bordo de aeronave nacional, dentro do espaço aéreo correspondente ao território brasileiro, ou ao alto-mar, ou a bordo de aeronave estrangeira, dentro do espaço aéreo correspondente ao território nacional, serão processados e julgados pela justiça da comarca em cujo território se verificar o pouso após o crime, ou pela da comarca de onde houver partido a aeronave”.

[30]  Art. 6o: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.”.
O art. 70 do Código de Processo Penal reza assim: “A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. § 1º - Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução. § 2º - Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado. § 3º - Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção.”
[31]  Leve-se também em conta a lei 6.815, de 19/08/80: a situação jurídica do estrangeiro no Brasil.

[32]  “As regras gerais deste código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.”

[33]  “dificultar ou impedir o uso das praias”
[34]  “Penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais, sem licença da autoridade competente”.

[35]   “Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”.

[36]  § 2o “A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de Uso Sustentável será considerada circunstância agravante para a fixação da pena”.
[37]  § 3o “Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade”.
[38]  Sobre essa classe de crime, v. José Eduardo Ramos RODRIGUES. A evolução da proteção do patrimônio cultural: crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 11: 25-56, Revista dos Tribunais, ano III, julho-setembro. 1998.

[39] Sobre crime de poluição, ver Paulo Affonso Leme MACHADO. Da poluição e de outros crimes ambientais na lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental. São Paulo, 14: 9-19, Revista dos Tribunais, ano IV, abril-junho. 1999.

[40] É bem o crime de causar poluição — de qualquer natureza, em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana etc.

[41]  Sobre tudo isso, ver PONTES DE MIRANDA, Espaço-tempo-energia, sem data (mimeografado, todo).  
[42] A regra jurídica desse artigo 22 é assim: "Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem".
[43]  Ver Basileu GARCIA. Instituições de direito penal. 2 v. São Paulo: Max Limonad, 1952, tomo 2, p. 373-390

[44]  Leia-se Giuseppe BETTIOL. Direito penal. Trad. Paulo José da Costa Júnior e Alberto Silva Franco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1966, p. 383: “Necessitas legem non habet”.
[45]  Sobre o excesso nesta matéria, ver E. Magalhães NORONHA. Direito penal. 4 v. São Paulo: Saraiva, 1959-1962, v. I, p. 239.

[46]  Estes são, frequentemente, nada mais que words... Abstrações insuladas no ego (por vezes inçadas de vaidade), sem sentido, sem correspondência com as relações — lógicas, matemáticas, físicas, biológicas, sociológicas —, que efetivamente ocorrem no mundo extramental, composta de realidades menos subjetivas. Ver PONTES DE MIRANDA, O problema fundamental do conhecimento, p 21 e 171 e seguintes.
[47] PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, t. II, p. 395.
[48]  Ver J. MARITAIN. Humanismo integral. 4ª ed. Trad. A. Coutinho. São Paulo: Dominus, 1962 (último capítulo); PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Democracia, liberdade, igualdade: os três caminhos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1979 (3a. parte) e, do mesmo autor, Os novos direitos do homem. Rio de Janeiro: Alba, 1933 (todo).
[49]  Ver, por exemplo, Paulo Affonso Leme MACHADO. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 8a, ed., p. 119-144.

[50]  Ver Michel PRIEUR. Droit de l’environnement. 5ª ed. Paris: Dalloz, 2004, p. 157-292.
[51]  Pode igualmente incidir conjunto de normas protetivas do menor, como as das leis 2.252 de 1º-07-54 (Corrupção de menores) e 8.069 de 13-07-90 (Estatuto da criança e do adolescente).
[52] “As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando: I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime.  — Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída.”
A regra jurídica do art. 8º é assim: “As penas restritivas de direito são: I - prestação de serviços à comunidade; II - interdição temporária de direitos; III - suspensão parcial ou total de atividades; IV - prestação pecuniária; V - recolhimento domiciliar.”.

[53]  “Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.”

[54] São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - reincidência nos crimes de natureza ambiental.
[55]  Também no direito penal alemão se admite a analogia: quando aplicada em favor do acusado. Ver SCHRÖDER, Jan. Recht als Wissenschaft. München: C. H. Beck, 2001, p. 257.

[56]  Cumpre insistir — reincidência em crime ambiental é apenas a específica. 

[57]  “A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. — Parágrafo único. No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.”
[58]  Surge a questão de saber-se quem é a vítima dos crimes praticados contra o meio ambiente. Vai este ilícito contra direitos difusos. Mas pode ferir igualmente direito individualizado. Se o mesmo agente ateia fogo contra florestas de dois Estados-membros limítrofes, atinge direitos difusos e também os direitos dos dois membros da federação. Mostra-se assim a possibilidade lógica e sociológica de crime ambiental continuado.

[59]  A ameaça pode ser contra dois proprietários diferentes de terras ribeirinhas, onde o agente amedronta a ambos, de uma só vez.

[60]  Classificação de infrações penais: v. Julio Fabrini MIRABETE. Manual de Direito Penal. São Paulo: Ed. Atlas, vol. 1, 13a ed., 1998, p. 124-134.
[61]  Entre esses assuntos, postos na parte geral do código penal, temos: concurso de infrações da suspensão condicional da pena, requisitos da suspensão da pena prorrogação do período de prova cumprimento das condições, requisitos do livramento condicional, soma de penas, especificação das condições, revogação do livramento revogação facultativa, efeitos da revogação, tempo de cumprimento, soma de penas, revogação do livramento, extinção da pena, reabilitação, medidas de segurança, desinternação ou liberação condicional, substituição da pena por medida de segurança para o semi-imputável, direitos do internado.
[62]  Sobre a matéria ver Francisco Cavalcanti PONTES DE MIRANDA. Comentários ao código de processo civil. 3ª ed. rev. aum. (At. legislativa de Sergio Bermudes). Rio de Janeiro: Forense, 1977, t. V, p. 51-65.

[63]  Merece estudo à parte o saber se precisam também constar do petitum do Ministério Público no caso de crime ambiental, ou se o juiz pode ex officio anexar essa eficácia especial à sentença condenatória.

[64]  Sobre ação condenatória criminal, ver Francisco Cavalcanti. PONTES DE MIRANDA. Tratado das ações. 7 tomos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970-1978, tomo V, p. 293-332.
[65]  Ver Aníbal Bruno de Oliveira FIRMO, Direito Penal.  4 tomos, 1959, vol. III, p. 236.
[66]  No caso do crime ambiental a reincidência é somente específica (lei nº 9.605, de 12.02.1998, art. 15: “São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - reincidência nos crimes de natureza ambiental; [...]”).

[67]  São ainda, de direito processual, temas como o modo de se cumprir a pena de reclusão e detenção, regras do regime fechado, regras do regime semiaberto, regime especial, direitos do preso, trabalho do preso, superveniência de doença mental, detração etc.

[68]  José Frederico MARQUES. Tratado de direito penal. 4v. Campinas: Bookseller, 1° e 2° vol., 1.997; 3° e 4°, vol. 1.999, vol. III, p. 335-336.

[69] “Art. 15. São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - reincidência nos crimes de natureza ambiental.”